Você sabia que a Brachiaria, além de melhorar os atributos físicos do solo, pode adicionar aproximadamente 9 toneladas por hectare por ano de biomassa sobre a superfície do solo? (BERNARDES et al., 2010; COSTA et al., 2016; SÃO MIGUEL et al., 2018)?
E essa produção de biomassa não se limita à parte aérea: estima-se que 4,5 t ha⁻¹ ano⁻¹ de biomassa radicular, considerando uma relação raiz/parte aérea de 0,5 (APOLINÁRIO et al., 2013; RAZUK, 2002; SARAIVA et al., 2014). Com uma concentração média de 40% de carbono na biomassa das raízes, isso representa uma incorporação de 1,8 t ha-1 de carbono ao solo.
Esses números ajudam a entender por que a Brachiaria promove um ambiente mais favorável atividade biológica e à diversidade do solo, contribuindo para a melhoria da qualidade edáfica e até para uma regulação da população de nematoides.
Neste artigo, você vai conhecer as principais espécies de Brachiaria, seus benefícios e os cuidados necessários para o sucesso do consórcio da Brachiaria com outras culturas.
O que é brachiaria?
A brachiaria é um gênero de gramíneas tropicais muito utilizado na agropecuária, especialmente como forrageira para a pecuária e como cobertura vegetal em sistemas agrícolas.
Essas plantas se destacam pela sua resistência, alta produção de biomassa e capacidade de melhorar a fertilidade do solo a longo prazo.
O que significa Brachiaria?
O termo Brachiaria deriva do latim brachium, que significa “braço” ou “ramo”. Esse nome foi dado ao gênero de plantas da família Poaceae (gramíneas) devido a disposição de suas inflorescências, que lembram braços ou ramos estendidos.
É um grupo botânico que inclui várias espécies forrageiras amplamente utilizadas, como Brachiaria brizantha, Brachiaria decumbens, Brachiaria ruziziensis e Brachiaria humidicola.
É braquiária ou brachiaria?
- “Braquiária” é a forma aportuguesada do termo científico e é a mais usada na linguagem comum, principalmente entre produtores rurais e técnicos agropecuários.
- “Brachiaria” é o nome científico do gênero e segue a nomenclatura botânica internacional.
Ou seja, ambos os termos estão corretos, mas o uso depende do contexto: “braquiária” para conversas do dia a dia e “Brachiaria” para publicações científicas e técnicas.
É Brachiaria ou Urochloa?
As plantas conhecidas como “braquiárias” pertencem ao gênero Urochloa, anteriormente classificadas no gênero Brachiaria.
Essa reclassificação taxonômica foi proposta por alguns botânicos com base em estudos morfológicos e moleculares, visando refletir melhor as relações filogenéticas entre as espécies (GONZÁLES; MORTON. 2005).
Apesar da mudança, o nome Brachiaria ainda é amplamente utilizado no meio agropecuário, especialmente no Brasil, devido à sua tradição e reconhecimento entre produtores e técnicos.
Portanto, ambos os termos se referem ao mesmo grupo de gramíneas forrageiras de origem africana, amplamente cultivadas no Brasil, como Urochloa brizantha (sinônimo de Brachiaria brizantha), Urochloa decumbens (sinônimo de Brachiaria decumbens) e Urochloa ruziziensis (sinônimo de Brachiaria ruziziensis).
Em resumo, “Urochloa” é o nome botânico atualizado, enquanto “Brachiaria” continua sendo amplamente utilizado no contexto agropecuário.
Quais as principais espécies de Brachiaria?
Embora existam diversas espécies de Brachiaria, quatro delas se destacam no Brasil pelo seu uso mais frequente em sistemas agrícolas e pecuários: brizantha, decumbens, ruziziensise humidicola. Cada uma dessas espécies apresenta características específicas em relação ao crescimento, resistência ambiental, adaptação a diferentes tipos de solo e cultivares disponíveis. Essas informações estão detalhadas na Tabela 1 a seguir.
Tabela 1. Principais espécies de Brachiaria e suas características.
Espécie | Crescimento | Resistência | Adaptação ao solo | Cultivares |
B. brizantha | Touceira ereta, crescimento vigoroso | Alta resistência à seca e ao pisoteio | Prefere solos bem drenados, moderada exigência de fertilidade | Marandu, Piatã, Xaraés, MG-5 Vitória, BRS Paiaguás |
B. decumbens | Crescimento prostrado, estolonífero | Boa resistência ao pisoteio, excelente resistência à seca | Tolerante a solos ácidos e de baixa fertilidade | Basilisk |
B. ruziziensis | Crescimento semi-ereto, menor vigor que B. brizantha | Menos resistente ao pisoteio, boa qualidade forrageira | Prefere solos férteis e bem drenados | BRS Integra |
B. humidicola | Crescimento prostrado e estolonífero | Alta tolerância a solos encharcados e baixa fertilidade | Indicada para solos mal drenados e sujeitos a encharcamento | BRS Tupi, Llanero |
Principais usos da Brachiaria
Abrachiariaé amplamente utilizada devido à sua adaptabilidade, capacidade de recuperação do solo e benefícios para sistemas produtivos integrados. Seus principais usos são como:
- Forragem para pecuária: espécies como Brachiaria brizantha e Brachiaria decumbenssão amplamente usadas para pastagem, garantindo alta produção de forragem e boa qualidade nutricional para os animais.
- Cobertura do solo em plantio direto: a palhada da braquiária protege o solo contra erosão e contribui para a retenção de umidade, além de ser uma excelente alternativa no controle de plantas daninhas (Figura 1) favorecendo a cultura seguinte.

Cortesia: José Laércio Favarin.
- Adubação verde: sua biomassa pode ser incorporada ao solo para melhorar a fertilidade e a disponibilidade de matéria orgânica (Figura 2).

Foto: João Leonardo Corte Baptistella.
Quando teve início o consórcio de culturas com a Brachiaria?
O consórcio entre forrageiras, como a brachiaria, e culturas graníferas teve sua origem com o Sistema Barreirão, desenvolvido pela Embrapa. Que consistia no cultivo simultâneo de arroz de sequeiro e forrageiras, com o objetivo de reduzir os custos de renovação das pastagens.
Para sua implementação, era realizado um preparo intensivo do solo, sem a adoção do plantio direto. Visando corrigir o perfil do solo em profundidade e recuperar áreas de pastagem degradadas, sem a intenção inicial de alternar o uso do solo entre agricultura e pecuária.
Anos depois, a Embrapa introduziu o Sistema Santa Fé, que aprimorou a abordagem ao incorporar o plantio direto ao consórcio e incentivar a rotação entre culturas agrícolas e pastagens na mesma área (Figura 3).

Em sistemas integrados com gramíneas como milho e soja, a brachiaria aumenta a eficiência no aproveitamento dos fertilizantes como N e recicla K (Figura 4).

A Brachiaria reduz a incidência de radiação e excesso térmico do solo, diminuindo cerca de 40-60% da perda de água por evapotranspiração.
Quais os benefícios da Brachiaria para rotação de culturas e plantio direto?
- Sistema radicular
A brachiaria possui um sistema radicular profundo e denso, o que aumenta a formação de poros, facilita a recarga hídrica e a difusão de oxigênio da atmosfera para o solo e subsolo, indispensável para à respiração das raízes (Figura 5).

- Compactação do solo
A presença de raízes profundas e fibrosas auxilia na descompactação do solo, reduzindo camadas adensadas e melhorando a porosidade.
A brachiaria reduz os impactos do pisoteio animal e do tráfego de máquinas agrícolas, sendo muito utilizada em áreas de pecuária integrada.
Na figura 6 você pode ver que o comprimento das raízes de soja no perfil do solo, cultivada após milho safrinha em consórcio com brachiaria, foi maior quando comparado ao solo sem a presença de braquiária.

As raízes da Brachiaria liberam exsudados que promovem uma maior atividade dos microrganismos e funcionam como agente cimentante entre as partículas do solo, o que contribui para formação de agregados.
Tal efeito é maior no ato do pastejo ou roçagem da pastagem, a qual tende a ativar a liberação de exsudados.
- Ciclagem de nutrientes
As raízes da brachiaria promovem uma melhor disponibilidade de nutrientes, como fósforo (P) e nitrogênio (N), devido à intensa atividade microbiana que estimulam no solo.
A grande produção de biomassa resulta em uma elevada matéria orgânica, que contribui para a liberação gradual de nutrientes para culturas subsequentes.
Dentro do solo ela preserva e/ou aumenta o teor de carbono (MO) dos primeiros 5-10 cm de solo, promove contato das partículas do solo por pressão e fornece alimento (C) à biologia do solo.
- Melhoria da fertilidade do solo
As raízes profundas da brachiaria promovem a reciclagem de nutrientes, trazendo elementos como nitrogênio, fósforo e potássio das camadas mais profundas para a superfície. Além disso, isso permite o movimento de nutrientes em excesso na superfície para subsuperfície, um exemplo é o cálcio.
Integração Lavoura-Pecuária?
É um sistema de produção agropecuária que combina, de forma planejada, atividades agrícolas e pecuárias em uma mesma área, seja em consórcio, sucessão ou rotação.
Benefícios da ILP
- Ambientais:
- Melhoria da qualidade e estrutura do solo (Figura 7).
- Aumento da biodiversidade na propriedade.
- Redução da erosão e degradação do solo.
- Melhoria da retenção de água no solo.

- Econômicos:
- Diversificação das fontes de renda.Melhor aproveitamento dos recursos naturais.Redução de custos com insumos e recuperação de áreas degradadas.
- Redução na utilização de herbicidas.
Critérios para a escolha da melhor Brachiaria?
A escolha da espécie de brachiaria mais adequada deve considerar diversos fatores, incluindo: tipo de solo, clima da região e finalidade de uso (como pastejo, cobertura do solo ou consórciocom outras culturas).
Tipo de solo: avalie a fertilidade, acidez e drenagem do solo. Por exemplo:
- B. decumbens é ideal para solos pobres e ácidos, enquanto B. brizantha requer solos mais férteis e bem drenados.
Clima: considere a precipitação anual e a ocorrência de períodos de seca ou frio.
- B. ruziziensis adapta-se bem a regiões com menor índice pluviométrico, enquanto B. humidicola é indicada para áreas sujeitas a encharcamento.
Finalidade de uso: defina o objetivo principal, seja para pastejo, cobertura do solo ou consórcio.
- B. ruziziensis é excelente para cobertura em plantio direto, enquanto B. brizantha é amplamente utilizada para pastejo devido à sua alta produtividade.
Manejo e implantação da Brachiaria
A implantação bem-sucedida da brachiaria requer atenção a três etapas fundamentais: preparo do solo, semeadura e adubação. Vamos ver cada uma delas:
Preparo do solo
- Análise de Solo: antes de qualquer intervenção, é essencial realizar uma análise química do solo para identificar necessidades de correção e fertilização.
- Controle de plantas daninhas: elimine a vegetação indesejada por meio de métodos mecânicos ou químicos, garantindo que a brachiaria não enfrente competição inicial por recursos.
- Preparo mecânico: realize aração e gradagem para promover a descompactação e nivelamento do solo, facilitando a semeadura e o desenvolvimento radicular das plantas (Fig. 8).

Semeadura
- Escolha de sementes: opte por sementes de alta qualidade e certificadas, verificando a pureza e o valor cultural. Sementes revestidas (peletizadas) podem facilitar a semeadura e melhorar a uniformidade de emergência.
- Época de semeadura: a semeadura deve coincidir com o início da estação chuvosa, garantindo umidade adequada para a germinação e estabelecimento das plântulas. No consórcio é importante conhecer o crescimento das espécies para o sucesso desse sistema (Figura 9).

De acordo com o professor Favarin, existem algumas estratégias para minorar a competição de plantas: arranjo temporal (época de plantio, Δt) e arranjo espacial (z, posição da semente). Se ambas falharem, ainda resta outra estratégia o controle químico.
- Densidade e profundidade: para cultivares como Marandu, Piatã e Xaraés, recomenda-se cerca de 20 plântulas bem distribuídas por metro quadrado. A profundidade de semeadura ideal é de 2 a 4 cm, evitando-se profundidades maiores que podem prejudicar a emergência.
- Método de semeadura: pode-se utilizar semeadura a lanço seguida de leve incorporação ou semeadura em linhas. A escolha do método depende das condições locais e dos equipamentos disponíveis.
Adubação
- Adubação de implantação: Com base na análise de solo, aplique fósforo (P₂O₅) e potássio (K₂O) conforme as recomendações específicas para a cultura. O fósforo é especialmente importante para o desenvolvimento inicial das raízes.
- Adubação nitrogenada: após o estabelecimento da pastagem, a aplicação de nitrogênio pode ser realizada para estimular o crescimento vegetativo e aumentar a produção de forragem.
Caso de sucesso no uso da braquiária
Em um experimento conduzido em Primavera do Leste-MT, sob sistema de semeadura direta, previamente utilizado em integração lavoura-pecuária com pastagem por dois anos, foram avaliadas duas espécies forrageiras (SILVA, 2022):
Urochloa ruziziensis, cuja área apresentava acúmulo de aproximadamente 3 t ha⁻¹ de resíduos vegetais secos sobre o solo, e Urochloa brizantha, com cerca de 6 t ha⁻¹.
As forrageiras foram estabelecidas em solos com duas classes texturais distintas: um com 12% de argila (classificado como franco arenoso) e outro com 25% de argila (franco areno-argiloso).
Após os dois anos de cultivo das forrageiras, foi implantada a cultura da soja nas mesmas áreas, permitindo a avaliação dos efeitos residuais da palhada sobre a leguminosa (Figura 10).
Observou-se maior produtividade de grãos na soja cultivada em sucessão à Urochloa brizantha, em comparação à soja cultivada após Urochloa ruziziensis, independentemente da textura do solo.
Uma hipótese levantada para o melhor desempenho da soja após B. brizantha foi a menor incidência de nematoides, especialmente Pratylenchus brachyurus, observada na área por profissionais responsáveis pelo manejo.

Conclusão
Neste artigo, você viu que a presença da brachiaria contribui para a melhoria da estrutura e fertilidade do solo, favorece a reciclagem de nutrientes e o aumento da matéria orgânica, beneficiando as culturas implantadas posteriormente.
Além disso, foi destacado o papel da brachiaria em sistemas como a Integração Lavoura-Pecuária (ILP), onde promove a sinergia entre atividades agrícolas e pecuárias, otimizando o uso dos recursos naturais.
Para o sucesso no consórcio com essa forrageira, é importante escolher a espécie mais adequada para a sua região e finalidade, além de realizar a semeadura na época certa e na profundidade ideal, evitando a competição com a cultura de interesse econômico.
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Referências
APOLINÁRIO, V. X. O.; DUBEUX, J. C. B.; MELLO, A. C. L.; VENDRAMINI, J. M. B.; LIRA, M. A.; SANTOS, M. V. F.; MUIR, J. P. Deposition and decomposition of signal grass pasture litter under varying nitrogen fertilizer and stocking rates. Agronomy Journal, v. 105, p. 999–1004, 2013. doi: 10.2134/agronj2012.0433.
BERNARDES, T. G.; SILVEIRA, P. M.; MESQUITA, M. A. M. H.; AGUIAR, R. A.; MESQUITA, G. M. H. Decomposição da biomassa e liberação de nutrientes dos capins braquiária e Mombaça em condições de Cerrado. Pesquisa Agropecuária Tropical, v. 40, p. 370-377, 2010.
COSTA, C. H. M. da; CRUSCIOL, C. A. C.; SORATTO, R. P.; FERRARI NETO, J. Phytomass decomposition and nutrients release from pearl millet, guinea grass and palisade grass. Biosci. J., v. 32, n. 5, p. 1191-1203, 2016.
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RAZUK, R. B. Avaliação do sistema radicular de acessos de Brachiaria brizantha e suas relações com atributos químicos e físicos do solo. 2002. 56 p. (Mestrado em Agronomia) – Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Dourados, 2002.
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Sobre o autor:

João Paulo Marim Sebim
Doutorando em fitotecnia (ESALQ/USP)
- Mestre em Produção Vegetal (UFAC)
- Engenheiro Agrônomo (UFAC)
Como citar este artigo:
SEBIM, J.P.M. Brachiaria: 4 principais espécies e benefícios para a agricultura. Blog Agroadvance. 2025. Disponível em: https://agroadvance.com.br/blog-brachiaria-braquiaria/ . Data de acesso: xx Xxx 20xx.