O aumento da emissão de CO2 (dióxido de carbono) tem sido um dos maiores desafios ambientais enfrentados, pois acarreta alterações climáticas a nível global.
Apesar de ser visto na maioria das vezes como um grande vilão, o CO2 é um gás essencial para a manutenção da vida em nosso planeta. No entanto, quando emitido em excesso, pode gerar graves desequilíbrios ambientais.
É consenso que estratégias devem ser estudadas e empregadas para reduzir a concentração do CO2 atmosférico, na tentativa de mitigar eventuais catástrofes mundiais.
Neste contexto, a agricultura pode ser um aliada na captura do CO2 atmosférico. Mas afinal de contas, o que é sequestro de carbono, qual a relação com a agricultura e como a sinergia entre ambos pode contribuir para a captura de CO2 atmosférico?
Neste artigo, vamos esclarecer o que é o sequestro de carbono e como a agricultura pode ajudar a capturar o CO2 da atmosfera para o solo.
O que é o sequestro do carbono e qual a sua importância?
O sequestro de carbono é o processo pelo qual o carbono é retirado da atmosfera e armazenado em reservatórios naturais (por exemplo: solo, plantas e oceanos). Estudos mostram que 87% do CO2 é oriundo, principalmente, da queima de combustíveis fósseis.
A erosão do solo, proporcionada em parte pelo desmatamento, também contribui significativamente na emissão de CO2, assim como a indústria, agropecuária e queimadas.
Sabe-se que as atividades agropecuárias podem gerar emissões diretas e indiretas de gases de efeito estufa por vários processos: dejetos de animais, preparo convencional do solo, calagem, uso de fertilizantes nitrogenados, consumo de combustíveis fósseis etc.
O sequestro de carbono é importante para mitigar impactos relacionados à mudança climática e contribui na redução do aquecimento global.
Por outro lado, na agricultura encontra-se o maior potencial de mitigar as emissões de CO2, realizando o sequestro de carbono nas plantas e no solo. Vamos conferir as principais formas?
Sequestro de carbono pelas plantas
Por meio da fotossíntese, o CO2 atmosférico é capturado pelas plantas e transformado em compostos orgânicos (Figura 1). Esta reação ocorre no interior da célula vegetal, a partir do CO2 e da água, como forma de produzir carboidratos e oxigênio (que retorna à atmosfera).
Resumindo, as plantas absorvem o CO2 da atmosfera durante a fotossíntese e armazenam o carbono em sua biomassa. Posteriormente, ocorrem inúmeras funções na formação da biomassa e metabolismo vegetal (Assad et al., 2019).
A fotossíntese possui função base e essencial no planeta, pois além de realizar o sequestro de carbono atmosférico, conduz todo o fluxo de matéria e energia nos ecossistemas e renova o oxigênio atmosférico. Esse sequestro de carbono pode ser aumentado, conforme veremos no tópico a seguir.
A preservação/plantio de árvores contribui para diminuir a quantidade de CO2 na atmosfera, pois cada hectare de floresta, na fase de crescimento, é capaz de absorver cerca de 150 a 200 toneladas de carbono.
Estudos mostram que as florestas tropicais, mesmo ocupando apenas 7% da área terrestre, são responsáveis por cerca de 30% do sequestro global de carbono.
Diferente de outros setores, onde o carbono faz uma viagem apenas de ida para a atmosfera, as florestas funcionam como uma via de mão dupla: absorvem carbono enquanto crescem ou se mantêm. Mas, podem promover efeito reverso com o desmatamento (Figura 2).
Logo, as florestas podem atuar como fontes ou sumidouros de carbono, dependendo do tratamento dado a elas.
As florestas tropicais são, disparadamente, os ecossistemas mais importantes no sequestro de carbono no solo e mitigação das mudanças climáticas, sendo que as três maiores florestas tropicais estão localizadas na Amazônia, Bacia do Rio Congo e Sudeste Asiático (Harris e Gibbs, 2021) (Figura 3).
De forma geral, estudos mostram que manter/preservar as florestas existentes é nossa maior esperança se quisermos estocar altas quantidades de carbono no solo. Caso contrário, os efeitos proporcionados pelas mudanças climáticas poderão ser ainda piores.
Práticas agrícolas sustentáveis
A agricultura é essencial para alimentar as populações humanas. E diversas práticas agrícolas sustentáveis vêm sendo adotada ao longo dos anos pelos produtores no campo. E elas são essenciais no sequestro de carbono. Vejamos algumas delas:
- Sistema Plantio Direto
Este sistema é considerado o método mais conservacionista de manejar o solo, sendo caracterizado por manter o solo sempre coberto por palhada, além do preparo e revolvimento mínimo do solo, somente na linha de plantio.
A quantidade e manejo dos resíduos culturais depositados e as culturas envolvidas no sistema de rotação podem favorecer o acúmulo de carbono no solo devido a proteção física da matéria orgânica, dependendo das condições climáticas e do tipo de solo.
Outros benefícios promovidos pelo sistema de plantio direto, são: aumento da infiltração e retenção da água no solo, aumento da atividade biológica no solo, maior estabilidade dos agregados do solo, melhoria da fertilidade, redução de erosão, dentre outros.
Ao optar por este sistema, o produtor favorece a qualidade do solo, determinada indiretamente por meio de indicadores físicos, químicos e biológicos do solo. Estas informações são relevantes para medir a saúde do solo e identificar alterações proporcionadas pelo manejo.
No contexto da mitigação de mudanças climáticas, é sempre valioso ressaltar a importância do solo pela capacidade de sequestrar carbono da atmosfera e estocá-lo de forma mais estável.
Somados, estes fatores podem favorecer a sustentabilidade da produção agrícola e atuar na mitigação das mudanças climáticas. Em 2017, foi lançado um mapa global de estoque de carbono orgânico no solo, que contribui para diversos estudos relacionados a esta temática.
- Rotação de culturas
A rotação de culturas é uma prática agrícola que objetiva cultivar, de forma alternada, diferentes plantas em uma mesma área de cultivo, durante diferentes épocas. As espécies escolhidas devem ter ao mesmo tempo: propósito comercial e recuperação do solo da erosão.
Dentre os vários benefícios obtidos com a rotação de culturas, destacam-se: aumento da matéria orgânica, melhorias na estrutura do solo, aumento da biodiversidade e mitigação das mudanças climáticas.
Plantas forrageiras, gramíneas e leguminosas, anuais ou semiperenes são apropriadas para essa finalidade. Recomenda-se que se deve priorizar plantas fixadoras de nitrogênio, com sistema radicular profundo e abundante, para promover a reciclagem de nutrientes.
Alguns consórcios, por exemplo, aveia com ervilhaca ou com nabo forrageiro são indicações já comprovadas e recomendadas. O uso de culturas de cobertura com nabo forrageiro, guandu, crotalárias, ervilhaca, poderá permitir a substituição de parte do nitrogênio e de fosfatos naturais necessário para as gramíneas.
Consequentemente, os custos desses elementos por hectare são reduzidos. Esta prática, se bem aplicada e dependendo de outros fatores associados, pode diminuir a necessidade de N para o milho e o trigo em 50% e até em 75%, contribuindo na mitigação de emissão carbono atmosférico.
- Integração Lavoura Pecuária Floresta (ILPF)
O ILPF é uma estratégia produtiva onde, várias espécies atuam em sinergia dentro da mesma área. As várias espécies podem ser: arbóreas, arbustivas, forrageiras e animais. O cultivo pode ser realizado em rotação ou sucessão, visando sobretudo o bem-estar animal.
As mudanças proporcionadas no uso na terra, com a adoção de tecnologias e sistemas integrados de produção, possibilitam o sequestro de carbono, que proporciona aumento de fertilidade do solo, ganhos produtivos e redução das emissões de gases de efeito estufa.
Por ser um sistema que visa a otimização da produção por área, a ILPF reduz a necessidade por novas áreas, diminuindo o desmatamento. Consequentemente, o menor tempo de ciclo do rebanho diminui a quantidade de gases de efeito estufa na atmosfera.
Você pode conferir mais informações no seguinte link a seguir:
- Recuperação de pastagens degradadas
Parte do carbono contido em ecossistemas naturais pode ser perdido na mudança de uso do solo. Os estoques de carbono podem ser drasticamente reduzidos até 50% nos primeiros 20 cm do solo e até 20% na profundidade de 1 metro.
Estudos mostram que práticas de manejo realizadas adequadamente podem sequestrar carbono e devolvê-lo ao solo com a recuperação de áreas degradadas, sobretudo, pastagens. Vamos compreender um pouco mais sobre este processo?
o Brasil possui, aproximadamente, 159 milhões de hectares de área de pastagem. Estima-se que cerca de 64% dessa área apresenta algum nível de degradação, aumentando a emissão de gases de efeito estufa e às perdas de produtividade (Carvalho, 2023).
No entanto, o sequestro de carbono no solo em áreas agrícolas de pasto é uma das formas para mitigar as mudanças climáticas globais, pois o solo estoca duas vezes mais carbono em relação a atmosfera e três vezes mais em relação ao carbono contido nas plantas.
Portanto, áreas agrícolas e de pastagem, quando bem manejadas podem resultar em estoques de C no solo igual ou superior ao da área nativa, fator interessante levando em consideração a importância e emergência do mercado de carbono em estruturação.
Para reduzir as emissão de gases de efeito estufa, o Brasil se comprometeu no Acordo de Paris, recuperar mais de 15 milhões de hectares de pastagens degradadas até 2030. Neste contexto, as pastagens tropicais exercem papel fundamental e eficaz.
Agora, que compreendemos as formas naturais de sequestro de carbono, vamos entender a principal forma de sequestrar carbono artificialmente?
Sequestro geológico de carbono
O Sequestro Geológico de Carbono ou Carbon Capture and Geological Storage (CCGS) é o ato de separar o CO2 de processos industriais e processos relacionados à geração e/ou consumo de energia seguido de transporte para um local de estocagem segura.
Nessa prática, isola-se o CO2 atmosférico, para que seja utilizado em processos industriais ou para armazenamento em formações geológicas. E como ocorre este processo?
O CCGS pode ser divido em 3 etapas, todas com constante monitoramento para prevenir possíveis vazamentos de CO2.
- Captura: Consiste em separar oCO2 de correntes de gases provenientes de fontes estacionárias, para que o fluido seja o mais homogêneo possível, por meio da pré-combustão, pós-combustão, oxicombustão e looping químico.
- Transporte: Consiste em levar o CO2da sua origem nas fontes emissoras até o local de armazenamento (ferrovias, navios, dutos, rodovias). Esse transporte pode contabilizar uma ordem de grandeza de 100.000 toneladas de CO2 por ano.
- Armazenamento: Consiste em armazenar o CO2 em reservatórios de petróleo, aquíferos salinos profundos, cavernas de sal, oceanos, dentre outros.
A figura 5 demonstra as etapas dos processos descritos acima.
Vale ressaltar que existem alguns riscos associados a estas tecnologias, tais como:
- Vazamentos: grandes fluxos de CO2 em contato com a atmosfera estável podem ser prejudiciais aos seres vivos.
- Limitação geológica: se as formações geológicas não forem capazes de reter o gás de forma segura, pode ocorrer falhas no armazenamento de CO2, prejudicando a saúde e o meio ambiente. Logo, nem todas as formações geológicas são eficazes neste processo.
- Mudança de pressão: um possível aumento da pressão de CO2, durante o processo de armazenamento, poderia causar pequenos eventos sísmicos.
- Aceitação pública: Há controvérsias em relação a adoção desta tecnologia. Para adequada utilização, são necessários adotar políticas públicas voltadas baseadas em evidências científicas para este fim.
Quem são os maiores sequestradores de carbono do planeta?
Podemos categorizar que os maiores sequestradores de carbono do planeta, são principalmente:
Oceanos: Se caracterizam como um dos lugares mais promissores no sequestro de carbono, pois cobrem a maior parte da superfície da Terra. De acordo com Larcher (2000), os oceanos estocam cerca de 38.500 Gt de carbono.
Isso ocorre devido às macroalgas e o fitoplâncton que realizam fotossíntese para converter CO2 em açúcares, processo idêntico ao realizado pelas plantas terrestres. Com isso, retiram 1/3 do carbono emitido na atmosfera pela atividade humana.
Em resumo, o processo natural de fotossíntese (seja em ecossistemas aquático ou terrestres) contribui de forma considerável para diminuir a quantidade de CO2 na atmosfera, por meio do sequestro de carbono.
Ecossistemas florestais e solo: Os ecossistemas florestais e o solo somam os maiores reservatórios de carbono. As florestas são os maiores reservatórios de carbono, contendo cerca de 80% de todo o carbono estocado na vegetação terrestre e cerca de 40% do carbono presente nos solos.
Pode-se afirmar que as florestas apresentam alta taxa de fixação de carbono, quando comparadas a outras vegetações, sendo essenciais para manter o equilíbrio do estoque de carbono global.
Já o compartimento solo, estima-se que armazena cerca de quatro vezes mais carbono que a biomassa vegetal e mais três vezes que a atmosfera.
Formações geológicas: O carbono das formações geológicas consiste naqueles encontrados no carvão, petróleo e no gás natural.
Quais os benefícios do sequestro de carbono?
O sequestro de carbono é essencial para diminuir concentrações desse gás na atmosfera. Ao ser estocado, seja nos oceanos, florestas, solos, dentre outras formas, melhoram a ciclagem do carbono, evitando impactos ambientais como erosão e degradação do solo.
o sequestro de carbono é tão importante que a remoção do CO2 atmosférico somado ao processo de fotossíntese, proporciona a manutenção dos seres vivos, pois por meio desta reação, a fotossíntese libera oxigênio para a atmosfera.
Mercado de crédito de carbono
Créditos de carbono representam a não emissão de dióxido de carbono na atmosfera. Nesse cenário, o agronegócio se tornou peça-chave, pois pode reduzir a sua emissão de CO2 por meio da adoção de tecnologias e métodos, como a estocagem de carbono no solo.
Todos os setores da economia devem aumentar os esforços para limitar o aquecimento global a 1,5°C e neutralizar as emissões de gases do efeito estufa globais até 2050. Para isso, além de reduzir emissões de CO2, é preciso realizar o sequestro de carbono em larga escala.
Nesse cenário, a restauração ambiental tem um papel fundamental no alcance desse objetivo global, pois cerca de 5-10 Gt de CO2 devem ser sequestradas da atmosfera para atingir a meta de 1,5°C, sendo a captura de carbono por meios naturais a forma mais viável.
Portanto, cresce de forma positiva o desenvolvimento de mercados voluntários e regulados de carbono (Figura 6), impulsionados pelo crescente comprometimento de empresas com o abatimento de suas emissões e a possível regulamentação do Acordo de Paris.
As empresas que compram créditos para compensar suas emissões, representam 40% do mercado com créditos associados à proteção de florestas e restauração florestal. Esse mercado tem potencial de crescimento de 15 vezes até 2030 e atuar no sequestro de carbono.
Atualmente, mais de 50% do mercado voluntário está precificado abaixo de US$ 10 por tonelada de carbono equivalente capturado com grandes variações (de US$ 1 a US$ 120/t).
Conclusão
O solo é um importante compartimento de carbono e exerce papel crucial na mitigação de gases do efeito estufa (sobretudo o CO2) e mudanças climáticas globais.
O uso/manejo inadequado do solo gera problemas na sua sustentabilidade e causa impacto negativo nos atributos físicos, químicos e biológicos. Consequentemente, passa a contribuir para o efeito estufa ao invés de contribuir para o sequestro de carbono.
E como se dá o sequestro de carbono na agricultura? Práticas corretas de manejo agrícola (por exemplo: sistemas de plantio direto, implantação de sistemas integrados de cultivo, recuperação de pastagens degradadas etc.), que visam a manutenção/acúmulo de carbono no solo, atenuam os efeitos do aquecimento global.
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Referências
ASSAD, E. D.; MARTINS, S. C.; CORDEIRO, L. A. M.; EVANGELISTA, B. A. 2019. Sequestro de carbono e mitigação de emissões de gases de efeito estufa pela adoção de sistemas integrados. In: BUNGENSTAB, D. J.; ALMEIDA, R. G. de; LAURA, V. A.; BALBINO, L. C.; FERREIRA, A. D. (Ed.). ILPF: inovação com integração de lavoura, pecuária e floresta. Brasília, DF: Embrapa, 2019. pp. 153-167.
CARVALHO, T. A.; SUBTROPICAL, E. estoque de carbono em solo de pastagem: fatores para mudança de uso da terra e melhoria no manejo. 2023. Tese de Doutorado. Instituto Agronômico. Campinas, 2023.
COSTA, I. V. L. Proposta de Estrutura Regulatória para Sequestro Geológico de CO2 no Brasil e uma aplicação para o Estado do Rio de Janeiro. 2014. Tese de Doutorado. Energy Planning Program—COPPE/UFRJ, Rio de Janeiro, Brasil.
HARRIS, N.; GIBBS, D. Florestas absorvem duas vezes mais CO2 do que emitem por ano. Blog WRI Brasil. 2021. Disponível em: https://www.wribrasil.org.br/noticias/florestas-absorvem-duas-vezes-mais-co2-do-que-emitem-por-ano. Acesso em: 20 Fev. 2024.
Sobre a autora
Nayana Alves Pereira
Analista de Produtos Educacionais B2B na Agroadvance
- Engenheira Agrônoma (UFPI/Teresina)
- Mestra em Solos e Nutrição de Plantas (UFPI/Bom Jesus)
- Doutora em Solos e Nutrição de Plantas (ESALQ/USP)
Uma resposta
Excelente conteúdo, parabéns