O Boro é amplamente reconhecido como um dos principais micronutrientes para as plantas, sendo frequentemente referido como “o macro dos micro”, devido sua importância vital. Essa expressão ilustra a relevância do boro na nutrição vegetal.
A deficiência de boro nas plantas é uma das deficiências de micronutrientes mais comuns e disseminadas em âmbito global. Em solos tropicais, como os do Brasil, a baixa concentração natural de boro no material de origem e sua forma predominante, ácido bórico (H3BO3), que é facilmente lixiviada, agravam essa situação.
Além disso, o boro é considerado imóvel em espécies vegetais que utilizam a sacarose como principal açúcar de transporte. Isso significa que, uma vez depositado em determinadas partes da planta, ele não se move facilmente para outras partes, o que torna crucial sua disponibilidade contínua no solo para evitar deficiências.
Um agravante é que o limite entre a deficiência e toxidez de boro nas plantas é muito estreito, o que não permite que acumulemos Boro no solo. Por todos esses motivos é essencial incluir o boro nos programas de adubação para assegurar uma nutrição adequada.
Neste artigo, discutiremos as funções do boro nas plantas, como ele se relaciona com os sintomas de sua deficiência e toxidez, e a melhor forma de manejá-lo na adubação para otimizar o crescimento e a produtividade das culturas. Aproveite a leitura!
Função do boro nas plantas
o boro desempenha uma função crucial na estabilização das paredes celulares primárias, formando complexos estáveis com grupos cis-hidroxila, como os grupos pectina das paredes celulares. Esta é considerada a única função do boro para a qual existem evidências sólidas e indiscutíveis.
O boro não é um constituinte enzimático e não há evidências convincentes de que ele afeta diretamente as atividades enzimáticas. Ao longo dos anos, muitos papéis foram propostos para o B, incluindo:
- papéis na participação em processos como divisão celular,
- alongamento celular,
- metabolismo de fenóis e lignina,
- interações membrana plasmática-parede celular e
- sinalização fitohormonal.
Nenhuma dessas funções, contudo, foram definitivamente demonstradas.
Essas propostas indicam que há possíveis atores desconhecidos envolvidos em processos dependentes do boro, ampliando o escopo de suas funções além da estabilização das paredes celulares.
Sintomas de deficiência de boro nas plantas e suas causas fisiológicas
A falta de boro resulta em sérios prejuízos para o crescimento e desenvolvimento e desempenho das plantas, manifestando-se em uma variedade de sintomas distintos, tais como mudanças na integridade da parede celular, lesões nos tecidos e morte celular (Figura 1).
Vejamos abaixo, cada um dos sintomas da deficiência de boro nas plantas, com suas respectivas causas, conforme mostrado por Lilay et al. (2024):
1. Deformação foliar e necrose do meristema apical
Causa: Comprometimento da divisão e alongamento celular.
Devido à imobilidade do boro no floema, a baixa transpiração desses tecidos meristemáticos contribui para os sintomas de deficiência. As folhas jovens se enrolam e frequentemente exibem manchas necróticas, como resultado do acúmulo de fenol, o que leva à formação de espécies reativas de oxigênio (ROS), danos teciduais e sensibilidade à luz.
2. Má diferenciação dos tecidos vasculares
Causa: dificuldade da planta de levar boro para tecidos com baixa taxa transpiratória.Parte superior do formulário
Em condições de alta deficiência de boro, os tecidos vasculares das plantas podem colapsar, o que as torna mais suscetíveis à seca. Isso ocorre porque essas plantas têm dificuldade em fornecer boro para tecidos com baixa transpiração, como o meristema apical da parte aérea e folhas jovens.
3. Cessação do crescimento radicular
Nas raízes, a deficiência de B induz a parada do crescimento no meristema apical radicular. Essa resposta é extremamente rápida; na primeira hora após a privação B.
As raízes aparecem inchadas, o que novamente se deve à má integridade da parede celular e ao acúmulo de lignina. Como o crescimento do meristema apical da parte aérea também é inibido, a relação raiz-parte aérea típica permanece inalterada, mas as plantas são muito pequenas em comparação com plantas nutridas adequadamente com boro.
4. Enfraquecimento estrutural das plantas e dificuldade em sustentar o crescimento adequado
Causa: A estabilização da parede celular é comprometida devido à falta de formação de ligações éster entre o boro e os resíduos de apiose dos monômeros de rhamnogalacturonana II (RG-II).
Essas ligações são essenciais para a funcionalidade da parede celular, pois o boro é responsável por cruzar dois monômeros de RG-II em um dímero, conferindo força e flexibilidade à parede celular.
A disfunção da parede celular afeta diversos processos metabólicos das plantas, tornando difícil determinar se os sintomas relacionados à deficiência de boro são diretamente ligados ao mau funcionamento da parede celular ou a efeitos diretos em outros processos celulares.
Os transportadores de boro, como o NIP5;1 e o BOR1, são responsáveis pela absorção e distribuição de boro nas plantas, desempenhando um papel fundamental na regulação do seu suprimento e uso eficiente.
5. Distúrbio de cascas e caules ocos e frágeis
A deficiência de boro resulta na formação de cascas no caule devido à combinação da má integridade da parede celular e ao acúmulo de lignina nas veias. Durante a deficiência de boro, os fenóis livres são oxidados, levando à formação de espécies reativas de oxigênio (ROS), causando danos nos tecidos. Além disso, os fenóis também são usados na síntese de lignina, resultando em seu acúmulo nos tecidos afetados.
6. Inibição da germinação do pólen e retardamento do crescimento do tubo polínico, resultando em redução da frutificação.
Causa: modificação nos níveis de Ca2+, na organização dos dos filamentos de actina e na deposição dos componentes da parede do tubo polínico.
A demanda das plantas pelo boro na fase reprodutiva é maior do que na fase vegetativa. Como resultado, a deficiência de B leva à baixa floração, baixa produção e viabilidade de pólen, bem como à queda de frutos (Figura 1f).
Esses sintomas podem aparecer como “fome oculta” ou “deficiência latente”, tornando-se óbvios apenas no início da floração.
Os fortes efeitos negativos da deficiência de B sobre os órgãos reprodutivos são agravados pelas baixas taxas transpiratórias, e estudos têm demonstrado que a aplicação foliar de B nos tecidos reprodutivos pode atenuar esses sintomas, mesmo sob suprimento adequado de B às raízes.
7. Diminuição da transpiração
Causa: colapso dos tecidos vasculares (Figura 1b)e cessação do crescimento radicular (Figura 1c)
Uma resposta frequentemente observada à deficiência de boro é a diminuição da transpiração, que provavelmente é resultado de má diferenciação e/ou colapso dos tecidos vasculares em combinação com menor densidade estomática e cessação do crescimento radicular.
É um grande desafio distinguir entre respostas diretas, primárias de deficiência de B, e respostas secundárias relacionadas à funcionalidade subótima da parede celular.
Deficiência de boro no milho e na soja
Os principais sintomas de deficiência de boro na soja são:
- Redução do crescimento e deformações nas zonas de crescimento.
- Diminuição da superfície foliar, com folhas pequenas, deformadas, espessas e quebradiças (Figura 2A, 2B).
- Crescimento reduzido das raízes (Figura 2C).
Os principais sintomas de deficiência de boro no milho são:
- Listras brancas ou estrias transparentes na lâmina da folha (Figura 2d),
- Redução do crescimento, plantas com entrenós curtos.
- Má formação de espigas, com grãos deformados ou ausentes (Figura 2 k).]
Sintomas do excesso de boro nas plantas (toxidez de boro)
O Boro ocorre como uma molécula sem carga (ácido bórico) que pode passar bicamadas lipídicas sem qualquer grau de controle, como ocorre para outros nutrientes iônicos, o que aumenta o risco de toxidez na planta, principalmente quando altas doses são utilizadas concentradamente e há água disponível no solo.
Em espécies onde B é relativamente imóvel, os sintomas de toxicidade são detectados primeiramente em tecidos mais velhos, enquanto em outras espécies, onde B é remobilizado na seiva do floema, sintomas visíveis aparecem principalmente em tecidos em crescimento ativo.
O excesso de B no solo (e a maior probabilidade de toxidez de boro) ocorre em países áridos ou semiáridos, como Austrália do Sul, Iraque, Egito, Jordânia, Líbia, Marrocos, Síria, Turquia, Chile, Califórnia e Itália, onde a principal razão para o acúmulo de B no solo superficial é a evapotranspiração de água ou, em áreas costeiras, o uso de água enriquecida com B para irrigação.
No Brasil, a toxidez de boro pode ocorrer pelo uso de doses elevadas de fontes de boro com maiores solubilidades, aplicadas concentradamente no solo em condições em que há água disponível no solo.
O excesso de B no solo resulta em prejuízo de crescimento e alteração do metabolismo vegetal, causando necrose progressiva em folhas, caules e malformações dos frutos.
Há relatos também de redução do crescimento radicular em culturas importantes, como trigo, cevada, milho devido ao excesso de boro no solo.
Níveis críticos de boro nas plantas e no solo
Os níveis adequados de boro em tecidos foliares secos variam de 10 a 75 mg kg-1, o que é uma quantidade ótima para muitas plantas cultivadas.
Os requisitos de boro variam com o tipo de planta: nas monocotiledôneas, o teor de folhas varia de 1 a 6 mg kg-1 e no caso das dicotiledôneas pode variar de 20 a 70 mg kg-1.
Os teores também variam em função do tecido vegetal, sendo que as partes reprodutivas apresentam maior demanda pelo nutriente (Figura 3).
Geralmente, é recomendada a aplicação de boro no solo quando as folhas contêm menos de 25 mg kg-1 em culturas de alta demanda por boro, como alfafa, beterraba, batata, girassol, soja e canola.
Os sintomas visuais de deficiência de Boro geralmente se tornam evidentes em dicotiledôneas, milho e trigo em concentrações foliares abaixo de 30-50, 5-10 e 5 mg kg-1, respectivamente.
O teor médio de boro no solo é considerado como sendo 30 mg kg-1. O boro do solo apresenta uma grande variação dependendo da rocha parental. Consequentemente, as plantas precisam de pequenas quantidades de boro, mas ele se torna tóxico em 20 mg kg-1 ou mais para a maioria das culturas.
A cultura da soja, para a produção de 1,0 tonelada de grãos, extraí aproximadamente 75 g de boro, dos quais 30% são exportados nos grãos. Veja, na Tabela 1, a exigência nutricional para a soja e milho.
Tabela 1. Exigência nutricional de boro em soja e milho
Cultura | Grãos | Restos culturais | Total |
—————– g t-1 grãos ——————— | |||
Soja | 20 | 57 | 77 |
Milho | 4,1 | 15,1 | 19,2 |
A quantidade de Boro aplicada varia de 0,3 a 3,0 kg ha-1, dependendo da necessidade e sensibilidade da cultura à toxicidade do Boro.
Manejo do boro na adubação
Como deve ser o manejo da adubação das plantas cultivadas com Boro para alcançar o maior impacto agronômico: via foliar ou via solo?
A principal questão a ser considerada é a mobilidade do boro no floema.
- Na maioria das espécies vegetais, o Boro NÃO é móvel no floema. Isso significa que as adubações foliares com B são eficazes apenas nos tecidos pulverizados, e o Boro absorvido pelas folhas não é translocado para os novos tecidos de crescimento.
- Assim, a adubação via SOLO é quase sempre a melhor alternativa, por poder disponibilizar o boro continuamente à planta, embora a adubação foliar possa ser utilizada em algumas estratégias específicas.
- Lembrando que o boro não se acumula no solo, e portanto, o manejo de boro deve ser feito anualmente! E que a maior demanda é no período reprodutivo das culturas!
Assim, devido à dinâmica do boro (tanto no solo quanto na planta) a melhor opção para a adubação boratada é sempre via solo e ela deve ser feita anualmente!
Apesar disso, a adubação foliar pode ser uma solução complementar em situações específicas, em casos, por exemplo, em que se deseja realizar uma correção rápida durante uma fase específica do crescimento da planta, proporcionando assim, flexibilidade no manejo nutricional das culturas.
Para saber mais sobre o manejo da adubação com boro na cultura da soja, como quais fontes utilizar, quais doses utilizar e como realizar a adubação, leia nosso artigo: Boro na soja: as melhores estratégias de manejo.
Conclusão
O boro é um micronutriente essencial para a estabilização da parede celular das plantas e crescimento do tubo polínico. e divisão celular.
Os sintomas de deficiência de boro, como deformação foliar, necrose do meristema apical, má diferenciação dos tecidos vasculares e cessação do crescimento radicular, causam sérios prejuízos ao desenvolvimento e produtividade das culturas. Tais sintomas variam entre espécies, sendo particularmente notáveis em espécies leguminosas, como a soja, ervilha e canola.
A adubação anual de boro é crucial para evitar problemas de deficiência, garantindo a disponibilidade contínua deste nutriente essencial para as plantas. Devido à sua mobilidade limitada e à alta propensão à lixiviação em solos tropicais, como os do Brasil, a aplicação regular de boro via solo é fundamental para manter a saúde das culturas. Esse manejo adequado previne sintomas de deficiência de boro, como deformações foliares e problemas no crescimento radicular, assegurando um desenvolvimento robusto e uma produtividade otimizada.
Quer saber mais sobre outros micronutrientes: Leia: Deficiência de zinco nas plantas: entendendo os sintomas a partir das 4 principais funções.
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Referências
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Sobre a autora:
Beatriz Nastaro Boschiero
Especialista em MKT de Conteúdo na Agroadvance
- Pós-doutora pelo CTBE/CNPEM e CENA/USP
- Mestra e Doutora em Solos e Nutrição de Plantas (ESALQ/USP)
- Engenheira Agrônoma (UNESP/Botucatu)