Através do melhoramento genético foram desenvolvidas cultivares com características comerciais altamente desejáveis, como maior tamanho, rendimento e resistência a pragas e doenças, atendendo às exigências do mercado e às necessidades dos produtores.
Isso permitiu não só o aumento da produção agrícola de forma sustentável, mas também contribuição para a preservação dos recursos naturais e aumento na resiliência das lavouras aos desafios climáticos. Neste artigo, exploramos a amplitude e os impactos concretos dessa revolução genética no campo.
Evolução do melhoramento genético
O MELHORAMENTO de plantas, também conhecido como “domesticação”, desempenhou um papel fundamental no desenvolvimento das principais culturas que hoje sustentam a alimentação humana, sendo parte integrante da nossa evolução, dado que os ambientes produtivos demandam adaptação e seleção de variedades.
O melhoramento genético de plantas é uma prática que remonta ao início da agricultura, há cerca de 10.000 anos, quando os primeiros agricultores começaram a selecionar empiricamente plantas com características desejáveis, como menor tempo de florescimento e retenção de sementes. Essas seleções resultaram nas principais culturas agrícolas que conhecemos hoje, como milho, trigo, soja e arroz.
A compreensão científica desse processo começou a se consolidar no século XIX, com os experimentos de Gregor Mendel, que elucidaram os padrões de herança genética (Figura 1). No século XX, a descoberta da estrutura do DNA em 1953 permitiu correlacionar diretamente variações genéticas (genótipo) com características visíveis (fenótipo), impulsionando o desenvolvimento de técnicas como os marcadores moleculares.
A revolução Verde, entre as décadas de 1950 e 1970, marcou um avanço significativo no melhoramento genético, impulsionando o desenvolvimento de cultivares de alto rendimento e resistente a pragas e doenças. A introdução de híbridos de milho, arroz e trigo resultou em aumentos expressivos de produtividade, reduzindo a insegurança alimentar em diversas regiões do mundo.

Figura 1. Evolução do melhoramento genético. Fonte: CropLife Brasil.
Atualmente, técnicas avançadas de edição genética, como o CRISPR-Cas9, permitem modificações precisas no genoma das plantas, introduzindo ou removendo genes específicos para aprimorar características desejadas em menor período (Figura 2).

Fonte: CropLife Brasil (2024).
Essas inovações, aliadas a ferramentas de bioinformática e fenotipagem de alta precisão, têm sido fundamentais para o desenvolvimento de cultivares mais produtivas e adaptadas às mudanças ambientais, assegurando a sustentabilidade da produção agrícola.
Estratégias do melhoramento genético
O melhoramento genético de plantas combina ciência, observação e tecnologia para criar cultivares superiores. Ao longo das décadas, diferentes estratégias foram sendo desenvolvidas — das mais tradicionais às mais inovadoras —, cada uma com vantagens específicas para diferentes culturas, ambientes e objetivos agronômicos. Vejamos uma linha do tempo a seguir:
1. Seleção massal e fenotípica
É a forma mais antiga e intuitiva de melhoramento: consiste na escolha das melhores plantas de uma população com base em suas características visíveis (fenótipo). Os critérios podem incluir tamanho dos frutos, resistência visível a doenças, porte da planta, entre outros.
Essa estratégia é eficaz em espécies de polinização cruzada e continua sendo usada em programas de melhoramento participativo com agricultores. Mas, apesar da simplicidade, essa estratégia não considera a variabilidade genética oculta (genótipo), o que limita a precisão dos ganhos obtidos.
2. Hibridação
A base do sucesso de culturas como milho e arroz. A hibridação consiste no cruzamento controlado entre linhagens parentais distintas, buscando o efeito de heterose — o chamado “vigor híbrido” – fenômeno em que os descendentes superam os pais em produtividade, resistência ou uniformidade.
O resultado são plantas mais produtivas, resistentes e uniformes, ideais para mecanização.
3. Mutagênese
Utiliza agentes físicos (como radiação) ou químicos (como o SEM – etilmetano sulfonato) para induzir mutações aleatórias no DNA das plantas, gerando variabilidade genética. Essa técnica tem importância histórica e já levou ao desenvolvimento de milhares de cultivares comerciais no mundo, incluindo variedades de arroz, trigo e cevada.
4. Biotecnologia moderna
A engenharia genética permitiu inserir genes de interesse em plantas, criando organismos geneticamente modificados (OGMs).
Exemplos incluem o milho Bt, resistente a lagartas, e a soja RR, tolerante ao glifosato. Essas cultivares reduziram drasticamente o uso de defensivos em diversas regiões.
No entanto, os OGMs também geraram debates sobre segurança alimentar, patentes e impactos ambientais, impulsionando o surgimento de abordagens mais precisas e aceitas, como a edição gênica.
5. Seleção assistida por marcadores (MAS)
Marcadores moleculares permitem identificar, com precisão, os genes responsáveis por características desejáveis — como resistência à seca ou doenças.
Esses marcadores permitem aos melhoristas selecionarem plantas ainda jovens ou mesmo em estágio de semente, sem necessidade de avaliações em campo, economizando tempo e recursos.
A MAS é especialmente útil em características de herança complexa, onde o fenótipo pode ser fortemente influenciado pelo ambiente.
6. Seleção genômica e bioinformática
Com o avanço do sequenciamento de DNA e da inteligência artificial, tornou-se possível prever o desempenho de uma planta antes mesmo de ela ser plantada. A seleção genômica analisa milhares de marcadores simultaneamente, integrando dados em modelos estatísticos de alta precisão.
Essa abordagem é estratégica em programas de melhoramento florestal, frutífero e animal, onde os ciclos são longos e os custos de avaliação são altos.
7. Edição gênica (CRISPR/Cas9)
A técnica de edição gênica é considerada a fronteira mais avançada do melhoramento moderno. Ela permite modificações precisas e direcionadas no DNA, sem a introdução de genes externos.
Considerada mais “natural” do que a transgenia, a edição por CRISPR já é usada para desenvolver plantas com resistência a vírus, menor tempo de floração e maior valor nutricional.
Além da precisão, a edição gênica reduz o tempo de desenvolvimento de uma nova cultivar e, em alguns países, nem sempre é classificada como OGM, facilitando a aceitação regulatória.
Principais Objetivos do Melhoramento Genético
O melhoramento genético de plantas é guiado por um conjunto de objetivos estratégicos que visam tornar as culturas agrícolas mais produtivas, resistentes e alinhadas às necessidades do mercado e da sociedade. Esses objetivos não apenas aumentam a eficiência das lavouras, mas também contribuem diretamente para a sustentabilidade ambiental e a segurança alimentar global (Figura 3).

Dentre todos os objetivos, o aumento da produtividade é, sem dúvida, o mais clássico e amplamente perseguido. Ao selecionar plantas com maior potencial de rendimento, é possível produzir mais em uma mesma área cultivada – o que reduz a pressão por expansão agrícola sobre novos ecossistemas nativos e maximiza o uso dos recursos como água, nutrientes e energia.
Entretanto, os demais objetivos são igualmente relevantes. O desenvolvimento de cultivares resistentes a pragas, doenças e estresses abióticos permite diminuir o uso de defensivos químicos, reduzindo os custos de produção e o impacto ambiental. Já cultivares de ciclo mais curto possibilitam a realização de duas ou mais safras por ano, otimizando o uso da terra e aumenta a rentabilidade por hectare.
É importante destacar que esses objetivos não são excludentes entre si. O grande desafio do melhoramento genético moderno é combiná-los de forma equilibrada em uma mesma cultivar. Para isso, o setor tem se beneficiado do avanço contínuo de ferramentas biotecnológicas, como a seleção assistida por marcadores, a genotipagem de alta densidade e as novas técnicas de edição gênica, tem tornam o processo mais preciso, rápido e eficiente.
Impacto do Melhoramento Genético na Produtividade
Até os anos 2000, mais de 8 mil variedades melhoradas foram desenvolvidas para as 11 principais culturas agrícolas do mundo. A adoção dessas variedades resultou em um aumento de 21% na produção em países em desenvolvimento entre 1961 e 1980. No período seguinte, de 1981 a 2000, o crescimento da produção cresceu até 50%, revelando os benefícios significativos do melhoramento genético.
Com isso, a produtividade das culturas agrícolas relacionadas aos principais alimentos básicos no mundo cresceu significativamente de 1961 a 2022: aumento de 152% da produtividade do arroz, 131% na produtividade da soja e 239% da produtividade do trigo, por exemplo (Figura 4).

No Brasil, o impacto é ainda mais expressivo. Apenas nos últimos 50 anos, o país deixou de ser importador de alimentos para se tornar uma das maiores potências agroexportadoras. Um exemplo emblemático é a soja, cuja área plantada cresceu 27 vezes desde 1970, e a produção, 76 vezes — saltando de 1,5 para 114 milhões de toneladas.
Essa transformação foi possível graças à introdução de cultivares adaptadas ao cerrado e ao uso de bactérias fixadoras de nitrogênio, como o Bradyrhizobium, que economizam bilhões em fertilizantes sintéticos a cada safra.
Esses ganhos foram possíveis graças ao avanço das técnicas de melhoramento genético, que permitiram a criação de plantas mais resistentes a pragas, doenças e estresses ambientais, reduzindo perdas e aumentando a eficiência de produção.
Casos de sucesso no melhoramento genético no Brasil
Um levantamento detalhado realizado por Ramalho et al. (2021) apresenta uma análise abrangente de casos de sucesso do melhoramento genético no Brasil. A seguir, reunimos os principais destaques desse estudo para ilustrar como o melhoramento genético tem contribuído para ganhos expressivos de produtividade, adaptação a novos ambientes e consolidação do Brasil como potência agrícola global.
🌱 Soja
A adaptação da soja ao Cerrado é um dos marcos mais expressivos do melhoramento genético brasileiro. Originalmente cultivada em regiões de clima temperado, a soja era extremamente sensível ao fotoperíodo — o que inviabilizava sua expansão para latitudes tropicais.
Para superar esse obstáculo, pesquisadores introduziram o traço de longo período juvenil (LJP), que permite o atraso na floração e, consequentemente, uma melhor adaptação à duração dos dias no Cerrado.
Essa modificação foi fundamental para permitir o cultivo da soja em solos ácidos e de baixa fertilidade, transformando o Cerrado na principal fronteira agrícola do país. Hoje, o Brasil é líder mundial em exportações de soja, graças a esse avanço.
🌽 Milho
Outro exemplo marcante é o milho, cuja revolução produtiva veio com a consolidação da segunda safra, ou safrinha.
Tradicionalmente cultivado no verão, o milho passou a ser plantado após a colheita da soja, aproveitando a janela entre safras. Para isso, foi necessário o desenvolvimento de cultivares mais precoces, resistentes ao estresse hídrico e com maior estabilidade de produção.
Essa inovação permitiu o crescimento expressivo da produtividade, que saltou de 1,79 t/ha em 1990 para 5,70 t/ha em 2024, um aumento de 218%.
Hoje, mais de 75% do milho nacional vem da segunda safra, consolidando o Brasil como um dos maiores produtores e exportadores do cereal.
☕ Café
A criação dos cultivares Mundo Novo e Catuaí , desenvolvidos pelo Instituto Agronômico de Campinas (IAC) permitiu que o Brasil expandisse sua produção para novas regiões, como o Cerrado Mineiro. Esses cultivares foram responsáveis por padronização, precocidade, porte baixo e rusticidade, mesmo em ambientes desafiadores, aumentou a competitividade internacional do grão brasileiro.
🎋 Cana-de-açúcar
Com a criação da RIDESA (Rede Interuniversitária para o Desenvolvimento do Setor Sucroenergético) em 1991, os programas de melhoramento da cana avançaram com participação ativa de universidades e empresas. Entre 1970 e 2019, com novos clones lançados anualmente, a produção aumentou 940%, chegando a 752,9 milhões de toneladas, mesmo com expansão para áreas marginais.
🌳Eucalipto
O eucalipto é um exemplo emblemático de como o melhoramento genético pode acelerar ganhos em culturas florestais. Com ciclos longos e alta complexidade genética, o eucalipto se beneficiou do uso de clones e da seleção genômica, iniciado pela Aracruz Celulose (atual Suzano). Hoje, praticamente 100% do carvão vegetal produzido no Brasil vem de florestas plantadas de eucalipto, substituindo a exploração nativa e contribuindo para a sustentabilidade. A seleção clonal acelerou o ganho genético e permitiu que o Brasil se tornasse líder mundial em produtividade florestal.
Impacto econômico do melhoramento genético
O melhoramento genético é mais do que uma ferramenta de laboratório: ele está presente no prato, no campo e na economia. Seus impactos vão além do aumento da produtividade — eles alcançam dimensões ambientais, sociais e econômicas que moldam o futuro da agricultura brasileira e global.
1. Aumento na produtividade, sem expansão de área cultivada
Um dos maiores méritos do melhoramento genético é permitir o aumento da produção sem a necessidade de abrir novas áreas de cultivo. O Brasil, por exemplo, multiplicou a produção de soja em 76 vezes desde 1970, com um aumento de área de “apenas” 27 vezes (Ramalho et al., 2021). Isso representa uma intensificação sustentável, que protege biomas e evita o avanço da fronteira agrícola.
2. Eficiência no uso de recursos naturais
Cultivares mais eficientes no uso de água e nutrientes reduzem a dependência de irrigação e fertilizantes. A fixação biológica de nitrogênio na soja, por exemplo, substitui a aplicação de ureia e economiza até R$ 32 bilhões por safra em fertilizantes sintéticos (Coelho, 2000).
3. Menor uso de agroquímicos
Ao introduzir resistência genética a pragas e doenças, o melhoramento reduz a necessidade de defensivos agrícolas. Isso resulta em menor impacto ambiental, menos resíduos nos alimentos e redução de custos ao produtor. O milho Bt, por exemplo, teve impacto direto na redução da aplicação de inseticidas.
4. Melhoria da qualidade nutricional
Projetos de biofortificação têm aumentado o valor nutricional de alimentos básicos. A introdução de genes que elevam o teor de vitamina A, ferro e zinco em culturas como arroz, milho e feijão é uma estratégia eficaz para combater a desnutrição, especialmente em populações vulneráveis.
5. Contribuição para a segurança alimentar global
Com uma população que deve ultrapassar 9 bilhões de pessoas até 2050, a segurança alimentar depende diretamente de cultivares mais produtivas, resistentes e adaptadas. O melhoramento genético é, portanto, uma resposta científica ao desafio alimentar do século XXI.
Sustentabilidade e melhoramento genético
Além do aumento da produtividade, o melhoramento genético tem desempenhado um papel crucial na sustentabilidade da agricultura. O desenvolvimento de plantas resistentes a pragas e herbicidas reduziu a necessidade do uso excessivo de defensivos agrícolas, minimizando impactos ambientais e promovendo uma produção mais eficiente.
Plantas geneticamente modificadas também têm sido fundamentais na adaptação às mudanças climáticas, permitindo cultivos mais tolerantes à seca e a altas temperaturas. O melhoramento genético também tem contribuído para a eficiência no uso de recursos naturais, como água e nutrientes, tornando a produção agrícola mais sustentável.
Com a evolução contínua das técnicas de melhoramento genético, a expectativa é de que novas cultivares ainda mais produtivas e resilientes sejam desenvolvidas, garantindo a segurança alimentar global e a sustentabilidade do setor agrícola.
De olho no futuro: desafios e oportunidades
Para atender à demanda alimentar da população global que deve alcançar 9 bilhões até 2050, a produção agrícola precisará dobrar. Isso só será possível com inovação genética contínua. No entanto, os gargalos são claros: longos prazos para concessão de patentes, necessidade de modernização da LPC e o combate à pirataria de sementes são temas urgentes na agenda do setor.
Conclusão
O melhoramento genético de plantas é uma das engrenagens centrais que movimentam o agronegócio brasileiro. Ao longo do tempo, essa ciência evoluiu de práticas empíricas para tecnologias altamente sofisticadas, como a edição gênica, contribuindo diretamente para ganhos de produtividade, sustentabilidade e segurança alimentar.
Os casos de sucesso no Brasil mostram que investir em pesquisa, inovação e desenvolvimento de cultivares adaptadas é essencial para enfrentar os desafios climáticos, econômicos e ambientais do presente e do futuro.
Diante da crescente demanda por alimentos, fibras e energia, o melhoramento genético continuará sendo uma ferramenta estratégica para produzir mais, melhor e com menor impacto ambiental. É fundamental que produtores, pesquisadores, empresas e formuladores de políticas públicas mantenham o apoio e o investimento nessa área, garantindo que o Brasil siga na liderança da agricultura sustentável e inovadora.
—
Pós-Graduação em Fisiologia e Nutrição de Plantas
As cultivares evoluem — e o manejo fisiológico e nutricional precisa acompanhar essa evolução. Esteja preparado para atender às exigências das novas variedades com uma formação sólida e atualizada. Inscreva-se na pós-graduação da Agroadvance e potencialize seus resultados no campo! Clique em SAIBA MAIS!
Referências
BRINDANI, A.; GAZOLA NETO, G. Melhoramento genético: estratégia essencial para a produtividade que o mundo precisa. In: CROPLIFE BRASIL. Caminhos do agro: tecnologias que transformam. 2024. P. 46-75.
RAMALHO, M.A.P.; MARQUES, T.L.; LEMOS, R.C. Plant breeding in Brazil: Retrospective of the past 50 years. Crop Breeding and Applied Biotechnology, v. 21, e383021S3, 2021. DOI: 10.1590/1984 70332021v21Sa16.
Sobre a autora:

Beatriz Nastaro Boschiero
Especialista em Conteúdo na Agroadvance
- Pós-doutora pelo CTBE/CNPEM e CENA/USP
- Mestra e Doutora em Solos e Nutrição de Plantas (ESALQ/USP)
- Engenheira Agrônoma (UNESP/Botucatu)
Como citar este artigo
BOSCHIERO, B.N. O melhoramento genético de plantas e o aumento de produtividade das culturas agrícolas. Blog Agroadvance. 2025. Disponível em: https://agroadvance.com.br/blog-melhoramento-genetico-e-produtividade/. Data de acesso: xx Xxx 20xx.