Carryover: o efeito residual de herbicidas no solo

Conheça mais sobre o efeito residual Carryover causado por herbicidas durante os cultivos agrícolas. Descubra mais sobre este efeito e como agir.
Sumário

Certos herbicidas podem permanecer ativos no solo por um determinado tempo e em uma concentração capaz de causar fitotoxicidez a cultura subsequente. A este efeito residual deu-se o nome de “Carryover”.

O que causa o carryover?

Todo herbicida, ao ser aplicado ao solo, sofre uma série de efeitos físicos, químicos e biológicos. Cada herbicida apresenta uma dinâmica diferente às ações do ambiente, variando assim a sua persistência no solo.

Entender o efeito carryover de cada herbicida aplicado é essencial para que a sua ação não venha afetar as culturas subsequentes, especialmente nos casos de rotações de culturas (MANCUSO; NEGRISOLI; PERIM, 2011).

Os herbicidas podem ser seletivos a uma cultura e a outra não. Vamos no caso clássico da rotação soja e milho: os herbicidas inibidores de ACCase, como o fluazifop ou clethodim, são seletivos para a soja e podem ser aplicados em área total.

Porém, se o produtor aplicar um destes herbicidas em final de safra ou na dessecação da área de soja, ele terá que esperar cerca de 14 dias para ter um residual seguro para a semeadura do milho. Caso contrário, ao semear o milho antes do período de carência, a cultura irá sofrer com os danos e apresentar graves sintomas de fitotoxicidade (Figura 01).


Figura 01. Injúria causada pela aplicação de fluazifop na cultura do milho (Marchi et al., 2008).

Qual a importância do carryover?

O conhecimento da dinâmica dos herbicidas no solo é essencial para o manejo de rotação de culturas e carryover. As propriedades físico-químicas dos herbicidas devem ser estudadas e bem direcionadas de forma a selecionar os herbicidas corretos para cada situação.

O efeito residual é uma característica desejada em todos os herbicidas pré-emergentes: períodos maiores de efeito residual resultam em períodos maiores de controle das plantas daninhas. O controle eficiente das plantas daninhas em pré-emergência se deve graças ao efeito residual dos herbicidas no solo.

O problema é quando esse residual causa impactos negativos no manejo de rotação de culturas. Alguns herbicidas apresentam residual de mais de 100 dias, podendo afetar e até mesmo impossibilitar certas culturas (MANCUSO; NEGRISOLI; PERIM, 2011).

Como evitar problemas com carryover?

Todos os herbicidas devem conter, nas recomendações dos fabricantes, informações suficientes sobre o residual do herbicida no solo (geralmente localizados na seção ‘Limitações de uso’). Esse período em que haverá efeito residual no solo pode ser alterado conforme a dose aplicada, o tipo de solo, quantidade de matéria orgânica e clima onde é aplicado (MELO et al., 2016).

Dessa forma, o produtor deve planejar com cautela os herbicidas a serem aplicados lembrando da cultura subsequente. Portanto, o planejamento prévio das aplicações e das culturas em sucessão é o melhor modo de evitar problemas com carryover.

Há também a possibilidade de o produtor utilizar doses menores, porém ainda efetivas e sempre seguindo a bula, resultando em menor concentração do produto no solo e menor efeito residual. Doses superiores vão demorar mais para serem degradadas e tendem a permanecer por mais tempo no solo.

Outro ponto interessante seria o posicionamento das aplicações. O produtor pode optar por aplicar com jatos dirigidos, diminuindo a quantidade de produto aplicado no campo em relação a aplicações em área total.

Em alguns casos, em áreas que contenham residual alto de herbicidas não-seletivos a cultura, pode-se utilizar de algumas técnicas de fitorremediação. A fitorremediação é uma técnica alternativa para remediar os efeitos residuais de herbicidas no solo.

Ele pode ser feito por meio de ‘plantas despoluidoras’, cultivando essas plantas na área com o intuito de receber e retirar o residual do herbicida no solo (SUSARLA et al., 2002). Um exemplo que temos na literatura é o uso de feijão-de-porco para fitorremediar o efeito de trifloxysulfuron no solo (PROCÓPIO et al., 2007).

Carryover na cultura da cana-de-açúcar

No caso da cana-de-açúcar, o produtor tem a vantagem de conduzir a cultura por pelo menos quatro anos, possibilitando utilizar herbicidas com residuais longos no começo do cultivo. Entretanto, o uso de adubação verde ou rotação de culturas é comum na cultura canavieira, necessitando atenção do produtor aos produtos utilizados nas duas últimas safras.

Além disso, levando em conta o sucesso da condução em MEIOSI (Método Inter-rotacional Ocorrendo Simultaneamente), onde há o cultivo de uma linha-mãe de cana-de-açúcar com alguma cultura entre as linhas-mãe, comumente sendo soja, amendoim, feijão ou mesmo algum adubo verde (CAMPOS, 2018), é de extrema importância o manejo adequado das aplicações de herbicidas para não sofrer com danos pelo carryover de algum desses herbicidas.

Existem muitos herbicidas pré-emergentes registrados para a cultura da cana-de-açúcar e, muitos deles apresentam um alto efeito residual. O exemplo mais conhecido seja talvez o herbicida tebuthiurom, com até 24 meses de residual, ou seja, deve haver um espaçamento de 24 meses entre a aplicação do herbicida e o plantio das culturas suscetíveis.

Outro exemplo é do herbicida imazapic, recomendado para cana e amendoim, apresenta residual de até 300 dias, dependendo das condições climáticas. As culturas suscetíveis estão geralmente reportadas nas informações dos fabricantes ou na literatura com as pesquisas das universidades. Há ainda necessidade de avaliação de diversas culturas e suas suscetibilidades aos herbicidas.

Relatos Literários do Carryover

Há relatos na literatura de efeitos de carryover do herbicida sulfentrazone em rotações com aveia e trigo até 300 dias após aplicação (BLANCO; VELINI, 2005) e em rotação com adubos verde (MALARDO et al., 2014).

Similarmente, o herbicida amicarbazone pode acarretar carryover na sucessão com soja perene, mucuna preta e crotalárias (MALARDO et al., 2014). Herbicidas como mesotriona, amicarbazone e ametrina podem apresentar efeitos negativos na cultura do feijão (VITI, 2014).

Aplicações de altas doses de atrazina pode afetar a cultura da soja em até 54 dias após a aplicação do herbicida (CARRATI et al., 2014). Em períodos de seca, pode-se encontrar persistência maior da atrazina no solo, podendo causar injúrias significativas na soja (Figura 02).

Considerações finais

 Apesar do efeito residual ser um fator chave para os herbicidas, se negligenciado, pode resultar em prejuízos para a cultura e para o produtor. O efeito carryover dos herbicidas vão depender do produto a ser utilizado, das condições a serem aplicadas (dose, posicionamento) e das condições edafoclimáticas.

Quando negligenciado, o efeito carryover pode causar injúrias severas na cultura subsequente ou até mesmo impossibilitar o cultivo de certas culturas. Portanto, quando bem planejada e manejada, os herbicidas vão ser grandes aliados do produtor e não vai haver problemas com carryover. Procure sempre as informações dos fabricantes e nas literaturas científicas, seguindo sempre as recomendações das bulas.

Referências

BLANCO, F.M.G., VELINI, E.D. Persistência do herbicida sulfentrazone em solo cultivado e seu efeito em culturas sucedâneas. Planta Daninha. Viçosa, 23:693-700.

CAMPOS, L. H. F. Resíduos de herbicidas aplicados em cana-de-açúcar afetando adubos verdes e a cultura da soja em rotação. Tese (Doutorado). Universidade de São Paulo – Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, Piracicaba. 2018.

CARRATI, F.C., et al. Efeito residual de atrazina na cultura da soja. In: Congresso Brasileiro das Plantas Daninhas, SBCPD, Gramado, 2014.

JOHNSON, D., STRACHAN, S. How to mitigate herbicide carryover injury following drought. Pioneer (USA). Acesso em: https://www.pioneer.com/us/agronomy/Mitigating-Herbicide-Carryover-Injury-Following-Drought.html.

MALARDO, M.R., et al. Tolerância de Crotalaria breviflora e C. juncea aos herbicidas registrados para a cultura do milho. In: 29 Congresso Brasileiro de Ciências das Plantas Daninhas, Gramado, p. 152-157, 2014.

MANCUSO, M. A. C., NEGRISOLI, E., & PERIM, L. Efeito residual de herbicidas no solo (“Carryover”). Revista Brasileira de Herbicidas10(2), 151-164, 2011.

MARCHI, G., MARCHI, E. C. S., & GUIMARÃES, T. G. Herbicidas: mecanismos de ação e uso. Embrapa Cerrados, Documentos (INFOTECA-E), 2008.

MELO, C. A. D., et al. “Herbicides carryover in systems cultivated with vegetable crops.” Revista Brasileira de Herbicidas, 15.1: 67-78, 2016.

PROCÓPIO, S.O. et al. Development of bean plants in soil contaminated with trifloxysulfuron-sodium after Stizolobium aterrimum and Canavalia ensiformis cultivation. Planta Daninha, v.25, n.1, p.87-96, 2007.

SUSARLA, S.; MEDINA, V.F.; McCUTCHEON, S.C. Phytoremediation: na ecological solution to organic Chemical contamination. Ecological Engineering, v.18, n.5, p.647-658, 2002.

VITI, M.L. Remobilização de resíduos ligados de herbicidas em solos de cultivo de cana-de-açúcar com aplicação e vinhaça, palha de cana e torta de filtro e identificação de metabólitos. Dissertação (Mestrado), 82 p., Centro e Energia Nuclear (CENA-USP), Piracicaba, 2014.

Este texto é opinião do autor, não reflete necessariamente opinião da Agroadvance.

Sobre o autor:

PESQUISAR
COMPARTILHAR
Mais Lidos Da Semana
CATEGORIAS
VOCÊ TAMBÉM PODE GOSTAR:
sucessão na agricultura familiar
Terei um sucessor na minha propriedade? 4 fatores que influenciam a sucessão na agricultura familiar
Entenda como renda, tamanho da propriedade e incentivos familiares impactam a decisão...
Ler Mais »
image-56
Manejo do nitrogênio na cultura do feijão
O manejo do nitrogênio na cultura do feijão é muito importantes no cultivo do feijão,...
Ler Mais »
fertilidade do solo
Fertilidade do solo e a alta produtividade na lavoura
Entenda como a fertilidade do solo está correlacionada com a produtividade agrícola...
Ler Mais »

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *