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Fungos micorrízicos arbusculares na cultura da soja

Fungos micorrízicos arbusculares: o que são e quais suas características? Entenda os benefícios desses aliados invisíveis para a cultura da soja.

Relações simbióticas entre plantas e microrganismos presentes no solo ajudam o crescimento vegetal e a mitigação de estresses ambientais.

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O exemplo mais notável para a cultura da soja dessas interações é a simbiose com bactérias capazes de fixar o nitrogênio atmosférico. Essas bactérias se alojam em nódulos das raízes da soja, permitindo a absorção de todo o N necessário para o crescimento da cultura.

Existem outras associações igualmente importantes para o desenvolvimento das plantas: é o caso da associação simbiótica com as micorrizas arbusculares, que envolve as raízes das plantas e um grupo específico de fungos de solo, denominados Fungos Micorrízicos Arbusculares (FMA).

Tais microrganismos produzem estruturas fúngicas altamente ramificadas, denominadas arbúsculos, nas células corticais das raízes de suas plantas hospedeiras, com as quais trocam minerais inorgânicos, especialmente fósforo e compostos de carbono.

Estes fungos estão adaptados a vários ambientes e mantêm relações simbióticas com mais de 200.000 espécies de plantas; no entanto, apenas cerca de 240 espécies foram descritas até o momento.

Continue a leitura para entender o que são, suas caraterísticas e os benefícios e desafios da inoculação com fungos arbusculares na cultura da soja.

O que são fungos micorrízicos arbusculares?

Os fungos micorrízicos arbusculares são um grupo específico de fungos de solo, pertencentes ao filo Glomeromycota, que estabelecem uma relação mutualística com as raízes das plantas, incluindo a soja. Essa simbiose permite a troca de nutrientes entre as partes envolvidas, resultando em benefícios mútuos.

Enquanto as plantas fornecem açúcares aos fungos, estes por sua vez ampliam a capacidade das raízes em absorver nutrientes, principalmente fósforo, do solo – que é absorvido expressivamente pelo mecanismo de difusão (o nutriente entra em contato com a raiz ao passar de uma região de maior concentração para uma de menor concentração próxima da raiz).

E como se dá essa associação simbiótica?

O processo de estabelecimento da simbiose dos fungos micorrízicos arbusculares com as raízes das plantas inicia-se com a produção e exsudação de estrigolactonas na rizosfera pelas raízes das plantas sob condições nutricionais deficientes (principalmente escassez de fosfato).

As estrigolactonas induzem a ramificação hifal dos esporos germinadores dos fungos arbusculares, facilitando o contato com a raiz do hospedeiro.

Paralelamente, o fungo micorrízicos produz e libera os chamados fatores Myc, que atuam nas raízes das plantas induzindo respostas moleculares necessárias para uma colonização bem-sucedida.

Após o contato, as hifas fúngicas crescem intracelularmente para o córtex interno, onde o arbúsculo característico é formado para a troca de nutrientes (Figura 1).

Modelo de simbiose entre fungos micorrízicos arbusculares (FMAs) e a planta hospedeira
Figura 1. Modelo de simbiose entre fungos micorrízicos arbusculares (FMAs) e a planta hospedeira. Fonte: Lopez-Raéz &. Pozo (2013).

Características das micorrizas arbusculares e benefícios para a cultura da soja

As micorrizas arbusculares formam estruturas microscópicas chamadas arbúsculos nas células das raízes. Essas estruturas aumentam a área de superfície de absorção radicular das plantas, permitindo a troca eficiente de nutrientes entre os parceiros (planta e fungo).

Além do fósforo, os fungos micorrízicos arbusculares também auxiliam na absorção de outros elementos como nitrogênio, zinco e potássio. Esse relacionamento simbiótico beneficia não apenas a planta hospedeira, mas também a qualidade do solo e a sustentabilidade do sistema agrícola.

Em razão da grande representatividade do cultivo de soja na produção de grãos no Brasil e no mundo, estudos buscam compreender a extensão dos benefícios promovidos pela inoculação de fungos micorrízicos arbusculares na soja (Tabela 1).

Tabela 1. Resultados de estudos envolvendo a resposta da soja à inoculação de fungos micorrízicos arbusculares em diferentes condições de cultivo

Espécie de FMAPrincipais resultados
FMA autóctones Claroideoglomus etunicatum, Funneliformis mosseae, Glomus macrocarpum e Rhizophagus intraradicesAumento de crescimento, rendimento e acúmulo de P
G. etunicatum e G. fasciculatum.Tolerância das plantas à acidez do solo
G. etunicatum, G. macrocarpum, Gigaspora margarita e R. intraradices.Redução do efeito fitotóxico de metais (Pb, Mn) sobre as plantas.
FMA autóctones e G. macrocarpum.Interação positiva com a comunidade autóctone, aumento da biomassa microbiana e atividade biológica do solo.
C. etunicatum, Dentiscutata heterogama e R. clarusCrescimento inicial da soja e acúmulo de nutrientes com aplicação de formononetina
G. clarum, G. etunicatum, G. fasciculatum, G. macrocarpum, G. margarita e R. intraradices.Sinergia entre FMA e BFN, maior crescimento da soja, nodulação, acúmulo de P e N, e produção de açúcares
FMA autóctonesAumento da colonização micorrízica e biomassa de raízes, em conjunto com fungos promotores de crescimento de plantas
F. mosseae e R. intraradicesProteção contra patógenos de raiz e parte aérea.
Fonte: Stoffel et al. (2022).

Os principais benefícios dos fungos micorrízicos arbusculares para a cultura da soja são apresentados na Figura 2 e incluem:

  1. Melhoria na absorção de nutrientes: As micorrizas arbusculares expandem a capacidade das raízes em capturar nutrientes, principalmente o fósforo, aumentando a disponibilidade de nutrientes essenciais para o crescimento da soja.
  2. Aumento da resistência a estresses: As micorrizas arbusculares conferem maior tolerância a estresses abióticos, como seca e altas temperaturas, contribuindo para a estabilidade do rendimento da soja em condições adversas.
  3. Redução do uso de fertilizantes: Ao aumentar a eficiência na absorção de nutrientes, os fungos micorrízicos arbusculares permitem a redução da aplicação de fertilizantes químicos, resultando em economia de recursos e menor impacto ambiental.
  4. Promoção do desenvolvimento radicular: A simbiose com fungos micorrízicos arbusculares estimula o crescimento radicular, possibilitando maior exploração do solo e, consequentemente, melhor absorção de água e nutrientes.

Efeitos positivos da colonização por fungos micorrizízicos arbusculares
Figura 2. Efeitos positivos da colonização por fungos micorrizízicos arbusculares (FMAs). A rede hifal dos fungos micorrízicos arbusculares se estende além da zona de depleção (cinza), acessando uma área maior de solo para absorção de fosfato. Uma zona de depleção de fosfato micorrízico também se formará ao redor das hifas AM (roxas). Outros nutrientes que melhoraram a assimilação nas raízes AM incluem nitrogênio (amônia) e zinco. Os benefícios da colonização incluem tolerância a muitos estresses abióticos e bióticos através da indução de resistência sistêmica adquirida (SAR). Fonte: Jacott et al. (2017).

Inoculantes micorrízicos na cultura da soja: desafios e perspectivas futuras

A inoculação com fungos micorrízicos arbusculares na soja oferece benefícios, mas sua implementação comercial enfrenta desafios tecnológicos e de formulação. O progresso nesse campo depende de abordagens de pesquisa inovadoras e da colaboração entre cientistas e setor agrícola para fornecer produtos eficazes e economicamente viáveis.

Formulações e Métodos de Cultivo

Devido aos diversos benefícios oferecidos pelos FMA, há esforços para desenvolver formulações contendo esses fungos para aplicação em larga escala.

No entanto, a criação de produtos comerciais para essa finalidade apresenta desafios significativos, principalmente na produção de inoculantes que atendam as especificações do mercado, em termos de custo, pureza e qualidade.

Os fungos micorrízicos arbusculares são biotróficos obrigatórios, ou seja, dependem do estabelecimento de simbiose com raízes de plantas compatíveis para completar seu ciclo de vida. Esta característica dificulta a produção asséptica de inoculante e seu registro no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).

Produto Comercial

Até agora, somente um produto de inoculação contendo fungo micorrízico arbuscular foi oficialmente aprovado pelo MAPA no Brasil – Rootella BR, sob n° 22902 10000-0. Esse inoculante é formulado em pó e contém propágulos da espécie Rhizoglomus intraradices (Rhizophagus intraradices). Sua eficácia na agricultura foi demonstrada através de testes realizados em campos de soja e milho, abrangendo cinco diferentes condições climáticas e de solo em diversas regiões do país.

Além dessa espécie, o Rhizoglomus clarum também vem sendo testado em campo no Brasil, porém sem registro comercial.

Desafios e Limitações

Vários desafios surgem ao produzir inóculos de fungos micorrízicos arbusculares. Um método envolve o cultivo em substrato sólido, que é relativamente simples, mas adequado apenas para escalas menores. Sistemas hidropônicos e aeropônicos requerem modificações nas concentrações de nutrientes para não prejudicar a colonização micorrízica. O cultivo em biorreatores oferece a produção em larga escala, mas é complexo e custoso.

Controle de Qualidade e Aplicação

A qualidade dos inóculos é um aspecto crítico, já que produtos frequentemente não apresentam a efetividade desejada. Métodos moleculares para identificação de espécies de fungos micorrízicos arbusculares e microrganismos contaminantes estão sendo desenvolvidos. Além disso, os produtos devem ser adaptados às diferentes demandas e modos de aplicação, visando melhorar a produtividade e a sustentabilidade agrícola.

Conclusão

Os fungos micorrízicos arbusculares estão se tornando cada vez mais relevantes na agricultura da soja devido aos seus efeitos positivos sobre o crescimento, desenvolvimento e resistência das plantas.

A adoção de inoculantes micorrízicos promete trazer melhorias significativas à produtividade da soja, ao mesmo tempo em que contribui para práticas agrícolas mais sustentáveis.

Com pesquisas contínuas e desenvolvimento de tecnologias adequadas, os fungos micorrízicos arbusculares podem se tornar um pilar fundamental na busca por uma agricultura mais eficiente e ecologicamente responsável.

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Referências 

JACOTT, C.N.; MURRAY, J.D.; RIDOUT, C.J. Trade-offs in arbuscular mycorrhizal symbiosis: disease resistance, growth responses and perspectives for crop breeding. Agronomy, v. 7, artigo 75, 2017. DOI: 10.3390/agronomy7040075.

LÓPEZ-RÁEZ, R.; POZO, M. Chemical Signalling in the Arbuscular Mycorrhizal Symbiosis: Biotechnological Applications. In: AROCA, R. (Ed). Symbiotic Endophytes. Springer Science & Business Media. 2015. p. 215-232. DOI: 10.1007/978-3-642-39317-4_11.

STOFFEL, S.C.G.; SOARES, C.R.F.S.; GIANCHINI, A.J.; LOVATTO, P.E. Inoculantes micorrízidos arbusculates para a cultura da soja. In: MEYER, M.C.; BUENO, A.F.; MAZARO, S.M.; SILVA, J.C. (eds). Bioinsumos na cultura da soja. Brasília, DF: Embrapa, 2022, p. 181-198. Disponível em: https://www.embrapa.br/en/busca-de-publicacoes/-/publicacao/1143066/bioinsumos-na-cultura-da-soja/. Acesso: 29 de agosto de 2023.

Sobre a autora:

Beatriz Nastaro Boschiero

Beatriz Nastaro Boschiero

Especialista em MKT de Conteúdo na Agroadvance

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