Microrganismos solubilizadores de fósforo: importância, mecanismos e aplicações práticas

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Os Microrganismos Solubilizadores de Fósforo (MSPs) são os organismos que têm o potencial de converter o fósforo insolúvel presente no solo em uma forma disponível para as plantas, ou seja, são captadores de fósforo.  

Dentre os MSPs estão as bactérias, das quais cepas pertencentes aos gêneros Acinetobacter, Alcaligenes, Arthrobacter, Bacillus, Burkholderia, Clostridium, Enterobacter, Erwinia, Exiguobacterium, Natrinema, Pseudomonas, Rhizobium e Serratia foram relatados como solubilizadores de P eficientes e potenciais (GARCIA et al. 2015; KOUR et al. 2021). 

Os fungos também se destacam como solubilizadores, sendo os gêneros Aspergillus, Penicillium, Acremonium, Hymenella, e Neosartorya conhecidos por sua capacidade de solubilização de fosfato (RAWAR et al., 2020). 

Os MSPs agem não apenas solubilizando fosfatos, mas também promovendo o crescimento das plantas e o rendimento das culturas, produzindo hormônios promotores do crescimento das plantas, como auxinas, giberelinas e citocininas e antibiose contra patógenos (desaminase do ácido 1-aminociclopropano-1-carboxílico), que aumenta o crescimento das plantas sob condições de estresse (RAWAR et al., 2020). 

 

Formas de fósforo e sua dinâmica no solo 

O fósforo ocorre no solo em formas orgânicas e inorgânicas (Figura 1). Apesar de sua abundância no solo, pequena quantidade de fósforo está disponível para absorção pelas plantas (na forma de H2PO4 e HPO42-), devido à sua complexação com íons metálicos no solo. 

O fósforo orgânico constitui de 20 a 30% do fósforo total no solo, sendo derivado da decomposição da biomassa vegetal e de resíduos microbianos.  

O fósforo inorgânico, por sua vez, representa 70 a 80% do P total no solo e compreende fosfatos e minerais como fosfato de cálcio (forma predominante em solos alcalinos), fosfato de alumínio e fosfato de ferro (formas predominantes em solos ácidos).  

 

Diferentes formas de fósforo e sua dinâmica no solo. P fósforo, Pi fósforo inorgânico, Po fósforo orgânico, Fe ferro, Fe-P fosfato de ferro, Al-P fosfato de alumínio, Ca-P fosfato de cálcio

Figura 1. Diferentes formas de fósforo e sua dinâmica no solo. P fósforo, Pi fósforo inorgânico, Po fósforo orgânico, Fe ferro, Fe-P fosfato de ferro, Al-P fosfato de alumínio, Ca-P fosfato de cálcio. Fonte: Rawat et al. (2020) 

  

A dinâmica do fósforo no solo depende, principalmente da: 

  • dissolução e precipitação,  
  • sorção e dessorção, e  
  • Inter conversão entre formas orgânicas e inorgânicas de fósforo. 

  

Mecanismo de solubilização de fosfato pelos Microrganismos solubilizadores de fósforo

As principais estratégias adotadas pelos MSPs para a dissolução de fosfatos estão listadas na Figura 2 e incluem: 

  • exsudação de ácidos orgânicos, prótons e sideróforos;  
  • excreção de enzimas extracelulares; e  
  • degradação do substrato via mineralização 

 

solubilização de fosfato por Microrganismos Solubilizadores de Fosfato

Figura 2. Apresentação esquemática de solubilização de fosfato por Microrganismos Solubilizadores de Fosfato. A placa PSB ilustrada na figura representa bactérias solubilizadoras de fosfato com formação de zona de halo. Fonte: Rawat et al. (2020). 

 

Os mecanismos utilizados para a liberação de fósforo (orgânico ou inorgânicos) listados abaixo estão descritos no artigo de Rawat et al. (2020). 

 

Mecanismos utilizados para solubilização de fosfato inorgânico 

Os fosfatos inorgânicos do solo como Fe-P, Al-P e Ca-P são solubilizados das seguintes maneiras:  

 

Produção de ácidos orgânicos 

A fermentação, a respiração de compostos orgânicos de carbono ou a oxidação direta são as principais vias metabólicas para a produção de ácidos orgânicos (compostos de baixo peso molecular como ácido cítrico, ácido glucônico, ácido oxálico, ácido tartárico) excretados pelos MSPs que resultam em acidificação nas proximidades de micróbios, liberando fosfatos de complexos por substituição de prótons por cátions como Fe+3 e Al+3 ou pela troca de fosfato (PO42−) por ânions ácidos. 

 

Produção de ácido inorgânico e H2S 

A produção de ácido clorídrico, ácido sulfúrico, ácido nítrico e ácido carbônico pelos MSPs foi relatada como mecanismo para solubilizar fosfato, contudo esse mecanismo apresenta baixa eficiência em comparação com ácidos orgânicos.  

Além disso, bactérias acidófilas e oxidantes de enxofre produzem H2S como um subproduto metabólico da decomposição microbiana de matéria orgânica, redução de sulfato e outras reações bioquímicas, que reage com fosfato férrico e forma sulfato ferroso, liberando o fósforo ligado. 

 

Liberação de prótons do NH4+ (assimilação/respiração) 

A extrusão de prótons é um modo alternativo de dissolução de fósforo no solo por microrganismos.  

O amônio (NH4+) presente no solo é assimilado pelos MSPs para a síntese de aminoácidos. Dentro da célula microbiana, NH4+ é convertido em amônia (NH3) e o excesso de próton H+ é liberado no citoplasma da célula microbiana. Isso acidifica o meio ao redor da célula microbiana, o que ajuda na dissolução de fosfatos insolúveis. 

 

Mecanismos indiretos 

A lise celular microbiana durante condições de estresse libera fósforo no solo, que é absorvido por plantas e outros organismos do solo. 

 

Via de Oxidação direta 

Na via de oxidação direta, a glicose é convertida ao ácido glucônico pela glicose desidrogenase e posteriormente oxidado ao ácido 2-cetoglucônico pela gluconato desidrogenase. Esses ácidos atuam como quelantes de minerais como Ca2+ e Fe2+ de sua forma ligada ao fosfato.  

 

Produção de exopolissacarídeo (EPS) 

Exopolissacarídeos são homo ou heteropolímeros de carboidratos com um componente orgânico ou inorgânico que é exsudado por microorganismos fora de sua parede celular. O EPS é produzido por micróbios em resposta ao estresse e forma complexos com íons metálicos presentes no solo (Al3+> Cu2+> Zn2+> Fe3+> Mg2+> K+). 

 

Produção de sideróforos 

 Sideróforos são compostos quelantes de ferro de baixo peso molecular e alta afinidade que são excretados por microrganismos e plantas em resposta ao estresse de ferro no ambiente. São os agentes complexantes de íons férricos mais fortes existentes. 

 

 

Mecanismos utilizados para solubilização de fosfato orgânico 

Os fosfatos orgânicos constituem 20-30% do fósforo total no solo. A dissolução de fosfatos orgânicos ocorre via processo de mineralização através da ação de enzimas: 

 

Fosfatases ácidas não específicas (NSAPs):  

Podem ser fosfatases ácidas (predominam em solos ácidos) e fosfatases alcalinas (predominam em solos básicos). As fosfatases catalisam a desfosforilação de fosfoésteres ou ligações fosfoanidrido de compostos orgânicos. 

 

Fitases 

As fitases catalisam a remoção de fósforo do composto fitato (fósforo orgânico abundante no solo), que é a fonte dominante de inositol e fósforo armazenado nas sementes e pólen.  

 

Fosfonatases/Liases de Carbono-Fósforo (C-P) 

Esta classe de enzimas catalisa a quebra da ligação C-P de organofosforados, melhorando a disponibilidade de fósforo às plantas. 

  

Interação entre bactérias e fungos na solubilização de P insolúvel  

A combinação do uso de bactérias e fungos parece ser ainda mais benéfica para a solubilização de fosfato. Além disso, o silício também parece ter papel importante nesse processo. 

Em revisão publicada por ETESAMI et al. (2021) os autores discutem que a estratégia combinada da utilização de silício, fungos micorrízicos arbusculares (FMA) e bactérias solubilizadoras de fosfato (BSP) pode ser muito útil para melhorar a disponibilidade de P e, como resultado, impulsionar a absorção de fosfato pelas plantas em comparação com o uso de qualquer um deles sozinho (Figura 3). 

 

silício, fungos micorrízicos arbusculares (FMA) e bactérias solubilizadoras de fosfato na mineralização do fósforo orgânico
microrganismos solubilizadores de fósforo

Figura 3. Representação esquemática do papel do silício (Si), fungos micorrízicos arbusculares (FMA) e bactérias solubilizadoras de fosfato (BSP) na mineralização do fósforo orgânico (Po).

 O Si aumenta os produtos fotossintéticos na raiz e na rizosfera, melhorando os parâmetros fotossintéticos da planta. A frutose exsudada por FMA estimula a expressão de genes de fosfatase em BSP, bem como a taxa de liberação de fosfatase no meio de crescimento, regulando seu sistema secretor de proteínas. A atividade da fosfatase é subsequentemente aumentada, promovendo a mineralização de Po (ou seja, fitato) em Pi, estimulando simultaneamente os processos envolvidos na captação de P pelos FMA. ST, transportador de açúcar; fruT, transportador de frutose; glut, transportador de glicose; PT, transportador de fosfato; PSS, sistema secretor de proteínas; Pase, fosfatase; Pi, P inorgânico; e Po, P orgânico. Fonte: Traduzido de ETESAMI et al., (2021). 

 

Teoria x aplicação prática 

Diversos estudos mostram a importância estratégica dos microrganismos solubilizadores de fósforo à campo. Contudo, a diversidade ecológica de espécies é um desafio para o desenvolvimento de produtos comerciais que possam ser utilizados a campo. É fundamental realizar o isolamento e caracterização de novas cepas, o que é demorado, trabalhoso e caro. 

Além disso outras dificuldades para uso à campo incluem: identificação combinações de estirpes adequadas e a estabilidade genética das mesmas, seleção do melhor meio para multiplicação em massa dos microrganismos, escolha do melhor método de aplicação e de técnicas de manejo para aumentar a eficiência do produto. 

No Brasil o primeiro inoculante composto por microrganismos solubilizadores de fosfato (BiomaPhos®) foi lançado em 2019 pela Embrapa em parceria com a empresa Bioma, após mais de 15 anos de pesquisas.

Trata-se de um inoculante isolados das cepas BRM 119 (Bacillus megaterium) e BRM 2084 (Bacillus subtilis). O produto foi desenvolvido pela equipe liderada pela Drª. Christiane Abreu de Oliveira Paiva pesquisadora da Embrapa Milho e Sorgo. 

É vendido em forma líquida, indicado para aplicação via jato em sulco de semeadura ou para tratamento de sementes. Os testes realizados com o inoculante BiomaPhos®, teve como resultados o aumento da disponibilidade do nutriente às raízes e o consequente incremento de até 10% na produção de grãos.

Portanto o uso desse inoculante a base de bactérias solubilizadoras de fósforo pode resultar em uma redução dos custos com fertilizantes fosfatados. 

Apesar dos resultados promissores os pesquisadores responsáveis pelas pesquisas não orientam a redução das doses de fósforo aplicados à cultura.  

É importante considerar que a grande diversidade de agentes biológicos, diferentes condições edafoclimáticas distintas no Brasil e condições de manejo cultural podem influenciar no desempenho desse tipo de produto. Assim, como precaução, a utilização de associações de biológicos devem ser validadas e orientadas pela pesquisa. 

Novas tecnologias

Novas tecnologias vêm sendo desenvolvidas bem como novos estudos para superar esses desafios.

Empresas e universidades vêm investindo nesse ramo promissor, pois através dos inoculantes solubilizadores de fosfato é possível aproveitar de maneira mais eficiente o fósforo do solo, aumentando a produtividade e reduzindo custos com adubação fosfatada.

Desta forma o uso de inoculantes solubilizadores de fosfato se mostra extremamente vantajoso, tanto no quesito agronômico quanto econômico para o produtor. 

  

Considerações 

Para superar o problema da indisponibilidade de fósforo nos solos agrícolas há aplicações de elevadas doses de fertilizantes fosfatados ao solo. A aplicação de microorganismos solubilizadores de fosfato (MSPs) no solo é, portanto, uma abordagem promissora sem consequências ambientais e socioeconômicas negativas. 

Combinar o uso de MSPs com fosfatos naturais à campo é outra opção para melhorar a eficiência do uso do fósforo e o rendimento da cultura.  

Os microrganismos solubilizadores de P servem como potentes biofertilizantes que melhoram o rendimento agrícola em harmonia com as preocupações ecológicas.  

O uso de solubilizantes de P, sozinhos ou em combinação com outros micróbios promotores de crescimento de plantas como um consórcio microbiano ecologicamente correto, poderia aumentar a absorção de P pelas culturas, aumentando seus rendimentos para a sustentabilidade agrícola e ambiental.  

No entanto, a seleção de um solubilizador de fosfato potente com características multifuncionais de promoção do crescimento de plantas é de extrema importância para o desenvolvimento do comércio biofertilizantes com maior vida útil.  

O isolamento e a caracterização de MSPs capazes de sobreviver em um ambiente variável são o maior desafio para utilização desses microrganismos a campo. 

Assim, mais pesquisas são necessárias para avaliar a estabilidade e desempenho solubilizantes de P, tanto natural quanto cepas geneticamente modificadas aplicadas a sistemas solo-planta, para descobrir novos isolados de diversos nichos ecológicos e explorar ainda mais seus metabolismo para melhorar sua capacidade de solubilização de fosfato. 

 

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Referências 

ETESAMI, H.; JEONG, B.R.; GLICK, B.R. Contribution of Arbuscular Mycorrhizal Fungi, Phosphate–Solubilizing Bacteria, and Silicon to P Uptake by Plant. Frontiers in Plant Science. 2021
https://doi.org/10.3389/fpls.2021.699618 

GARCIA, R.A.; LOVAISA, N.C.; ULLA, E.L. Isolation and characterization of phosphate solubilizing bacteria in northwestern Argentina and its effect in promoting growth in maize (Zea mays L.). Rev. agron. noroeste argent. V. 35, p. 13-28, 2015. 

KOUR. D.; RANA, K.L.; KAUR, T.; YADAV, N.; YADAV, A.N.; KUMAR, M.; KUMAR, V.; DHALIWAL, H.S.; SAXENA, A.K. Biodiversity, current developments and potential biotechnological applications of phosphorus-solubilizing and -mobilizing microbes: A review. Pedosphere, V. 31, P. 43-75, 2021. https://doi.org/10.1016/S1002-0160(20)60057-1. 

RAWAT, P.; DAS, S.; SHANKHDHAR, D.; SHANKHDHAR, S.C. Phosphate-Solubilizing Microorganisms: Mechanism and Their Role in Phosphate Solubilization and Uptake. Journal of Soil Science and Plant Nutrition. 2020.  https://doi.org/10.1007/s42729-020-00342-7. 

Sobre a autora:

Beatriz Nastaro Boschiero

Beatriz Nastaro Boschiero

Especialista em MKT de Conteúdo na Agroadvance

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