O algodão (Gossypium hirsutum L.) destaca-se como uma das culturas agrícolas de maior importância econômica e social no mundo.
Responsável pela maior parte das fibras naturais utilizadas pela indústria têxtil, o algodoeiro ocupa mais de 33 milhões de hectares globalmente, sendo cultivado em mais de 100 países (Hussain et al., 2020; Feng et al., 2020).
O Brasil figura entre os maiores produtores mundiais, ocupando a terceira posição em produção e liderando na exportação de pluma, com cerca de 2,6 milhões de toneladas exportadas na safra 2023/2024 (CONAB, 2024).
Com produtividade média de 1.900 kg/ha de fibra, o país se destaca especialmente pelo desempenho de áreas de sequeiro no Cerrado, onde se concentram aproximadamente 90% da produção nacional (Echer et al., 2024).
Do algodão em caroço, obtém-se o algodão em pluma, principal matéria-prima da indústria têxtil. O caroço de algodão é utilizado na alimentação animal e na produção de sementes.
Já a fibrilha, composta por fibras e impurezas, é aproveitada na fabricação de panos de chão e tapetes. Outro subproduto, o briquete, composto por casca moída e fibra bruta, é uma importante fonte nutricional para ruminantes.
Neste cenário, o conhecimento aprofundado sobre a fenologia do algodão é imprescindível na lavoura.
Cada estádio fenológico representa uma fase no desenvolvimento da planta e exige manejos específicos para garantir o potencial produtivo, diminuir perdas e facilitar o uso de insumos.
Vamos entender juntos? Boa leitura!
O que é Fenologia do Algodão?
A fenologia refere-se ao estudo dos estádios de desenvolvimento das plantas ao longo do seu ciclo de vida, baseando-se em características visuais e fisiológicas observáveis (Silva, 2023).
No caso do algodão, esses estádios são bem definidos e servem de base para o planejamento de práticas como o manejo nutricional, aplicação de reguladores de crescimento, monitoramento de pragas e doenças, e definição do momento ideal de colheita. O Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR) desenvolveu, em 2003, a chamada Escala Fenológica do Algodão, que organiza o ciclo da planta em quatro grandes estádios, com subdivisões

Estágios Fenológicos do Algodão
O ciclo do algodoeiro é dividido em quatro grandes fases fenológicas principais: Fase Vegetativa (I), Fase de Botão Floral (II), Fase de Florescimento (III) e Fase de Abertura de Capulhos (IV).
Cada uma dessas etapas representa um momento fisiológico distinto e exige atenção diferenciada quanto ao manejo da cultura.
Vamos entender como funciona o ciclo do algodão?
Fase Vegetativa (V)
Nesta etapa ocorre o desenvolvimento inicial da planta, desde a semeadura, passando pela emergência, até a formação das primeiras folhas e ramos.
O sucesso dessa fase depende de condições térmicas e hídricas adequadas, sendo ideal que o solo apresente temperaturas acima de 20°C e o ar entre 25°C e 30°C, favorecendo a emergência entre 5 e 10 dias após a semeadura.
O crescimento radicular ocorre de forma acelerada, com a raiz pivotante podendo atingir mais de 25 cm já na fase inicial.
O sistema radicular se desenvolve rapidamente, com crescimento diário entre 1,2 e 5 cm, alcançando cerca de 90 cm de profundidade quando a parte aérea atinge 35 cm de altura.

O bom estabelecimento do sistema radicular garante maior absorção de água e nutrientes, fundamentais para o crescimento do algodão.
Além disso, o algodoeiro apresenta duas ramificações principais: monopodiais (de sustentação) e simpodiais (reprodutivas), que começam a se desenvolver nesta fase, determinando a arquitetura da planta.
Nesta etapa ocorre o desenvolvimento das estruturas vegetativas, como raízes, folhas e caule. A planta estabelece sua arquitetura inicial, essencial para o suporte do ciclo reprodutivo.
As subdivisões são:
- V0: Emergência até que a nervura principal da primeira folha verdadeira atinja 2,5 cm.
- V1: Da primeira até a segunda folha verdadeira atingir 2,5 cm.
- V2: Da segunda até a terceira folha verdadeira atingir 2,5 cm.
- V3 – Vn: Segue o mesmo critério.
Fase de Botão Floral (B)
O aparecimento dos botões florais marca o início do estádio reprodutivo.
O crescimento vegetativo intenso ocorre até o surgimento do primeiro botão, quando as folhas se tornam responsáveis pela interceptação da luz e produção de fotoassimilados, sendo que a eficiência fotossintética do algodoeiro, por ser planta C3, é limitada, o que exige bom manejo da densidade de plantas e altura do dossel.
O balanço entre crescimento vegetativo e frutífero é determinante nesta fase.
Altas temperaturas noturnas acima de 25°C podem estimular o florescimento, mas se associadas a déficit hídrico, comprometem o desenvolvimento dos botões e favorecem a abscisão de estruturas reprodutivas, reduzindo o potencial produtivo
O aparecimento dos botões florais indica o começo do estádio reprodutivo, sendo um indicativo do potencial produtivo da lavoura.
As fases são:
- B1: Primeiro botão floral visível.
- B2: Primeiro botão floral no segundo ramo frutífero.
- B3: Primeiro botão floral no terceiro ramo frutífero.
- B4 – Bn: Segue o mesmo critério.
Fase de Florescimento (F)
O florescimento é diretamente influenciado pelas condições ambientais e pelo balanço de crescimento. O aparecimento dos botões florais e das primeiras flores ocorre com o desenvolvimento sucessivo dos ramos frutíferos.
Nesta fase, a planta atinge o pico de crescimento e interceptação de luz, sendo fundamental o manejo adequado de água e nutrientes.
O algodoeiro requer cerca de 4 mm de água por dia, podendo chegar a 8 mm, dependendo da área foliar.
A deficiência hídrica ou o excesso de umidade afetam o pegamento dos frutos e favorecem o aborto de flores e maçãs jovens.
Além disso, temperaturas acima de 30°C prejudicam a fotossíntese, elevam a fotorrespiração e reduzem a eficiência produtiva da planta.
Momento crítico do ciclo, em que ocorre a abertura das flores e o processo de polinização.
As etapas são:
- F1: Primeiro botão floral do primeiro ramo transforma-se em flor.
- F2: Primeiro botão floral do segundo ramo transforma-se em flor.
- F3 – Fn: Segue o mesmo critério.

Temperaturas superiores a 30°C e excesso de chuvas nesta fase reduzem o pegamento dos frutos e o rendimento da lavoura (Aparecido et al., 2021; Echer et al., 2024).
Estádio de Abertura dos Capulhos (C)
Na fase final, ocorre a maturação das maçãs e a abertura dos capulhos, expondo a fibra pronta para colheita.
A temperatura influencia diretamente o tempo de maturação, sendo ideal entre 21°C e 26°C, com maturação mais rápida em temperaturas mais altas, porém com frutos menores (Rosolem, 2001).
O uso correto de desfolhantes e maturadores contribui para uniformizar a colheita e preservar a qualidade da fibra, mas sua aplicação deve ocorrer quando 70% a 80% dos capulhos estiverem abertos, evitando perdas por abertura prematura ou deficiência no enchimento dos frutos (Azevedo et al., 2004).
Além disso, o manejo hídrico nesta etapa é fundamental. Irrigações finais bem planejadas aceleram a abertura dos capulhos sem comprometer a qualidade da fibra, enquanto o excesso de chuva ou deficiência hídrica severa prejudicam a produção e qualidade final.

Fase final do ciclo, quando os capulhos se abrem, expondo as fibras prontas para a colheita.
As etapas são:
- C1: Primeira maçã do primeiro ramo se abre, transformando-se em capulho.
- C2: Primeira maçã do segundo ramo se abre.
- C3 – Cn: Segue o mesmo critério.

Fatores Ambientais e Fenologia do Algodão
Temperatura
O algodoeiro apresenta melhor desempenho quando cultivado sob temperaturas médias entre 20°C e 30°C, intervalo ideal para o desenvolvimento vegetativo e reprodutivo da planta.
Temperaturas acima de 30°C, especialmente durante o florescimento e o pegamento dos frutos, reduzem a retenção dos capulhos e comprometem o rendimento final (Aparecido et al., 2021).
Por outro lado, temperaturas muito baixas, inferiores a 15°C, retardam o crescimento inicial e prejudicam a emergência das plântulas.
Água e Chuvas
A exigência hídrica do algodão varia entre 500 e 1500 mm de chuvas, desde que bem distribuídas ao longo do ciclo.
O período crítico ocorre no florescimento e formação dos frutos, quando o déficit hídrico pode causar abscisão floral e redução do número de capulhos por planta (Aparecido et al., 2021).
Excesso de chuvas nessa fase também é prejudicial, dificultando a polinização e favorecendo doenças.
Solo e Fertilidade
Solos profundos, bem estruturados e com alta fertilidade são ideais para o bom desenvolvimento fenológico do algodoeiro.
A presença de matéria orgânica, bons níveis de fósforo, cálcio e boro, aliados a uma estrutura física favorável ao crescimento radicular, garantem maior eficiência na absorção de água e nutrientes (Echer et al., 2024).
Solos compactados ou mal drenados limitam o sistema radicular e afetam negativamente o desenvolvimento da cultura.
Manejo Integrado Baseado na Fenologia
Nutrição e Adubação
O fornecimento adequado de nitrogênio, fósforo, potássio e micronutrientes deve acompanhar as exigências de cada fase fenológica.
No estádio vegetativo, o nitrogênio favorece o crescimento inicial e o estabelecimento da planta.
No florescimento e formação dos capulhos, o balanço entre fósforo e potássio contribui para o pegamento e o enchimento das fibras.
A deficiência de micronutrientes, como o boro, pode comprometer a integridade dos tecidos reprodutivos e reduzir a produtividade.
Reguladores de crescimento
O uso de mepiquat chloride, regulador de crescimento utilizado na cotonicultura, permite o controle do porte das plantas, reduz o acamamento e favorece a uniformidade no florescimento e na abertura dos capulhos (Echer et al., 2024).
O momento e a dose de aplicação devem ser definidos com base no monitoramento fenológico.
Fitossanidade
O monitoramento constante da fenologia orienta o momento ideal para o controle de pragas e doenças, garantindo maior eficiência dos defensivos e menor impacto ambiental.
Fases como a abertura dos botões florais e o início do florescimento são particularmente sensíveis ao ataque de pragas como o bicudo-do-algodoeiro (Anthonomus grandis) e doenças como a ramulose.
Colheita
A definição do momento ideal de colheita deve considerar o estádio de maturação dos capulhos.
A colheita antecipada reduz o rendimento e a qualidade da fibra, enquanto o atraso favorece perdas por abertura natural e degradação das fibras.
O uso de desfolhantes e maturadores, quando indicado, facilita a colheita e preserva a qualidade do produto.

Previsão de produtividade com base na fenologia e no clima
A utilização de algoritmos de machine learning para prever a produtividade do algodão tem se mostrado uma ferramenta prática para o produtor rural.
Segundo Aparecido et al. (2021), é possível estimar o rendimento da lavoura com até 80 dias de antecedência, utilizando dados climáticos e informações fenológicas da planta.

Fonte: Aparecido et al., (2021).
O estudo destaca o modelo Extra-Trees Regressor, que apresentou os melhores resultados, com baixo erro de previsão (MAPE de 18,35%). Isso permite ao produtor planejar com mais segurança o manejo da lavoura, como o momento da colheita, a logística de máquinas e decisões de venda da fibra.
Na prática, conhecer a produtividade potencial ainda no início do ciclo ajuda a minimizar riscos e otimizar o uso de insumos, principalmente em regiões de sequeiro, onde a variabilidade climática é grande.
Desta forma, integrar essas ferramentas ao monitoramento fenológico do algodão representa um avanço no planejamento e na gestão da propriedade, tornando as decisões mais assertivas e baseadas em dados reais (Aparecido et al., 2021).
Conclusão
O conhecimento e o monitoramento da fenologia do algodão são determinantes para maximizar a produtividade e a qualidade da fibra, especialmente em sistemas de sequeiro no Cerrado brasileiro.
A adoção de práticas agrícolas alinhadas às exigências de cada estádio de desenvolvimento permite o aproveitamento do potencial genético das cultivares e minimiza os riscos associados a fatores climáticos adversos.
O sucesso na cotonicultura passa, necessariamente, pela compreensão profunda da fenologia, associada ao manejo técnico e ao monitoramento constante do ambiente de produção.
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Referências
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APARECIDO, L. E. O. et al. Algorithms for forecasting cotton yield based on climatic parameters in Brazil. Archives of Agronomy and Soil Science, [S. l.], v. 68, n. 5, p. 636–652, 2021. DOI: 10.1080/03650340.2020.1864821.
AZEVEDO, D. M. P. de; BELTRÃO, N.E. de M.; SEVERINO, L.S. Uso de desfolhantes, maturadores e dessecantes na cultura do algodoeiro irrigado. Circular técnica 78. Campina Grande: EMBRAPA Algodão, 2004. 7p.
ECHER, F.R.; GALDI, L.V.; SILVA, G.R.A.; SANTOS, J.W.S.; ROCHA, C.H.; CAGNA, C.P.; TORMENA, C.A.; SILVA, I.F.; ATARASSI, R. Components of High-Yielding Cotton Grown in Rain-Fed Conditions in the Brazilian Cerrado. Agronomy 2024, 14, 2920. DOI: 10.3390/agronomy14122920
FENG, A.; ZHOU, J.; VORIES, E.; SUDDUTH, K.A. Evaluation of cotton emergence using UAV-based imagery and deep learning.
Computers and Electronics in Agriculture. V. 177, 105711, 2020. DOI: 10.1016/j.compag.2020.105711.
HUSSAIN, N.; YASMEEN, A.; AFZAL, M. Exogenously applied growth promoters modulate the antioxidant enzyme system to improve the cotton productivity under water stress conditions. Italian Journal of Agronomy. V. 15. 2020. DOI: 10.4081/ija.2020.1537.
Sobre o autor:

Alasse Oliveira da Silva
Doutorando em Produção Vegetal (ESALQ/USP)
- Engenheiro agrônomo (UFRA) e Técnico em agronegócio
- Mestre e especialista em Produção Vegetal (ESALQ/USP)
Como citar este artigo:
SILVA, A.O. Fenologia do algodão: estádios, manejo e impacto climático no desenvolvimento da cultura. Blog Agroadvance. Disponível em: https://agroadvance.com.br/blog-fenologia-do-algodao/. Acesso: xx Xxx 20xx.