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Fungicidas agrícolas: 8 critérios para classificação

Os fungicidas são importantes para o controle dos fungos, que representam cerca de 65% das doenças que acometem as culturas agrícolas.  Conhecer suas classificações é importante para programar sua utilização da melhor maneira possível, evitando, por exemplo o surgimento de resistência a inseticidas.

Cresce o uso de fungicidas protetores no controle da ferrugem | Revista  Campo & Negócios

 

Porque os fungicidas agrícolas são utilizados?

A maior parte das doenças de plantas (>65%) são causadas por fungos. Para conter o desenvolvimento de fungos patogênicos nas lavouras, aumentar o período de armazenagem e a qualidade do produto e das plantas colhidas são utilizados produtos específicos: os fungicidas 

Por definição, fungicidas são substâncias químicas / sintéticas, agentes biológicos e substâncias naturais que protegem as plantas cultivadas de doenças causadas por fungos, matando, dificultando a infecção ou inibindo seu desenvolvimento, reduzindo os danos e as perdas causadas. 

Estima-se que se os fungicidas não fossem utilizados no mundo inteiro, haveria uma redução de 7,3% da produtividade das culturas (MENTEN & BANZATO; 2016). Para o Brasil, que possui clima tropical com altas temperaturas e precipitações o problema certamente seria maior.  

O controle químico dos fungos é, portanto, uma medida eficiente e economicamente viável para garantir altas produtividades e a qualidade da produção agrícola 

  

Quantos fungicidas existem hoje no mercado? 

Uma grande variedade de fungicidas estão disponíveis no mercado, com diferentes ingredientes ativos e finalidades de uso. De acordo com dados do AGROFIT, existiam no mercado brasileiro em 2021 o registro de: 

  • 88 ingredientes ativos de fungicidas químicos (e um total de 639 produtos formulados);  
  • 9 fungicidas biológicos (e um total de 60 produtos formulados),  
  • 1 ativador de resistência (e 1 produto formulado). 

Os fungicidas agrícolas podem ser classificados de acordo com vários critérios, como: mecanismo de ação, princípio de controle, espectro de ação, entre outros. Vamos conhecer abaixo, 8 critérios nos quais podemos classificar os fungicidas. 

  

Quais os critérios podem ser utilizados para classificar os fungicidas agrícolas? 

  

Podemos utilizar pelo menos 8 critérios distintos para classificar os fungicidas agrícolas, a saber: 

 

Grupos químicos 

Com relação ao grupo químico a que pertencem, os fungicidas podem ser classificados em inorgânicos ou orgânicos. Quimicamente, moléculas orgânicas são aquelas que possuem átomos de carbono em sua estrutura, enquanto moléculas inorgânicas não os possuem.   

Inorgânicos 

Grande parte dos primeiros fungicidas desenvolvidos foram baseados em componentes inorgânicos como enxofre e íons metálicos, tais como o cobre, estanho, cádmio e mercúrio, os quais são tóxicos aos fungos.  

Os fungicidas inorgânicos mais utilizados são o enxofre e fungicidas cúpricos (hidróxido de cobre, sulfato de cobre, óxido cuproso, entre outros).  

 

Orgânicos 

Os fungicidas orgânicos são classificados por grupos químicos e cada grupo pode conter um ou vários ingredientes ativos. Existem cerca de 50 grupos químicos.  

Na tabela 1 são listados os principais grupos químicos, com seus ingredientes ativos.  

Tabela 1. Alguns dos principais grupos químicos e ingrediente ativo dos fungicidas orgânicos 

grupos químicos e ingrediente ativo dos fungicidas orgânicos 

 Acesse aqui (Adobe Acrobat PDF)  uma lista dos fungicidas e suas características que são representativas dos principais grupos químicos registrados nos Estados Unidos.

 

Princípio geral de controle   

Essa classificação se baseia no modo como o fungicida atua na planta e controla o fungo (Figura 1).  

Ação dos fungicidas preventivos, curativos e erradicantes nas diversas fases do ciclo de relação patógeno/hospedeiro

 
Figura 1. Ação dos fungicidas preventivos, curativos e erradicantes nas diversas fases do ciclo de relação patógeno/hospedeiro. Fonte: Menten & Banzato (2016).

Protetores 

São aqueles que inibem a germinação de esporos: forma barreira química que impede a penetração do fungo na planta.   

Após ser aplicado, forma uma barreira protetora antes que o fungo se instale ou se desenvolva no vegetal. Por esse motivo, costumam ser muito utilizados para proteger folhagens e sementes.  

À medida que o vegetal cresce, novas partes da planta ficam desprotegidas. Como resultado, geralmente esses fungicidas precisam de mais aplicações.  

Principais grupos: 

  • Enxofre 
  • Cúprico 
  • Ditiocarbamato 
  • Iso(ftalonitrila) 
  • Cloroaromático 
  • Dicarboximida 
  • Organoestâmico 
  • Guanidina 
  • Fenilpiridinilamina 
  • Fenilpirrol 

 

Curativos 

São aqueles que possuem a capacidade de penetrar na planta e impedir a penetração do fungo no tecido vegetal.

Nesse caso ocorre atenuação dos sintomas ou reparação dos danos provocados pelo patógeno, sendo uma ação dirigida contra o patógeno, após o estabelecimento de deu contato efetivo com o hospedeiro. 

Normalmente, esses defensivos costumam funcionar melhor no período entre 24 e 72 horas após a infecção do fungo na planta — ou seja, logo no início ou depois da identificação dos primeiros sintomas, quando estes ainda não estão visíveis.

Principais Grupos: 

  • Trazóis 
  • Carboxamidas 
  • Benzimidazóis 
  • Estrobirulinas 

 

Erradicantes

São aqueles que atuam diretamente sobre o patógeno, na sua fonte de inóculo. Atuam reduzindo a esporulação.    

Geralmente, recomenda-se aplicação desses produtos após a planta desenvolver os sintomas da doença. Também é possível utilizá-los de outras formas, como no tratamento de sementes, do solo, ou no inverno, momento em que as plantas de clima temperado entram em repouso vegetativo.  

Principais grupos:  

  • Alifático alogenado 
  • Isotiocianato de metila 
  • Calda bordalesa 
  • Calda sulfocálcica 

  

Mobilidade ou Contato na Planta  

Os fungicidas podem ser classificados quanto à mobilidade ou à capacidade de se translocar na planta em: imóvel ou de contato, sistêmico ou móvel e mesostêmico ou translaminar 

 

Imóvel 

Também chamados de tópico, residual ou não sistêmico. O fungicida não penetra a planta. Ficam externos ao tecido vegetal formando uma barreira química.

Principais grupos: 

  • Inorgânicos: enxofre e cúpricos 
  • Orgânicos: ditiocarbamato, (Iso)ftalonitrila, Cloroaromático, Organoestânico e Fenilpirrol 

  

Sistêmico ou móveis 

Ocorre translocação dos fungicidas via sistema vascular da planta. 

 Principais grupos:

  • Bendimidazol
  • Carboxamida
  • Fosfototioato de arila
  • Acilalaninato = fenilamida
  • Acetamida
  • Morfilina
  • Piridilamina
  • Pirimidina
  • Imidazol
  •  Triazol
  • Estrobirulina

Existem diferentes graus de mobilidade/sistemicidade dentro dos fungicidas sistêmicos para triazóis e estrobilurinas (Figura 2). Essa mobilidade é dada praticamente pelo POW do fungicida. 

Mobilidade e sistemicidade de fungicidas do grupo químico dos triazóis.

Figura 2. Mobilidade e sistemicidade de fungicidas do grupo químico dos triazóis. Fonte: Menten & Banzato (2016).   

  

Mesostêmico 

Também chamados de translaminar ou penetrante. Apesar de não atingir o sistema vascular da planta, o fungicida atravessa ou move-se no limbo foliar da planta.

Principais grupos:

  • Piraclostrobina
  • Trifloxistrobina
  • Mandelamida. 

 

Mecanismo de ação

Os fungicidas matam os fungos por causarem danos nas suas membranas celulares, pela inativação de enzimas ou proteínas essenciais, ou por interferirem em processos chave como produção de energia ou respiração. Outros têm impacto específico em vias do metabolismo, como produção de esterol ou quitina (McGRATH, 2004). 

Alguns produtos desenvolvidos recentemente são peculiares no fato de que eles não afetam diretamente o patógeno. Muitos destes induzem uma resposta da planta (hospedeiro) conhecida como resistência sistêmica adquirida (SAR, sigla em inglês de Systemic Acquired Resistance). 

 O conhecimento exato de como um fungicida afeta um fungo auxília na seleção dos produtos. 

O modo de ação determina quais fungos serão afetados pelo fungicida e, portanto, quais doenças podem ser controlados pelo uso de tal fungicida.  

Fungicidas com modo de ação diferentes são necessários no controle da doença para retardar o desenvolvimento de resistência.  

 

O FRAC (Fungicide Resistance Action Committee ), Comitê de Ação a Resistência a Fungicidas, classifica os fungicidas em mais de 50 grupos, utilizando diferentes letras (de A a P, com números adicionados) para distinguir grupos de fungicidas de acordo com seu modo de ação bioquímico (MOA) nas vias biossintéticas de patógenos de plantas.  

Todos os fungicidas pertencentes a um mesmo grupo químico têm em comum o modo de ação e o mecanismo de resistência, embora sua estrutura química possa ser diferente. Duas exceções no esquema classificatório do FRAC/EPA é a classe de fungicidas múltiplo-sítios classificados como classe de fungicidas com modo de ação “desconhecido” (unknown). 

A seguir estão listados os grupos existentes e o seu modo de ação, de acordo com a classificação da FRAC: 

A. Síntese de ácido nucléico

B. Mitose e divisão celular

C. Respiração

D. Síntese de aminoácidos e proteínas

E. Transdução de sinal

F. Síntese lipidio e entegridade da membrana

G. Biossíntese de esterol nas membranas

H. Biossíntese de parede celular

I. Síntese de membrana na parede celular

M. Ação multi-sítio

P. Indução de defesa da planta hospedeira

NC Não classificados 

Mecanismo de ação desconhecido 

 Cada grupo é classificado em diversos sub-grupos de acordo com o modo de ação na planta e recebe um código FRAC que é utilizado, por exemplo para se manejar a resistência de fungicidas (Figura 3). 

Dentro do grupo G, por exemplo, que atua na biossíntese de esterol nas membranas, temos 4 sub-grupos: 

  • G1: atuam na desmetilase. Ex: triazol, imidazol, protoconazol, entre outros 
  • G2: atuam na redutase / isomerase. Ex: morfilina, piperidina, espiroquetalamina; 
  • G3: atuam na keto redutase. Ex: hidroxianilida, amino-pirazolinona 
  • G4: atuam na escaleno redutase. Ex: alilaminas, tiocarbamato. 
FRAC classificação de fungicidas mecanismo de ação

Figura 3. Classificação FRAC dos Fungicidas. Fonte: FRAC. 

 

Uma lista dos fungicidas organizados por grupo químico é mantida pelo FRAC [Fungicide Resistance Action Committee – (FRAC)].  

Toxicologia

Os fungicidas são classificados em seis classes toxicológicas, de acordo com a ANVISA, com relação à periculosidade ao homem, representadas por cores (Figura 4). 

classe toxicológica fungicidas

Figura 4. Classe toxicológicas dos fungicidas agrícolas. 

 

Potencial de periculosidade ambiental 

Os fungicidas podem ser classificados pelo IBAMA em 4 classes de acordo com o potencial de periculosidade ambiental: 

  • Classe I – Altamente Perigoso ao meio ambiente 
  • Classe II – Muito Perigoso ao meio ambiente 
  • Classe III – Perigoso ao meio ambiente 
  • Classe IV – Pouco Perigoso ao meio ambiente 

 

 

Formulações

A maneira que as formulações são encontradas no mercado também é uma maneira de se classificar os fungicidas. 

Os ingredientes ativos nunca são aplicados puros. Na verdade, o ingrediente ativo está no produto técnico juntamente com impurezas que são produzidas no processo de fabricação e inertes (solventes ou aditivos adicionados para aprimorar a ação do ingrediente ativo). 

 

7 Principais tipos de formulações disponíveis no mercado: 

  • Concentrado Emulsionável (C.E.). ex: Procloraz 45% CE
  • Pó molhável (P.M.). ex: mancozebe 80% PM
  • Suspensão concentrada: Pós molhável + agua + aditivos. Ex: Derosal 500 SC (Carbendazin)
  • Grânulos dispersíveis em água (G.D./W.G.). Ex: Amistar WG (Azoxistrobina 50%).
  • Concentrado Solúvel (C.S./S.L.): Solução verdadeira do ingrediente ativo. Ex: Alto 100 (Ciproconazol 10%).
  • Suspo – Emulsão (S.E.). Ex: Opera (Piraclostrobina 13% + Epoxiconazol 5%).
  • Pó (P). Utilizado raramente para tratamento de sementes. Ex: Captan 750 TS (Captana 75%)

 

Espectro de ação

Os fungicidas podem ser classificados em relação ao seu espectro de ação como de: amplo espectro ou multissítio ou espectro restrito ou sítio-específico. 

Os fungicidas podem ser classificados como multissítios (quando atuam em vários sítios) ou sítio-específicos (quando age especificamente em um ou poucos processos). 

 

Multissítio 

Os Multissítios afetam diferentes pontos metabólicos do fungo. Como consequência são produtos que possuem baixo risco de desenvolver resistência (Figura 5).  

Tipicamente, fungicidas de contato mais antigos tem ação múltiplo-sítio e, portanto, normalmente, afetam muitos fungos em diferentes classes 

Ex: Mancobez, Clorotalonil, cúpricos, enxofre (Fungicidas Protetores e Imóveis). 

Locais de ação dos fungicidas multissítios na célula fúngica.

Figura 5. Locais de ação dos fungicidas multissítios na célula fúngica. Fonte: Balardin et al. (2017). 

 

Sítio-específico 

Os fungicidas Sítio-específicos são ativos contra um único ponto da via metabólica de um patógeno ou contra uma única enzima ou proteína necessária para o fungo.  

Como resultado desta ação específica, os fungos são mais propensos a se tornarem resistentes a tais fungicidas porque uma única mutação no patógeno normalmente permite superar a ação do fungicida, como por exemplo, pela incapacidade do fungicida em se ligar ao ponto de ação nos fungos (Figura 6). 

Ex: triazóis, estrobirulinas, carbaxamidas. (Fungicidas imunizantes e sistêmicos) 

 

Local de ação dos fungicidas Inibidores da DesMetilação (IDM).

Figura 6. Local de ação dos fungicidas Inibidores da DesMetilação (IDM). Fonte: Balardin et al. (2017). 

Veja abaixo a explicação do Professor Marcelo Grippa Madalosso sobre a diferença de fungicidas de sítio específico e multissítio.

 Referências

McGrath, M.T. 2004. What are Fungicides. The Plant Health Instructor. DOI: 10.1094/PHI-I-2004-0825-01 

Menten & Banzato (2016). Fungicidas. Disponível em: www.leb.esalq.usp.br/leb/disciplinas/Casimiro/LFN/fungicidas%20AULA%20ESALQ%20ago2016.pdf  Acesso: 08/08/2022. 

 BALARDIN, R.S.; MADALOSSO, M.G.; STEFANELLO, M.T.; MARQUES, L.N.; DEBORTOLI, M.P. Mancobeb: muito além de um fungicida. Editora Bookman. 2017. 147 p.   

Sobre a autora:

Beatriz Nastaro Boschiero

Beatriz Nastaro Boschiero

Especialista em MKT de Conteúdo na Agroadvance

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