Descubra a importância do pH da calda na aplicação de herbicidas. Saiba como o pH influencia a estabilidade e absorção dos herbicidas, e como a escolha errada pode resultar em perdas significativas no controle de plantas daninhas. Leia agora e aprimore suas práticas de aplicação de herbicidas.
1. O que é o pH?
O potencial hidrogeniônico, ou pH, é a concentração relativa de íons de hidrogênio (H+) presente na água. No cenário de tecnologia de aplicação, refere-se ao pH da calda em função aos íons de hidrogênio presentes na solução que será utilizada para misturar os defensivos agrícolas. A escala do pH varia de 0 a 14 (Figura 01).
Quanto maior a acidez, ou seja, maior concentração de íons de hidrogênio, menor será o valor de pH (pH=0 será o mais ácido possível) e quanto maior a alcalinidade, maior este valor (pH=14 será o mais alcalino possível). O valor de pH=7 represente uma solução/calda neutra (PEREIRA et al., 2015).
2. Relação do pH e importância na tecnologia de aplicação de herbicidas
De modo geral, os defensivos agrícolas têm um pH ideal para aplicação, garantindo alta eficiência e baixas perdas. Abordaremos nesse artigo os efeitos do pH da calda nos herbicidas.
Dependendo do pH da calda, pode haver um efeito negativo na estabilidade do ativo e até mesmo efeitos na estabilidade física da calda, especialmente nas variações extremas de pH (PEREIRA et al., 2015).
Portanto, o pH pode afetar desde a eficiência do herbicida, em que pode haver perdas significativas no manejo das plantas daninhas, ou mesmo impossibilitar certas misturas de produtos (WHITFORD et al., 2009).
Os herbicidas podem ser divididos em dois grupos referentes a constante de ionização: i) não-iônicos e ii) iônicos.
A constante de ionização é a constante de equilíbrio obtida a partir de uma dissociação ou ionização. Os não-iônicos apresentam características físico-químicas independentes do pH do meio, enquanto os iônicos apresentam grau de ionização em função do pH, podendo ser classificados como aniônico ou catiônico.
A ionização destes herbicidas é mensurada pelo pKa e pKb, representando o pH e pOH, respectivamente, em que metade das moléculas do herbicida encontram-se dissociadas. Com isso, quanto menor o pKa, maior a acidez do herbicida e, quanto menor o pKb, maior a alcalinidade do herbicida (CARVALHO et al., 2009).
3. Efeitos do pH da calda na aplicação dos herbicidas.
Geralmente, herbicidas atuam melhor em pH levemente ácidos, em torno de pH 4 a 6, podendo em algumas exceções atuar melhor em levemente alcalinos (Tabela 01).
O glifosato por exemplo, age preferencialmente entre pH 3,5 a 5,0, sendo um ácido fraco (CHRISTOFOLETTI, 2021). Nesse pH de calda os íons encontram-se dissociados, favorecendo a absorção foliar do glifosato devido a maior facilidade de atravessar membranas das células (VELINI; TRINDADE, 1992), aumentando a eficácia do produto (SANCHOTENE et al., 2007).
A eficácia do glifosato é afetada tanto pelo pH do meio quanto pela presença de cátions na água de pulverização (CARVALHO et al., 2009).
O pH da calda pode influenciar o tempo em que o ingrediente ativo vai se manter intacto (WHITFORD et al., 2009). A faixa acima ou abaixo do ideal pode iniciar a degradação da molécula, ou hidrólise.
Por exemplo, quando um herbicida ácido fraco é misturado em calda com pH ácido, tende a permanecer intacto, entretanto se for misturado em calda com pH alcalino, vai resultar, em alguns casos, em quebra das moléculas. Entretanto, muitos herbicidas apresentam efeito tampão nas formulações.
O efeito tampão faz com que a solução, independente do pH da pré-existente da calda, se ajuste ao pH próximo ao ideal de cada formulação.
Esse fato é facilmente visto nas formulações de glifosato. As formulações de Roundup, pelo efeito tampão da formulação, levam o pH da calda em torno de 4-5. Já outras formulações, podem resultar em pH menores que 4.
Esse é um fato que o produtor deve se atentar, especialmente em misturas com fungicidas e inseticidas, podendo ocasionar efeitos negativos na eficácia dos outros defensivos. Alterações indesejadas podem ocorrer não só entre diferentes defensivos (como fungicidas e inseticidas), mas também entre os próprios herbicidas.
Misturas do pH de calda
Recentemente, uma notícia chamou atenção sobre o efeito da mistura de glifosato e dicamba. Com o intuito de analisar a volatilidade do herbicida dicamba sob diferentes temperaturas e em misturas, os autores Mueller e Steckel (2019) notaram que com a adição do glifosato à solução de dicamba, houve um aumento de três vezes na volatilidade do dicamba.
O experimento foi avaliado em umidômios que possibilitam a captação e posterior quantificação do ativo volatilizado. O aumento na volatilidade ocorreu devido a diminuição no pH da calda com a adição do glifosato, aumentado a concentração de dicamba no ar de 2.9 para 9.3.
Dado esse efeito das misturas no pH da calda, Bem Júnior et al. (2017) avaliaram a influência do glifosato na redução do pH de diferentes herbicidas. Os autores observaram que os herbicidas atrazina, clomazone e paraquate foram os que sofreram maiores reduções de pH. No entanto, todos os herbicidas testados apresentaram reduções no pH (haloxifop, clethodim, 2,4-D e nicossulfuron).
Efeito dos adjuvantes no pH da calda
Em algumas situações, o pH da calda, em níveis fora do ideal, podem resultar em incompatibilidade nas misturas de tanque. Estudando o efeito do pH nas misturas de herbicidas e inseticidas, Petter et al. (2012) observaram que as misturas com as formulações de glifosato WG e lactofen CE geraram as maiores incompatibilidades físicas, especialmente em mistura com clorpirifós CE. Segundo os autores, uma alternativa é o uso de redutores de pH, como os ácidos pirolenhoso e bórico, auxiliando na maior compatibilidade de mistura.
Outra solução é a adição de adjuvantes a calda. Alguns adjuvantes podem alterar as propriedades físico-químicas das caldas de produtos fitossanitários, auxiliando na qualidade de aplicação (CUNHA et al., 2017).
Avaliando a interação entre alguns adjuvantes e herbicidas, Cunha et al. (2017) destacaram o óleo mineral com os maiores valores pH (Tabela 02). No entanto, para o glifosato, o adjuvante a base de fosfatidilcolonine + ácido propiônico foi o único que resultou em diminuição significativa de pH (3,92).
Ademais, os autores destacaram o herbicida tembotrione com o menor pH em solução aquosa sem adição de adjuvante. Por fim, eles ressaltam a importância do pH para garantir menor hidrólise dos produtos quando estão em soluções ácidas e consequentemente apresentar maior eficiência dos produtos.
Conclusão
A qualidade da água é um fator importante na aplicação dos defensivos agrícolas. Nesse contexto, o pH pode exercer um fator importante na eficácia e durabilidade dos ingredientes ativos, especialmente na degradação e quebra dos mesmos.
Para os herbicidas, o uso de caldas de pulverização com pH fora do ideal pode resultar em redução da eficácia e ocasionar incompatibilidade de misturas. O uso de formulações diferentes de produtos é um fator que deve ser considerado e analisado para cada resposta. Além disso, o produtor deve sempre se atentar as recomendações dos fabricantes.
Referências
CARVALHO, S. J. P. et al. Eficácia e pH de caldas de glifosato após a adição de fertilizantes nitrogenados e utilização de pulverizador pressurizado por CO2. Pesquisa Agropecuária Brasileira, 44, no.6: 569-575, 2009.
CHRISTOFOLLETI, P. Material de aula (AgroAdvance). 2021.
MUELLER T.C., STECKEL, L.E. Dicamba volatility in humidomes as affected by temperature and herbicide treatment. Weed Technology. Aug;33(4):541-6, 2019.
PEREIRA, R. B. et al. Tecnologia de aplicação de agrotóxicos em cultivo protegido de tomate e pimentão. Embrapa Hortaliças-Circular Técnica (INFOTECA-E), Brasilia-DF, 2015.
PETTER, F. A. et al. “Incompatibilidade física de misturas entre herbicidas e inseticidas.” Planta Daninha, 30, no. 2:449-457, 2012.
REVISTA CAMPOS & NEGÓCIOS. pH ideal de calda para produtos fitossanitários, Hortifrúti, 2016. Acesso em: https://revistacampoenegocios.com.br/ph-ideal-de-calda-para-produtos-fitossanitarios.
SANCHOTENE, D. M.; DORNELLESS. H. B.; DEBORTOLI, M. P.; CAPITANIO, JR.; MEZZOMO, R. F.; GONÇALVES, R. A. Influência de sais e do pH da água na eficiência de imazethapyr + imazapic no controle de arroz-vermelho. Planta Daninha, v.25, p.415-419, 2007.
VELINI, E. D.; TRINDADE, M. L. B. Comportamento de herbicidas na planta. Épocas de aplicação de herbicidas. In: Simpósio nacional sobre manejo integrado de plantas daninhas em hortaliças, 1992, Botucatu, SP. Anais… Botucatu: UNESP,1992, p. 6586. VIDAL, R. A.; MEROTTO Jr. A. Herbicidologia. Porto Alegre: Edição dos Autores, 2001.
WHITFORD, FRED et al. “Impact of water quality on pesticide performance”. Purdue Extension, PPP-86, Purdue University (2009).
Esse texto é opinião do autor e não reflete, necessariamente, a posição da Agroadvance.
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Respostas de 2
CONTEUDO DE PRIMEIRISSIMA QUALIDADE
Belo material; simples e objetivo, coisa rara nos dias de hoje. Parabéns.