Os nematoides parasitas, também chamados fitonematoides, são vermes que possuem o corpo em formato cilindrico, geralmente alongado e com as extremidades afiladas e estão presentes naturalmente no solo, compondo uma fração dos microrganismos da rizosfera.
Em algumas situações, as fêmeas assumem formas aberrantes de rim, maçã ou outras que fogem da aparência corriqueira dos vermes. O tamanho dos nematoides é bastante variável, mas dificilmente são visíveis a olho nú, necessitando de microscópio para visualização.
Os nematóides presentes no solo podem apresentar vida livre ou ser parasitas de plantas.
Os nematoides de vida livre se alimentam de fungos, bactérias e matéria orgânica em decomposição, sendo de grande importância na ciclagem de nutrientes e equilíbrio da biodiversidade do solo.
Por outro lado, a alimentação dos nematoides parasitas de plantas, ou fitonematoides, ocorre da seiva das plantas. Eles costumam se hospedar e atacar diversos tipos de plantas, causando uma série de danos que impactam diretamente na produtividade das culturas.
Os sintomas em plantas atacadas aparecem normalmente em reboleiras, o que indica que os nematoides muitas vezes não têm distribuição uniforme no solo.
Classificação dos nematoides quanto à mobilidade
De acordo com Ferraz e Brown (2016), os fitonematóides podem ser agrupados pelo seu parasitismo e mobilidade em três grupos principais, sendo os dois primeiros os mais importantes:
- Nematoide endoparasita migrador – nematoides móveis que se alimentam no interior dos tecidos radiculares. Exemplo: Pratylenchus brachyurus.
- Nematoides endoparasitas sedentários – nematoides que, quando encontram um local de alimentação no interior da planta, ficam imóveis e fixam-se num local para se alimentarem. Ex: gêneros Meloidogyne spp. e Heterodera spp.;
- Nematoides ectoparasitas – nematoides que se alimentam no exterior da planta. Ex: Helicotylenchus sp.
Importância econômica dos nematoides no Brasil
Embora faltem dados precisos sobre danos às culturas, estima-se que a perda anual global causada por nematoides já exceda a 80 bilhões de dólares, o que, segundo alguns especialistas, ainda representa montante abaixo do verdadeiro (FERRAZ; BROWN, 2016).
No Brasil, os danos provocados por fitonematoides podem chegar a R$ 35 bilhões por ano e, somente na soja, estima-se que os prejuízos alcancem R$ 16,2 bilhões (MACHADO, 2015).
Quais espécies de fitonematoides são mais comuns no Brasil?
De acordo com Machado et al. (2022), cada cultura é atacada predominantemente por determinada espécie de nematóide:
Para culturas como soja, algodão e milho, as principais espécies de nematoides são:
- Nematoides das galhas: Meloidogyne incognita e M. javanica (este segundo não parasita o algodão),
- Nematóide das lesões radiculares (Pratylenchus brachyurus),
- Nematóide do cisto da soja (Heterodera glycines – parasita apenas a soja)
- Nematoide reniforme (Rotylenchulus reniformis).
Nas lavouras de café, as principais espécies são
- Nematóides das galhas: M. exigua, M. incognita e M. paranaensis
Para a cana-de-açúcar os maiores prejuízos são causados pelo:
- Nematóide das galhas: M. Incognita e M. javanica,
- Nematóides das lesões radiculares: P. brachyurus, e P. zeae
Para goiaba, acerola e hortaliças a maior preocupação é o Meloidogyne enterolobii.
Vejamos abaixo as características de cada um desses gêneros.
Características dos 4 principais nematoides fitopatogênicos e sintomas em plantas atacadas
Nematóide das galhas radiculares – Meloidogyne spp.
Os nematoides-das-galhas estão entre os mais importantes parasitas das culturas agrícolas. Existem mais de 80 espécies de nematoides do gênero Meloidogyne reconhecidas em todo o mundo, com destaque para as espécies:
- Meloidogyne javanica
- Meloidogyne incognita
- Meloidogyne exigua
- Meloidogyne paranaensis
- Meloidogyne enterolobii
Conhecido como nematóide das galhas, estes parasitas geralmente apresentam como sintoma típico a formação de galhas nas raízes das plantas, devido ao crescimento e multiplicação desordenada das células radiculares e ao crescimento do corpo das fêmeas como resposta à infecção (Figura 1).
Os danos nas plantas são causados apenas pelas fêmeas da espécie que penetram nas raízes, sofrem ecdises e permanecem sedentárias, alimentando-se em um sítio permanente, até tornarem-se obesas e produzir os ovos, que são depositados numa matriz gelatinosa, formando a massa de ovos (Figura 2).
A presença de machos na população é rara e, quando ocorre, estes não se alimentam de plantas.
Ciclo de vida
Resumidamente, o ciclo de vida do Meloidogyne spp. é constituído pela fase de ovo, 4 estágios juvenis (J1, J2, J3 3 J4) e adultos.
Os ovos são depositados pelas fêmeas externamente às raízes envoltos por uma massa gelatinosa.
O 1º estádio da fase juvenil (J1) ocorre ainda dentro do ovo e após uma ecdise com troca de cutícula evolui para J2, fase em que o nematóide promove a infecção às raízes.
O J2 penetra no tecido do hospedeiro e estabelece o sítio de alimentação, se tornando sedentário. Para favorecer a sua nutrição, secreções produzidas pelo nematoide estimulam a formação de várias células gigantes nas raízes parasitadas, formando assim as galhas.
Esses nematoides aumentam rapidamente de tamanho e passam por mais duas fases juvenis (J3 e J4) até se tornarem adultos.
Para completar o ciclo de vida, o Meloidogyne necessita entre 25 e 30 dias, com variação de acordo com a espécie, temperatura e umidade. Cada nematoide pode gerar até 600 ovos, que darão início a um novo ciclo.
Sintomas nas plantas
Os sintomas visuais em plantas atacadas, além das raízes com a presença de galhas, são plantas subdesenvolvidas e com característica de deficiência nutricional, sendo ainda comum a presença de folhas carijó (Figura 4).
No campo, os sintomas ocorrem em reboleiras, visto que o nematoide apresenta movimentação limitada no solo, sendo disseminado, principalmente, por práticas agrícolas resultantes do revolvimento do solo (FAVORETO et al., 2019).
As espécies de Meloidogyne são polífagas e possuem mais de 1.000 espécies de plantas hospedeiras conhecidas, o que dificulta seu controle. Além disso, temperaturas médias de 28 °C, solos mais arenosos e a ausência de rotação de cultura favorecem o ataque dos nematoides das galhas (OLIVEIRA et al., 2018).
Apesar de as galhas constituírem sintomas típicos e fáceis de ser diagnosticados a olho nu, é importante lembrar que, comumente, os nematoides ocorrem em populações mistas no solo. A presença de nematoides-das-galhas pode mascarar a percepção de outras espécies presentes na área (FAVORETO et al., 2019).
Nematoide das lesões radiculares – Pratylenchus spp.
Os nematoides-das-lesões-radiculares (Pratylenchus spp.) são assim denominados devido aos sintomas causados nas raízes das plantas hospedeiras, as quais servem de porta de entrada para bactérias e fungos, resultando em necroses e podridões (Figura 5).
Ocupam o segundo lugar em relação aos impactos econômicos, no Brasil e no mundo, superados apenas pelos nematoides-das- -galhas. Cerca de 70 espécies do gênero são conhecidas, sendo as espécies de maior relevância no país:
- Pratylenchus brachyurus
- Pratylenchus zeae
- Pratylenchus penetrans
Ciclo de vida
Assim como os outros fitonematoides, Pratylenchus possui seis estádios: ovo quatro estádios juvenis e adulto (Figura 6).
Todas as fases juvenis e adulto de Pratylenchus são vermiformes e móveis, podendo infectar a raiz de uma planta hospedeira – exceto J1 (Figura 7). As fêmeas da espécie depositam, em média, 80 ovos.
Os machos adultos são comuns em algumas espécies e raros em outras, sendo essa uma das ferramentas que auxiliam na diagnose da espécie.
Sintomas nas Plantas
Os principais sintomas observados a campo, que também ocorrem em reboleiras, são redução drástica no porte da planta, diminuição do número de radicelas e presença de raízes necrosadas e escurecidas, ou ausentes (Figura 8).
Esses sintomas são consequências dos danos mecânicos causado às raízes durante a alimentação e movimentação no interior dos tecidos pelo nematóide das lesões, que modificam e destroem os tecidos vegetais, comprometendo a absorção e o transporte de água e nutrientes, prejudicando o desenvolvimento da planta, bem como facilitando a infecção por patógenos secundários, como fungos e bactérias (FAVORETO et al., 2019).
Solos arenosos ou médio-arenosos, temperatura em torno de 30 °C e umidade do solo entre 70% e 80% da capacidade de campo também favorecem o desenvolvimento de P. brachyurus (FAVORETO et al., 2019).
Nematóide do cisto da soja – Heterodera glycines
O gênero Heterodera se caracteriza pela formação de cistos (que é o corpo da fêmea adulta morta) de cor marrom, altamente resistentes às condições adversas do ambiente.
Os ovos protegidos pelo cisto podem sobreviver no solo, na ausência de planta hospedeira, por oito ou mais anos. O cisto constitui a mais eficiente unidade de dispersão do nematóide, permitindo que seja facilmente levado de uma área para outra, a curtas ou longas distâncias, por qualquer meio que promova movimento de solo.
Dentre os hospedeiros, os de maior destaque, além da soja, são o feijão, a ervilha e o tremoço.
Ciclo de vida
O ciclo de vida do Heterodera glycynes é varia de 21 a 24 dias. O desenvolvimento inclui 4 ecdises, sendo que o segundo estágio Juvenil (J2) é a fase infectante.
As larvas das fêmeas gradativamente adquirem o formato de limão, rompendo o córtex radicular, emergindo à superfície, permanecendo apenas a região anterior embutida nos tecidos, com o restante do corpo à mostra, fora da raiz (Figura 9).
Os machos abandonam as raízes após atingirem o estádio adulto.
As fêmeas fertilizadas produzem e armazenam os ovos no interior de seu corpo e, após a sua morte, sua cutícula altera-se quimicamente, adquirindo coloração marrom e transformando-se em uma estrutura protetora rígida, denominada cisto, com mais ou menos 500 ovos, que podem permanecer viáveis por até 7 anos, mesmo sem a presença de um hospedeiro.
Sintomas nas Plantas
O sintoma inicial de ocorrência do nematoide-de-cisto-da-soja nas lavouras caracteriza-se pela presença de reboleiras, com as plantas atrofiadas e cloróticas e com poucas vagens (Figura 10). Em locais onde a população do patógeno é alta, também pode ocorrer morte prematura de plantas.
Nas raízes podem ser observados cistos (fêmeas da espécie) com coloração que podem ser brancas/amarelas/marrom.
Nematóide reniforme – Rotylenchulus reniformis
Rotylenchulus reniformis é considerado um dos principais problemas da cultura do algodoeiro, mas sua importância vem crescendo nos últimos anos em áreas cultivadas com soja e algodão na região do Cerrado brasileiro (FAVORETO et al., 2019).
O ciclo de vida do Rotylenchulus reniformis é completado entre 24 a 30 dias, com grande influência da temperatura nesse período.
É uma das espécies de maior dificuldade de identificação, uma vez que os sintomas na parte aérea incluem desuniformidade no desenvolvimento e porte reduzido das plantas, com sintomas que se assemelham a deficiência nutricional. Contudo, ao contrário do que ocorre com outros gêneros, não há sintomas aparente no sistema radicular das plantas e não há formação de reboleiras.
Coleta e envio de amostras para análise nematológica
Nem sempre é possível reconhecer e diagnosticar a presença de nematoides exclusivamente pela observação dos sintomas. Para tanto, é imprescindível a realização de análise laboratorial.
Considerando que os principais fitonematoides parasitam órgãos vegetais subterrâneos (principalmente as raízes), o bom senso prevalece na coleta e no envio de amostras nematológicas.
De acordo com Oliveira et al. (2018), para culturas anuais, pelo menos 10 subamostras por hectare devem ser coletadas, totalizando uma amostra composta de aproximadamente 0,5 a 1,0 kg de solo (com a umidade natural) e 20 g de raízes. Preferencialmente, as raízes devem ser encaminhadas envolvidas na mistura de solo para não ressecar. As amostras (solo + parte vegetal) devem ser acondicionadas em sacos plásticos resistentes e encaminhadas com brevidade para análise. Além disso, devem ser corretamente identificadas.
Métodos de controle de Nematóides
O manejo de nematóides é feito principalmente com o uso de cultivares resistentes, rotação de culturas com espécies não hospedeiras e com a aplicação de nematicidas químicos ou biológicos (Machado et al., 2022). Apesar das opções disponíveis para controle, o manejo inadequado e a intensificação da monocultura ainda são fatores contribuintes para os danos causados pelos fitonematoides. Ademais, os ovos e larvas podem sobreviver por longos períodos no solo, facilitando sua disseminação e dificultando a prevenção do parasita.
Referências
FAVORETO, L.; MEYER, M.C.; DIAS-ARIEIRA, C.R.; MACHADO, A.C.Z.; SANTIAGO, D.C.; RIBEIRO, N.R. Diagnose e manejo de fitonematoides na cultura da soja. Informe Agropecuário, v.40, n.306, p.18-29, 2019.
FERRAZ, L. C. C. B.; BROWN, D. J. F. Nematologia de plantas: fundamentos e importância. Manaus: Norma Editora, 2016. 251p. ISBN: 978-85-99031-26-1.
LOPES-NICORA, H. et al., Manual de Fitopatologia agrícola. Bases y procedimientos. Atlas: Universidad San Carlos. 2021. DOI:10.53997/DFXA5914
MACHADO, A. Nematoide: a praga que custa R$ 35 bilhões ao agronegócio brasileiro. Disponível em: https://www.adealq.org.br/acontece/Nematoide-a-praga-que-custa-R$-35-bilh%C3%B5es-ao-agroneg%C3%B3cio-brasileiro-1410. Acesso: 24 de abril de 2023.
MACHADO, A.C.Z. Bionematicides in brazil: an emerging and challenging market. Revisão Anual de Patologia de Plantas, v. 28, p. 35-49, 2022. DOI: 10.31976/0104-038321v280002.
OLIVEIRA, C.M.G.; ROSA, J.M.O.; GIORIA, R.; BRAGA, K.G.B. Nematóides. In: BRANDÃO FILHO et al. Hortaliças – Frutos. Maringá: Editora da Universidade Estadual de Maringá – EDUEM, 2018, 535 p. DOI: 10.7476/9786586383010.0011
Sobre a autora:
Beatriz Nastaro Boschiero
Especialista em MKT de Conteúdo na Agroadvance
- Pós-doutora pelo CTBE/CNPEM e CENA/USP
- Mestra e Doutora em Solos e Nutrição de Plantas (ESALQ/USP)
- Engenheira Agrônoma (UNESP/Botucatu)
Uma resposta
Muito interessante sobre o nematóides