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Nematoides parasitas da cana e como fazer o manejo

As principais espécies de nematoides parasitas da cana-de-açúcar compreendem os nematoides das lesões radiculares Pratylenchus zeae e P. brachyurus e os nematoides das galhas Meloidogyne javanica e M. incognita (BARBOSA et al., 2013). Em variedades mais suscetíveis e sob condições de altas densidades populacionais de fitonematoides no solo, as perdas de produtividade podem chegar a 50% em cana planta e a 20 t/ha por corte em cana soca (DINARDO-MIRANDA, 2005).

Somada às perdas, a redução da longevidade do canavial devido a altas infestações de fitonematoides e necessidade de reforma precoce também oneram o setor.

Como identificar a presença de nematoides parasitas na cana-de-açucar?

Os nematoides parasitas não podem ser observados a olho nu e seus sintomas diretos na cultura da cana-de-açúcar ocorrem no sistema radicular, onde estabelecem o parasitismo. Além disso, a necessidade de o produtor realizar o manejo de extensas áreas de cultivo contribui para que o problema passe despercebido até a colheita e constatação de menores produtividades. É importante estar atento para identificar a presença de nematoides parasitas no canavial e realizar o manejo adequado.

Sintomas comuns das nematoses são o menor desenvolvimento da parte aérea das plantas, que além de porte reduzido, podem se apresentar cloróticas (amareladas) e com menor turgidez (mais murchas) nas horas mais quentes do dia (DINARDO-MIRANDA, 2005). Estes sintomas ocorrem em reboleiras (Figura 1) e são o reflexo dos danos que os nematoides parasitas causam no sistema radicular das plantas, comprometendo a absorção de água e nutrientes. É a constatação destes sintomas que indicarão a necessidade de observação das raízes. 

Figura 1. Reboleira de plantas de cana-de-açúcar infectadas por nematoides. Fonte: Dinardo-Miranda, 2005.

Nas raízes, os sintomas que os nematoides parasitas causam são bastante característicos e indicam o gênero de nematoide responsável pela doença. Nas raízes de plantas infectadas por espécies de Pratylenchus ocorrem lesões necróticas (Figura 2a). Quando a infecção é causada por espécies de Meloidogyne, é possível observar as galhas, que são regiões entumescidas nas raízes, formadas onde os nematoides parasitas se instalaram (Figura 2b). 

Figura 2. Sintomas da infecção por nematoides parasitas em raízes de cana-de-açúcar. As setas indicam lesões necróticas causadas por Pratylenchus sp. (A) e galhas causadas por Meloidogyne sp. (B). Fonte: Dinardo-Miranda, 2005.

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Tanto no parasitismo pelos nematoides parasitas causadores de lesões como pelos nematoides das galhas, o desenvolvimento e funcionamento correto do sistema radicular das plantas é comprometido.

Nematoides das lesões radiculares Pratylenchus zeae e P. brachyurus

Estes nematoides migradores que infectam as raízes causam danos por meio de ação mecânica, desorganizando as células vegetais enquanto se movimentam; ação espoliativa, durante sua alimentação; e ação tóxica, devido à injeção de secreções esofagianas que provocam a morte das células vegetais. Sua invasão ainda deixa lesões nas raízes que são porta de entrada para a colonização por fungos e bactérias, que ampliam a área de tecido necrosado (FERRAZ, 2018).

Como resultado, as raízes ficam com manchas escuras alternadas com áreas claras, que é o sintoma radicular típico do ataque destes nematoides (Figura 2a). A postura de ovos destes nematoides parasitas ocorre de forma isolada, no interior das raízes ou no solo (FERRAZ, 2018).

nematoides parasitas
Figura 3. Fotomicrografia de Pratylenchus sp., colorido em vermelho, penetrando tecido radicular. Fonte: Jonathan D. Eisenback, Virginia Polytechnic Institute and State University, Bugwood.org.

Nematoides das galhas Meloidogyne javanica e M. incognita

Neste caso, a infecção é estabelecida com a indução da formação de um sítio de alimentação pela fêmea adulta do nematoide no interior da raiz da planta. O nematoide injeta secreções esofagianas que provocam o engrossamento da raiz pelo aumento do tamanho e volume das células da própria planta ao redor de onde se instalou. Estas células passam a servir para a nutrição do nematoide, que deixa de se movimentar e produzirá ovos por partenogênese, (sem a participação do macho) que serão liberados no solo (FERRAZ, 2018).

É este engrossamento na raiz que forma as galhas típicas do parasitismo por e Meloidogyne spp. (Figura 4). 

Figura 4. Formas juvenis de Meloidogyne sp., coloridos em vermelho, penetrando a ponta de raiz de cana-de-açúcar registradas em fotomicrografia. Fonte: Tomazini; Bessi; Oliveira, 2008.
Figura 5. Fêmea de Meloidogyne sp. no interior de raiz após a formação da galha (A) e após a liberação dos ovos (B), registradas em fotomicrografias. Fonte: Rohde, de Agrios, 2005.

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Diagnóstico e Manejo de Parasitas na Cana

A identificação de qual espécie de Pratylenchus ou de Meloidogyne está causando a doença exige a análise de raízes e/ou de solo em laboratórios especializados e pode ser importante no manejo. Por exemplo, a sucessão da cana por Crotalaria juncea pode ser eficiente para reduzir populações de P. zeae, mas pouco eficiente no manejo de P. brachyurusM. javanica e M. incognita (INOMOTO, 2017). No entanto, há opções de adubos verdes que podem ser eficazes contra estas quatro principais espécies de nematoides parasítas.

Manejo integrado de fitonematoides

A semeadura de Crotalaria spectabilis ou C. breviflora em áreas de reforma pode ser realizada para reduzir as populações das quatro principais espécies de nematoides parasitas da cana-de-açúcar, pois estas plantas são resistentes a elas. A incorporação da biomassa destes adubos verdes no solo também auxilia no manejo, já que os compostos liberados durante a sua degradação possuem ação nematicida. (INOMOTO, 2017). 

O controle químico com nematicidas e a aplicação de agentes de controle biológico também são estratégias disponíveis para o manejo dos nematoides parasitas. No controle químico, nematicidas dos grupos dos organofosforados e metilcarbamatos de benzofuranila estão registrados para o controle de P. zeaeM. incognita e M. javanica (AGROFIT). Para P. zeae e M. javanica, também estão registrados produtos do grupo dos metilcarbamatos de oxima, além de abamectina (avermectina); para M. incognita e P. zeae, também há um nematicida que possui extrato de alho como ingrediente ativo registrado (AGROFIT).

Para o controle de P. brachyurus na cultura da cana não há nematicidas registrados, embora alguns produtos com registro para o controle de outros nematoides em cana-de-açúcar estejam registrados para o controle de P. brachyurus na cultura da soja; este é o caso da abamectina (avermectina), tidiocarbe (metilcarbamato de oxima), cadusafós (organofosforado) e do nematicida à base de extrato de alho (AGROFIT)

Isto não significa que estes produtos devam ser utilizados para o controle desta espécie de fitonematoide em cana, mas é possível que um efeito de controle sobre P. brachyurus ocorra quando um destes produtos é utilizado para reduzir a população de outro nematoide, para qual o produto foi registrado na cultura. Quanto ao controle biológico, as opções de produtos disponíveis vêm crescendo e ganhando espaço no mercado.

Formulações à base de Trichoderma harzianum e da associação de Bacillus subtilis com B. licheniformispromoveram reduções superiores a 30% na população de P. zeae em cana-de-açúcar (SCHOEN-NETO et al., 2019). Outro agente de controle biológico de fitonematoides também disponível comercialmente é o fungo Pochonia chlamydosporia.

Para o controle genético, infelizmente ainda não há variedades de cana resistentes a nematoides disponíveis.

E as variedades de cana tolerantes a nematoides?

Variedades tolerantes são aquelas que apresentam um bom desempenho agronômico mesmo na presença dos nematoides parasitas e os benefícios de sua adoção podem ser equivalentes aos do uso de nematicidas em variedades suscetíveis (SPAULL; CADET, 2003). Embora o potencial produtivo da variedade tolerante possa não ser afetado pelos nematoides parasitas, a população destes parasitas continua a se multiplicar. Assim, o solo onde se cultiva uma variedade tolerante poderá ser fonte de inóculo para que os nematoides sejam carregados para outras áreas.

Além disso, após a reforma de um talhão que estava sendo cultivado com variedade tolerante, se escolhida uma variedade suscetível, as perdas de produtividade poderão ser bastante expressivas. Deste modo, quando se opta por variedades tolerantes, é importante estar atento para evitar a disseminação de nematoides para outras áreas e para evitar a escolha de uma variedade suscetível para cultivo na mesma área quando for substituí-la.

Antes da reforma, um diagnóstico das populações de nematoides presentes na área pode ser obtido após a análise de solo e raízes em laboratórios especializados e poderá embasar a escolha de um adubo verde ou da próxima variedade de cana para o local.

Considerações finais

É preciso ter atenção para identificar a ocorrência dos nematoides parasitas no campo e para realizar seu manejo de forma adequada. O manejo das nematoses na cultura da cana-de-açúcar exige uma visão holística de todo o processo produtivo e deve estar presente não apenas nas práticas culturais de controle químico ou biológico, mas também no planejamento correto da adubação verde e na escolha das variedades que serão plantadas nas áreas de reforma.

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Referências

AGROFIT. Informações sobre agrotóxicos fitossanitários registrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Disponível em: <https://agrofit.agricultura.gov.br/agrofit_cons/principal_agrofit_cons> Acesso em 26/07/2021.

BARBOSA, B. F. F., SANTOS, J. M.; BARBOSA, J. C.; SOARES, P. L. M.; RUAS, A. R.; CARVALHO, R. B. Aggressiveness of Pratylenchus brachyurus to the sugarcane, compared with key nematode P. zeae. Nematropica, v.43, p.119-130, 2013.

DINARDO-MIRANDA, L. L. Manejo de nematoides em cana-de-açúcar. Jornal da Cana, 2005. Disponível em: https://www.agencia.cnptia.embrapa.br/Repositorio/5Ctecnologiaagricola_000fxg3tc4b02wyiv80soht9h8ex6by1.pdf

FERRAZ, L.C.C.B. Nematoides. In: AMORIM, L.; REZENDE, J.A.M.; BERGAMIN FILHO, A. Manual de Fitopatologia, v.1. Princípios e Conceitos. Ouro Fino: Agronômica Ceres, 2018. p.195-211.

INOMOTO, M. Entrevista. Disponível em: <https://revistarpanews.com.br/por-que-fazer-adubacao-verde/> Acesso em 27/12/2020.

SCHOEN-NETO, G. A., M. SOARES, M. SORACE and C. R. DIAS-ARIEIRA. Biological nematicides associated with biofertilizers in the management of Pratylenchus zeae in sugarcane. Rev Bras Cienc Agrar, v.14, n.4, p.1-7, 2019.

SPAULL, V.W., CADET, P. Impact of nematodes on sugarcane and the benefit of tolerant varieties. Proc S Afr Sugar Techn Ass, v.77, p.230-238, 2003.

Esse texto é opinião do autor e não reflete, necessariamente, a posição da Agroadvance.

Sobre a autora:

Ísis Tikami

Engenheira Agrônoma (ESALQ/USP)

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