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Cigarrinha do milho: o vetor de enfezamentos e risca do milho

A cigarrinha Dalbulus maidis (DeLong & Wolcott) ou cigarrinha do milho é uma das principais pragas da cultura do milho e, embora não provoque danos diretos expressivos durante sua alimentação, é vetor de três importantes patógenos da cultura: Maize bushy stunt phytoplasma (MBSP), que causa o enfezamento vermelho; Spiroplasma kunkelli, agente causal do enfezamento pálido; e o vírus da risca do milho Maize rayado fino virus (MRFV) (NAULT, 1980; NAULT et al., 1980).

A cigarrinha do milho Dalbulus maidis

O inseto cigarrinha do milho tem coloração amarelo-palha (Figura 1), apresenta de 3,7 a 4,3 mm de comprimento e pode ser encontrado no cartucho de plantas de milho (OLIVEIRA, 2003). Sua alimentação se dá pela introdução de seu aparelho bucal do tipo sugador diretamente no floema da planta e é durante a alimentação que a cigarrinha adquire os patógenos que transmite (OLIVEIRA et al., 2003).

O milho é a principal espécie hospedeira do vetor. Em sua ausência como cultura principal, o inseto sobrevive em plantas de milho voluntárias (tiguera) e em cultivos de milho de outras áreas que pode alcançar por migração (OLIVEIRA et al., 2013).

É possível também que a cigarrinha sobreviva em outras espécies de gramíneas, mas não há evidências de que possa transmitir doenças para o milho após ter se alimentado destas espécies (OLIVEIRA, 2019; OLIVEIRA et al., 2020). No entanto, o fato de termos milho cultivado durante quase todo o ano favorece a sobrevivência e multiplicação da cigarrinha (SILVEIRA, 2019), bem como dos patógenos por ela transmitidos.

cigarrinha do milho dalbulus maidis

Figura 1. Cigarrinha Dalbulus maidis em planta de milho (A), estágios ninfais e adulto da cigarrinha (B). Fontes: Sabato, 2018 (A) e Nault, 1980.

Enfezamentos do milho

Foi relatada maior ocorrência destas doenças no milho safrinha que na safra de verão em algumas regiões (OLIVEIRA et al., 2002; SABATO et al., 2018). Assim, uma atenção especial a estas doenças e ao seu vetor deve ser dada pelos produtores que estão iniciando a safrinha. O enfezamento vermelho e o enfezamento pálido do milho são doenças similares causadas por molicutes (bactérias sem parede celular) que colonizam a planta de forma sistêmica.

O molicute que provoca o enfezamento vermelho é um fitoplasma, sem forma definida (Figura 2A), e o que causa o enfezamento pálido é um espiroplasma, que apresenta formato espiralado (Figura 2B). A infecção por estes patógenos costuma ocorrer na fase inicial da cultura, com a manifestação de sintomas na época de enchimento dos grãos (OLIVEIRA et al., 2003; SABATO, 2018). Os enfezamentos podem ser confundidos, pois podem provocar sintomas muito semelhantes (SABATO, 2018) e é possível ainda que ocorram simultaneamente na mesma planta (OLIVEIRA, et al. 2002). Temperaturas predominantemente superiores a 17 °C à noite e a 27 °C durante o dia, são favoráveis à multiplicação dos molicutes na cigarrinha e nas plantas doentes (SABATO, 2018).

cigarrinha do milho causa enfezamento no milho
Figura 2. Eletromicrografias mostrando o fitoplasma do enfezamento vermelho do milho (A) e a morfologia helicoidal de Spiroplasma kunkelli (barra: 500 mm) no floema de plantas infectadas. Fontes: Nault, 1980 (A); Massola Jr. e Kitajima (B).

Enfezamento Vermelho

O agente causal do enfezamento vermelho Maize bushy stunt phytoplasma (MBSP) é habitante do floema de plantas de milho doentes. A cigarrinha adquire o patógeno depois de se alimentar no floema de uma planta de milho infectada. Passado um período em que o fitoplasma se multiplica no interior da cigarrinha (período de latência), esta passa a transmitir o patógeno ao se alimentar de plantas de milho sadias (Figura 4) (OLIVEIRA et al., 2003).

Os sintomas típicos do enfezamento vermelho se iniciam com clorose foliar marginal, seguida do avermelhamento em folhas mais velhas (NAULT, 1980). As plantas infectadas têm discreto encurtamento dos internódios, podem adquirir coloração vermelha intensa e apresentar formação atípica de perfilhos e de espigas em várias axilas da planta, além de espigas pequenas e com falhas de granação (OLIVEIRA et al., 2003). Os sintomas da doença, no entanto, podem limitar-se ao avermelhamento nas bordas e pontas das folhas, menor tamanho das espigas e falhas na granação (SABATO, 2018).

Enfezamento pálido

Seu agente causal Spiroplasma kunkelli é adquirido e transmitido por D. maidis da mesma maneira que o fitoplasma do enfezamento vermelho (Figura 4) (OLIVEIRA et al., 2003). Os sintomas característicos da doença são manchas cloróticas na forma de estrias que se iniciam pela base das folhas, porte reduzido, proliferação de espigas, espigas pequenas e com falhas de granação (OLIVEIRA et al., 2003; SABATO, 2018; SILVEIRA, 2019).

De acordo com a idade da planta quando infectada e do nível de resistência do cultivar, os sintomas apresentados podem ser apenas de amarelecimento ou avermelhamento nas margens e pontas das folhas (OLIVEIRA et al., 2003; SABATO, 2018).

milho com sintomas de enfezamento
Figura 3. Planta de milho com sintomas de enfezamento (A); plantas de milho com sintomas característicos de enfezamento vermelho (B) e de enfezamento pálido (C). Fonte: Sabato, 2018. 

Apesar da impossibilidade de diferenciar de forma segura, com base na observação dos sintomas, qual o enfezamento que mais está ocorrendo em uma lavoura (SABATO, 2018), conhecer de forma geral os sintomas dos enfezamentos é importante e o suficiente para fins práticos em seu manejo.

ciclo do enfezamento do milho
Figura 4. Ciclo simplificado dos enfezamentos na cultura do milho. Autoria: Ísis Tikami.

Risca do milho 

Maize rayado fino virus (MRFV) é o agente causal desta doença (NAULT et al., 1980), seus sintomas se iniciam com pontos cloróticos alinhados, que se fundem formando uma risca fina (Figura 5); a redução do crescimento e aborto de gemas florais também podem ocorrer em cultivares suscetíveis infectados (WAQUIL, 2004). D. maidis adquire o vírus após se alimentar no floema de plantas de milho infectadas.

Neste caso, assim como ocorre com os enfezamentos, o patógeno é capaz de se multiplicar no inseto vetor, para depois ser transmitido durante a sua alimentação em plantas sadias (RIVERA; GÁMEZ, 1986). Embora esta doença seja de menor importância econômica que os enfezamentos, perdas de produção da ordem de 30% foram associadas a ela (OLIVEIRA et al., 2003).

sintomas da infecção por Maize rayado fino virus (MRFV)  em folhas de milho
Figura 5. Folha de milho com sintomas da infecção por Maize rayado fino virus (MRFV) (acima) e folha sadia (abaixo). Fonte: Sabato, 2018.

Manejo das doenças transmitidas por Dalbulus maidis

As medidas de manejo indicadas incluem eliminar plantas de milho voluntárias, evitar a semeadura de milho nas proximidades de lavouras adultas com sintomas destas doenças, realizar a sucessão e rotação de culturas e, quando possível, a sincronização do período de semeadura de milho na região para evitar que cultivos de milho estejam continuamente disponíveis ao vetor em uma região (SABATO, 2018).

O emprego de inseticidas (indicados para o vetor e para a cultura) no tratamento de sementes e em pulverizações nos estágios iniciais de desenvolvimento do milho são importantes para reduzir a população de cigarrinhas e evitar a transmissão destas doenças (SABATO, 2018; SILVEIRA, 2019).

Os fungos entomopatogênicos Isaria fumosorosea e Beauveria bassiana também estão disponíveis comercialmente para o controle do vetor (AGROFIT). Por fim, a utilização de cultivares resistentes e diversificação das cultivares semeadas para evitar quebra de resistência também são recomendadas (SABATO, 2018). 

controle da cigarrinha do milho

Considerações finais

Devido às características destes patossistemas, o manejo integrado das doenças transmitidas pela cigarrinha do milho não beneficia apenas os produtores que as empregam, mas todos os produtores de uma região. Infelizmente, o oposto também ocorre e quando o manejo não é realizado adequadamente e a incidência da doença aumenta, as plantas infectadas de um cultivo passam a ser fonte de inóculo para outros. Assim, é importante que cada produtor faça a sua parte, implementando as medidas de manejo e ajudando a alertar outros produtores sobre a sua importância.

Veja outros artigos do nosso blog relacionados à cultura do milho: Artigos de milho.

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Referências

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NAULT, L.R. Electron micrograph showing maize bushy stunt phytoplasma in the phloem of an infected maize plant. Figura científica em ResearchGate. Disponível em: <https://www.researchgate.net/figure/Electron-micrograph-showing-maize-bushy-stunt-phytoplasma-in-the-phloem-of-an-infected_fig3_249297190> Acesso em 19/01/2021.

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Este texto é opinião do autor, não reflete necessariamente opinião da Agroadvance.

Sobre a autora

Ísis Tikami

Engenheira Agrônoma (ESALQ/USP)

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