Você está visualizando atualmente Estresse térmico: como as ondas de calor podem afetar o desenvolvimento da soja?
Foto: Notícias agrícolas

Estresse térmico: como as ondas de calor podem afetar o desenvolvimento da soja?

Entenda como o estresse térmico causado pelas altas temperaturas, como as ondas de calor que ocorrem em anos de El-Niño, pode afetar o desenvolvimento e a produção da cultura da soja e o que pode ser feito para mitigar tais problemas.

As mudanças climáticas têm provocado eventos extremos em todo o mundo, e as ondas de calor tornaram-se mais frequentes em várias partes do mundo.

No Brasil, estamos enfrentando agora em novembro de 2023 uma onda de calor que está impactando diversas áreas, incluindo a agricultura – notadamente a cultura da soja.

Vamos explorar neste artigo como o estresse térmico pode afetar o desenvolvimento e a produtividade da soja, em função dos diferentes estádios fenológicos da cultura.

Ondas de calor e as altas temperaturas

As ondas de calor são fenômenos atmosféricos que se caracterizam pelo aumento significativo e anormal das temperaturas em uma determinada região, comparado aos valores máximos considerados normais para aquele local.

Este fenômeno meteorológico é desencadeado por sistemas de alta pressão que temporiamente impedem a movimentação do ar quente na área afetada, podendo persistir por vários dias.

Sua ocorrência está associada a fatores como frentes frias e o El Niño.  Além disso, as mudanças climáticas podem estar relacionadas a tais efeitos, uma vez que a frequência do surgimento das ondas no calor tanto no Brasil quanto no mundo estão cada vez maiores.

E como essa elevação de temperatura afeta a agricultura, especialmente a cultura da soja? É o que vamos ver a seguir.

Efeito do estresse térmico na soja

A temperaturas ideal para o crescimento da soja é entre 20ºC e 30ºC (Figura 1). Quando as temperaturas excedem esse limite, especialmente por vários dias subsequentes, pode ocorrer estresse térmico.

estresse térmico temperatura ideal para a soja e efeito de temperaturas elevadas e baixas
Figura 1. Faixa térmica ideal ao desenvolvimento da cultura da soja e alguns efeitos decorrentes de temperaturas baixas e elevadas. Fonte: Embrapa.

O calor excessivo aliado à condição de solo seco pode aumentar a temperatura do solo, levando à redução da umidade e da absorção de nutrientes, e essas são as piores condições possíveis para causar o estresse térmico na soja.

Efeito das ondas de calor (altas temperaturas) nos estádios fenológicos da soja

As altas temperaturas irão afetar negativamente o desenvolvimento da soja, de acordo com o estádio fenológico da cultura. Vejamos a seguir:

Germinação e Emergência

A soja é altamente sensível ao estresse por altas temperaturas durante a germinação e desenvolvimento inicial das plântulas.

O estresse térmico durante a germinação da soja pode resultar em menor taxa de germinação das sementes (devido à diminuição na viabilidade das sementes e má germinação) e emergência das plântulas, o que afeta negativamente a população de plantas.

Explicando fisiologicamente: durante o processo inicial de germinação da soja, a alta temperatura reduz significativamente a taxa de embebição, a capacidade de expansão do tecido embrionário e a respiração mitocondrial.

Assim, o estresse térmico causa efeitos prejudiciais ao metabolismo das plantas, perturbando sua homeostase celular.

A exposição das plantas a altas temperaturas (acima da faixa de níveis ideais) pode causar perturbações no ciclo de vida geral da planta e gerar estresse oxidativo e acúmulo de Espécies Reativas de Oxigênio (ERO’s).

Desenvolvimento vegetativo

O desenvolvimento vegetativo da soja é afetado negativamente pelo estresse causado pelas altas temperaturas.

Durante o estádio vegetativo, as altas temperaturas podem resultar em redução ou interrupção da fotossíntese, da transpiração e da condutância estomática devido ao fechamento dos estômatos da planta em um esforço para conservar a umidade.

estresse térmico em soja
Foto: Notícias Agrícolas

Quando os estômatos estão fechados, a fotossíntese é restrita devido à absorção limitada de CO2. Isso inibirá o crescimento vegetativo da soja.

Para a soja plantada tardiamente esse é um ponto crítico, uma que vez que o crescimento vegetativo adequado é fundamental para impulsionar o desenvolvimento reprodutivo.

Temperaturas acima de 35ºC também podem reduzir a nodulação e, finalmente, a fixação de nitrogênio na soja, e os efeitos podem se estender para os estágios de crescimento reprodutivo.


Desenvolvimento reprodutivo (floração e formação de vagens)

Os períodos de crescimento reprodutivo da soja são mais sensíveis a altas temperaturas do que os períodos de crescimento vegetativo.

Altas temperaturas durante o desenvolvimento vegetativo podem levar à queda de flores, reduzindo o potencial de formação de vagens (menor número de vagens, vagens pequenas, sementes abortadas e sementes menores) – o que por consequência afeta negativamente o rendimento da cultura.

Também, o aumento da abscisão foliar (devido a maior produção de espécies reativas de oxigênio) pode comprometer o desenvolvimento normal da planta.

A alta temperatura induz um suprimento limitado de água e nutrição, o que influencia a expansão das folhas, o alongamento dos entrenós e motiva o aborto dos botões florais nas plantas.

É importante lembrar que a soja não tem capacidade genética de transformar todas as flores em vagens, mesmo em condições ambientais ideias. Portanto, dependendo do nível de estresse pode ocorrer o abortamento de 20-80% das flores.

Estudos indicam que o impacto mais severo das altas temperaturas ocorre quando a soja está em estádio R5.

Maturação

Temperaturas elevadas durante a maturação podem levar à desidratação precoce das sementes, resultando em sementes de menor peso.

Além disso, a qualidade geral da colheita pode ser comprometida devido ao estresse térmico durante este estádio.

Na tabela 2 são resumidos alguns efeitos fisiológicos relatados na literatura devido ao estresse térmico na cultura da soja.

Tabela 2. Efeito da alta temperatura na morfofisiologia e produtividade da soja

TºC e duraçãoEfeitos na cultura da soja
30ºCA redução no suprimento de fotoassimilados ao órgão reprodutivo causou o aborto de flores, vagens jovens e sementes.
35ºC, 14 diasCausou aborto de vagem; O estágio reprodutivo mostrou diminuição nos componentes do rendimento de sementes, como número de vagens por planta, número de sementes por vagem e peso de 100 sementes.
35ºC de dia e 25ºC a noite), 10 diasAumento do teor de H2O2, hidroperóxido lipídico, peroxidação lipídica. Diminuição da atividade das enzimas GR (glutationa redutase) e GST (glutationa S-transferase).
39/20ºCDiminuição do conteúdo foliar de clorofila, taxa fotossintética, extinção fotoquímica, taxa de transporte de elétrons, viabilidade e germinação do pólen, diminuição do conjunto de vagens e peso de sementes por planta.
38º de dia e    28ºC a noite,        14 diasAumento das taxas de produção de etileno, danos oxidativos; diminuição da atividade das enzimas antioxidantes, clorofila, sacarose, proteína solúvel e fotoquímica PSII; causou senescência prematura das folhas, aumentou a abscisão das flores e diminuiu a porcentagem de formação de vagens.
38ºC/30ºC, vegetativo até 10 dias após a floraçãoDiminuição da fotossíntese líquida, do teor de clorofila, fenólicos e ceras. Diminuição da altura das plantas, área foliar e biomassa total.
40ºC com 100% de umidade relativa; 0, 5, 10, 15 e 20 diasAtividades diminuídas de enzimas antioxidantes como SOD (superóxido desmutase), APX (ascorbato peroxidase), CAT (catalase) e GR (glutationa redutase). Aumento de O2•– e H2O2 e oxidação lipídica e morte celular.
45ºC, 2hDiminuição do comprimento da raiz primária, do hipocótilo e da plântula. Integridade da membrana distorcida, aumento do vazamento de eletrólitos e conteúdo de MDA (malondialdeído).
Fonte: Nahar et al. (2016).

Estratégias para evitar o estresse térmico

Algumas estratégias para evitar o estresse térmico da lavoura incluem:

  • Uso de Práticas de Conservação do Solo: Práticas como cobertura morta e rotação de culturas podem ajudar a conservar a umidade do solo, reduzindo o estresse térmico.
  • Seleção de Cultivares Tolerantes ao Calor: Optar por cultivares de soja mais tolerantes ao calor pode ser uma estratégia eficaz para minimizar os impactos das ondas de calor
  • Manejo Adequado da Irrigação: a irrigação adequada pode ajudar a moderar as temperaturas no campo, proporcionando um ambiente mais propício ao desenvolvimento da soja.
  • Aplicação de antioxidantes, osmoprotetores, e os fitohormônios podem melhorar a tolerância ao estresse térmico em plantas de soja através de diferentes mecanismos (SABAGH et al. 2016).

Conclusão

O estresse térmico tem efeitos prejudiciais na produção de soja, especialmente durante fases críticas como o enchimento de sementes e a formação de vagens.

Esse estresse térmico modifica o desenvolvimento das sementes, reduzindo seu peso e número, o que resulta em uma diminuição significativa no rendimento da cultura. A exposição ao estresse térmico durante essas fases críticas acelera o processo de enchimento de sementes, diminuindo a duração dessa etapa e, consequentemente, reduzindo o potencial de rendimento.

Além disso, o estresse térmico afeta a capacidade fotossintética das plantas, impactando a produção de assimilados e a mobilização para as sementes.

Os efeitos do estresse térmico não se limitam apenas ao enchimento de sementes; também influenciam a iniciação floral, a formação de sementes e a abscisão de vagens, resultando em uma diminuição no número de sementes por planta.

A redução na capacidade fotossintética, devido ao estresse térmico, afeta negativamente o desenvolvimento das sementes e os atributos de crescimento, levando a uma diminuição na produção de biomassa.

Além disso, a escassez de água durante o estágio de desenvolvimento dos grãos também contribui para a redução no tamanho e peso dos grãos, impactando negativamente o rendimento final da soja.

A exposição prolongada a altas temperaturas, especialmente acima de 35°C, provoca estresse térmico, diminuindo o desenvolvimento da planta, a formação de grãos nas vagens e a acumulação de biomassa.

Portanto, para proteger o rendimento da cultura de soja, é essencial abordar os episódios de temperaturas extremamente altas, tanto nas condições climáticas atuais quanto futuras, buscando estratégias de mitigação do estresse térmico durante o desenvolvimento reprodutivo das plantas de soja.


Assim como o estresse térmico, a deficiência nutricional causa uma série de respostas fisiológicas na planta que afetam o crescimento e causam perda de produtividade nas lavouras. Baixe agora mesmo, gratuitamente, nosso guia de fisiologia vegetal e entenda todos os processos vegetais afetados pela deficiência de N, P, K, Ca, Mg e S. É só clicar em saiba mais:

Referências

NAHAR, K.; HASANUZZAMAN, M.; FUJITA, M. Heat stress responses and thermotolerance in soybean. In: MIRANSAMI, M. (Ed). Abiotic and biotic stress in soybean Production. Academic Press, 2016. pp. 261-284.

SABAGH, A.E.; HOSSAIN, A.; ISLAM, M.S.; IQBAL, M.A.; FAHAD, S.; TATNASEKERA, D.; AZEEM, F.; WASAYA, A.; SYTAR, O.; KUMAR, N.; LLANES, A.; ERMAN, M.; CERITOGLU, M.; ARSLAN, H.; ARSLAN, S.; HUSSAIN, S.; MUBEEN, M.; IKRAM, M.; MEENA, R.S.; GHARIB, H.; WARAICH, E.; NASIM, W.; LIU, L.; SANEOKA, H. Consequences and mitigation strategies of heat stress for sustainability of soybean. In: SHABALA, S. (ed). Plant Stress Physiology. Cabi. 2016, 376 p.

VANN, R. How do hight temperatures impact my soybeans? 2020. Disponível em: https://soybeans.ces.ncsu.edu/2020/07/how-do-high-temperatures-impact-my-soybeans. Acesso: 16 de novembro de 2023.

Sobre a autora

Beatriz Nastaro Boschiero

Beatriz Nastaro Boschiero

Especialista em MKT de Conteúdo na Agroadvance

Deixe um comentário

Não perca nenhuma novidade do agronegócio!

Fique por dentro das últimas tendências do agronegócio com a newsletter da Agroadvance. É gratuito e você ainda receba notícias, informações, artigos exclusivos, e-books e muito mais.