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Manejo integrado de pragas: quanto evoluímos em 6 décadas?

Manejo integrado de pragas: entenda o que é e como funciona, quais seus princípios e como ocorreu a evolução do MIP desde sua concepção na década de 1970 até os dias de hoje.

O manejo integrado de pragas (MIP) visa uma agricultura sustentável com redução significativa do uso de defensivos agrícolas.

Apesar dos esforços, desde sua concepção na década de 1970, o uso global de defensivos agrícolas, também chamados pesticidas químicos, permanece robusto, trazendo impactos negativos para os cultivos e para a biodiversidade dos sistemas.

Mas afinal, o que é o MIP e por que ele surgiu? Quais princípios norteiam esse manejo? E porque apesar de 6 décadas terem se passado pouco se evoluiu nesta abordagem holística do manejo? Confira neste artigo.

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O que é e como funciona o Manejo integrado de Pragas (MIP)?

O manejo integrado de pragas (MIP) é definido como uma “abordagem” ou “estratégia” holística para combater pragas e doenças de plantas usando todos os métodos disponíveis, minimizando as aplicações de defensivos químicos.

Ao contrário do controle tradicional de pragas que envolve a aplicação rotineira de defensivos agrícolas, o MIP:

  • Foca na prevenção de pragas;
  • Utilização de defensivos agrícolas somente quando necessário.

Qual o objetivo do MIP?

Sobre o manejo integrado de pragas (MIP) é incorreto afirmar que se deseja eliminar as pragas da lavoura. O objetivo do MIP não é erradicar as pragas, mas manejá-las, mantendo suas populações abaixo de níveis economicamente prejudiciais.

Colocar em prática essa visão reduziria não apenas a exposição de agricultores, consumidores e do meio ambiente a compostos químicos tóxicos, mas também os problemas causados pela resistência de pragas a inseticidas.

Quais são os 8 princípios do MIP?

Quais são as ações necessárias para o manejo integrado de pragas? De acordo com Barzman et al. (2015), existem 8 princípios do MIP, definidos em legislação e adotados pela União Europeia:

  1. Prevenção e supressão
  2. Monitoramento
  3. Decisão baseada no monitoramento e nos limites
  4. Utilização de métodos não químicos
  5. Seleção de defensivos químicos
  6. Redução do uso de defensivos químicos
  7. Estratégias anti-resistência
  8. Avaliação

Tais princípios resultam de uma sequência lógica de eventos a serem cumpridos no campo, conforme ilustrado na Figura 1.

Os 3 pilares do manejo integrado de pragas (mip)? são definidos pelos 3 primeiros princípios, que devem ser realizados antes que haja a necessidade de intervenção no controle de pragas na lavoura.

princípios do manejo integrado de pragas

Figura 1. O raciocínio sequencial por trás dos oito princípios do MIP (P1-P8). Fonte: Traduzido de Barzman et al (2015).

O princípio 1 (Prevenção e supressão) vem em primeiro lugar porque engloba o desenho inicial e as ações realizadas no nível do sistema de cultivo para reduzir a severidade e a frequência de surtos de pragas.

A prevenção envolve a adoção de sistemas de cultivo que sejam menos suscetíveis a perdas causadas por pragas. Já a supressão consiste em reduzir a incidência e a severidade do impacto das pragas, complementando a prevenção.

O objetivo não é erradicar totalmente as pragas, mas evitar que elas se tornem dominantes ou prejudiciais em um sistema de cultivo.

Algumas estratégias preventivas incluem práticas importantes para fortalecer os sistemas de cultivo e reduzir a pressão das pragas, como:

  • o uso de material de plantio saudável,
  • detecção precoce de patógenos em substratos e
  • o melhoramento genético de plantas para resistência a pragas.
  • Rotação de culturas
  • aumento da diversidade de plantas no campo.

A integração efetiva de várias táticas agronômicas é essencial para diminuir a dependência dos defensivos químicos no controle de pragas.

Os princípios 2 (Monitoramento) e 3 (Tomada de decisão), que entram em ação uma vez implantado o sistema de cultivo, baseiam-se na ideia de que as medidas de controle na estação resultam de um processo de tomada de decisão sólido que leva em conta a incidência real ou prevista de pragas.

O monitoramento envolve a coleta regular de dados sobre a presença e a abundância das pragas, permitindo que os agricultores e pesquisadores acompanhem as tendências e desenvolvam estratégias adequadas de controle. O uso de feromônios e armadilhas é muito importante nesta etapa.

No caso de uma intervenção ser decidida, os Princípios 4 a 7 oferecem uma sequência de opções de controle que podem ser exploradas começando com as menos preocupantes primeiro:

  • dar preferências para métodos não químicos (princípio 4),
  • seleção de defensivos agrícolas com menores impactos possíveis (princípio 5),
  • diminuição da dose e frequência de aplicação (princípio 6) e
  • adotar estratégias para minimizar a evolução da resistência de pragas aos defensivos agrícolas (princípio 7).

O Princípio 8 (Avaliação) fecha o ciclo, garantindo que os usuários olhem para trás e avaliem suas ações com vistas a melhorar todo o processo.

Como e quando o MIP surgiu?

O uso excessivo e indiscriminado de defensivos agrícolas nas décadas de 1940 e 1950 levou a desastres ecológicos e à impossibilidade de controle das populações de pragas devido ao acúmulo de resistência aos agrotóxicos.

Na década de 1950, pesquisadores dos EUA, propuseram o conceito de “Controle Integrado”, que enfatizava a necessidade de combinar e integrar o controle biológico e químico de pragas.

Essa abordagem visava levar em conta as preocupações ambientais decorrentes do uso indiscriminado de agrotóxicos e buscar soluções mais sustentáveis.

Na década de 1960, o manejo de pragas preocupava-se com o manejo de populações de pragas em uma lavoura.

Na década de 1970, especialmente na Europa continental, a FAO e a IOBC (International Organization for Biological and Integrated Control of noxious animals and plants) promoveram o MIP, como uma estratégia para a proteção de cultivos, integrando várias técnicas de controle de pragas.

Evolução do MIP até os dias de hoje

Analisando a situação atual do controle de pragas no Brasil e no mundo, pode-se concluir que muitos dos princípios do MIP foram abandonados e que, em geral, os defensivos agrícolas são usados ao primeiro sinal do aparecimento dos insetos na lavoura.

Vários fatores contribuem para essa situação, principalmente a falta de uma política governamental que incentive tal prática.

Embora os conhecimentos técnicos estejam disponíveis e existam diversos programas de MIP satisfatórios, os índices de sua adoção e utilização são, no momento, insatisfatórios, podendo comprometer a sustentabilidade agrícola.

Em uma revisão de literatura sobre o assunto chamada: “Integrated pest management: good intentions, hard realities. A review”, Deguine et al (2021), listaram as principais fraquezas do MIP:

  1. Diversas definições do que é o MIP geram uma confusão desnecessária.
  2. Há inconsistências entre os conceitos, práticas e políticas do MIP.
  3. Há um envolvimento insuficiente dos agricultores no desenvolvimento de tecnologias de MIP e frequentemente uma falta de compreensão básica de seus conceitos ecológicos subjacentes.
  4. Desvios dos princípios fundamentais da MIP levaram a abordagens ineficazes e resultados insatisfatórios.
  5. A pesquisa em MIP muitas vezes está atrasada, equivocada e não dá a devida atenção à ecologia e ao funcionamento ecológico dos agroecossistemas.

Os autores afirmam que desde a década de 1960, as diretrizes da MIP têm sido distorcidas, seus conceitos fundamentais têm se degradado e sua implementação séria (em nível de fazenda) não avançou.

Para abordar esses problemas, os autores propõem a “Proteção Agroecológica de Cultivos” como um conceito que explora como a agroecologia pode ser otimamente empregada para a proteção de cultivos.

A Proteção Agroecológica de Cultivos é um campo científico interdisciplinar que inclui uma estratégia ordenada (e priorização clara) de práticas em nível de campo, fazenda e paisagem agrícola, bem como uma dimensão de ecologia social e organizacional.

A Proteção Agroecológica de Cultivos se baseia em princípios de agroecologia e ecologia, visando à saúde dos agroecossistemas em vez de se concentrar apenas no controle de pragas. Isso envolve uma abordagem interdisciplinar, estratégias agronômicas organizadas e integração da ecologia social.

Os autores destacam a necessidade de uma revolução intelectual e uma mudança radical nas práticas atuais, propondo a transição para uma abordagem mais orientada para o cultivo ecológico.

Conclusões 

Ao longo de seis décadas, o Manejo Integrado de Pragas (MIP) buscou promover uma agricultura sustentável, reduzindo o uso indiscriminado de defensivos agrícolas.

No entanto, apesar dos esforços, a utilização global de pesticidas químicos continua a ser robusta, resultando em impactos negativos nos cultivos e na biodiversidade.

O MIP foi concebido como uma abordagem holística que envolve a combinação de diversos métodos de controle de pragas, com foco na prevenção e utilização criteriosa de defensivos agrícolas apenas quando necessário.

Os princípios do MIP, que incluem prevenção, monitoramento, decisões baseadas em limites, métodos não químicos, seleção cuidadosa de defensivos, redução de seu uso, estratégias contra a resistência e avaliação, proporcionam um roteiro lógico para o controle de pragas de maneira mais sustentável.

No entanto, a implementação eficaz desses princípios tem enfrentado desafios, incluindo a falta de envolvimento dos agricultores, a deterioração dos conceitos fundamentais do MIP e a insuficiente consideração da ecologia.

Diante dessas limitações, alguns pesquisadores propõem uma nova abordagem, chamada Proteção Agroecológica de Cultivos, a fim de adotar princípios de agroecologia e ecologia, priorizando a saúde dos agroecossistemas em vez do simples controle de pragas.

Será que conseguiremos efetivamente implementar uma abordagem da Proteção Agroecológica de Cultivos em detrimento ao MIP? Diante dos desafios atuais e das limitações enfrentadas na adoção plena dos princípios do MIP, a proposição de uma mudança radical em direção a uma abordagem mais orientada para o cultivo ecológico levanta questões sobre sua viabilidade e aceitação.

Será necessário um esforço conjunto de cientistas, agricultores, formuladores de políticas e sociedade em geral para explorar e abraçar essa nova perspectiva, buscando equilibrar a eficácia no controle de pragas com a preservação da saúde dos ecossistemas agrícolas.

O futuro da proteção de cultivos reside, em grande parte, na nossa capacidade de superar desafios e transformar a maneira como concebemos e praticamos a agricultura.

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Referências 

BARZMAN, M.; BÁRBERI, P.; BIRCH, A.N.E.; BOONEKAMP, P.; DACHBRODT-SAAYDEH, S.; GRAF, B.; HOMMEL, B.; JENSEN, J.E.; KISS, J.; KUDSK, P.; LAMICHHANE, J.R.; MESSÉAN, A.; MOONEN, A.C.; RATNADASS, A.; RICCI, P.; SARAH, J.L.; SATTIN, M. Eight principles of integrated pest management. Agronomy Sustainability Development. V. 35, p. 1199-1215, 2015. DOI: 10.1007/s13593-015-0327-9

DEGUINE, J.P.; AUBERTOT, J.N.; FLOR, R.J.; LESCOURRET, F.; WYCKHUYS, K.A.G.; RATNADASS, A. Integrated pest management: good intentions, hard realities. A review. Agronomy for Sustainable Development. V. 41, 38 (2021). DOI: 10.1007/s13593-021-00689-w.

 

Sobre a autora:

Beatriz Nastaro Boschiero

Beatriz Nastaro Boschiero

Especialista em MKT de Conteúdo na Agroadvance

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