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Mosca branca (Bemisia tabaci): mais de 600 espécies vegetais sob ataque

Quais culturas a mosca branca ataca?

A mosca branca (Bemisia tabaci) é uma espécie polífaga com grande capacidade de se adaptar a novos hospedeiros e a novas condições climáticas, atacando diversas culturas em todo o mundo, embora desenvolva-se melhor em climas quentes e úmidos (Figura 1). 

É considerada mundialmente como uma das principais pragas agrícolas, sendo que existem mais de 600 espécies vegetais já relatadas como hospedeiras da mosca branca. 

Distribuição geográfica de B. tabaci, atualizado em 19/01/2023 pela Organização Europeia de Proteção às Plantas (EPPO). Fonte: EPPO, 2023.  

Figura 1. Distribuição geográfica de B. tabaci, atualizado em 19/01/2023 pela Organização Europeia de Proteção às Plantas (EPPO). Fonte: EPPO, 2023.  

O que atrai a mosca-branca?

A mosca-branca é atraída pela presença de tecidos vegetais tenros e ricos em nutrientes, como o floema, de onde suga a seiva vegetal para se alimentar. Mais de 600 espécies vegetais são hospedeiras da mosca-branca, onde incluem-se culturas anuais importantes como algodão, soja, feijão, além de espécies olerícolas e frutíferas.

O que a mosca branca pode causar? 

A mosca-branca é um inseto sugador que causa danos extensos ao se alimentar diretamente das plantas. Existem dois tipos de danos causados pela mosca branca (HOROWITZ et al., 2022): 

  • Danos diretos: ao se alimentar da seiva do floema, o inseto excreta mela nas folhas e frutos, que forma um substrato para o crescimento de fuligem negra que mancha das folhas, prejudica a fotossíntese e reduz a qualidade dos frutos.  
Folha de soja atacada por mosca-branca

 

Figura 2. Folha de soja atacada por mosca-branca. Foto: Embrapa 

 

Em algodão, por exemplo, a mela pode causar pegajosidade da fibra que interfere no processo de fiação nas fábricas têxteis e reduz muito o valor do produto.

 Danos indiretos: é vetor de mais de 100 vírus de plantas, e em alguns casos, doenças virais são fatores limitantes de crescimento e pode causar a perda total da colheita. 

Sintoma do vírus do mosaico do feijoeiro transmitido pela mosca-branca

 

Figura 3. Sintoma do vírus do mosaico do feijoeiro transmitido pela mosca-branca. Foto: 3rlab 

 

O vírus do enrolamento da folha de algodão (CLCV) é uma das principais doenças do algodoeiro na Ásia e na África, e o vírus do enrolamento da folha amarela do tomate (TYLCV) está entre os vírus mais prejudiciais que prejudicam culturas de tomate em todo o mundo. 

  

Mosca branca Bemisia tabaci ocorrência no Brasil: Biótipo B e Biótipo Q 

Bemisia tabaci (Hemiptera: Aleyrodidae) é conhecida por sua diversidade genética e é considerada um complexo de biótipos, com pelo menos 44 biótipos, dentre as quais as espécies:

  • Oriente Médio-Ásia Menor 1 (MEAM1), também conhecido como biótipo B, e
  • Mediterrâneo (MED), também conhecido como biótipo Q, têm maior importância em todo o mundo (HOROWITZ et al., 2022; SANTANA et al., 2022). Ambas estão presentes no Brasil, como veremos a seguir:

Biótipo B – primeiros relatos no país são de 1989 e 1990. É o biótipo de maior abrangência nas lavouras – possui alta fecundidade com capacidade de dispersão a longas distâncias. 

Biótipo Q – Biótipo mais recente (relatado no país em 2013/2014) e com alta capacidade de infestação e alta tolerância a inseticidas convencionais.  

 É importante ressaltar que mesmo que cada biótipo apresente um comportamento característico, a diferenciação dos biótipos só é possível com a utilização de métodos moleculares, já que eles são visualmente idênticos! 

 

Dispersão da mosca branca no Brasil a partir dos primeiros registros do Biótipo B 

Os primeiros registros da introdução da mosca-branca (Bemisia Tabacci) do biótipo B no Brasil são de 1989, no estado do Rio de Janeiro e de 1990 no Ceará.  Estudos indicam que essas duas introduções foram independentes e juntas foram responsáveis pela invasão completa do Brasil com o biótipo B, em apenas 30 gerações (Figura 2). 

As previsões de expansão demográfica para fora do Rio de Janeiro (primeiro a ocorrer no Brasil) indicaram que o biótipo B provavelmente se dispersou para o oeste, sem impedimentos, a uma taxa de velocidade de 200-500 km/ano, atingindo São Paulo em apenas 15 gerações em 1990 (Fonte: PAREDES-MONTERO et al., 2022). 

 

Simulações SPLATCHE da expansão demográfica do biótipo Bemisia tabaci B no Brasil.

Figura 4. Simulações SPLATCHE da expansão demográfica do biótipo Bemisia tabaci B no Brasil. Mapas esquerdo-superior, médio e inferior mostram a expansão simulada do biótipo B do Rio de Janeiro após 15 gerações, utilizando parâmetros demográficos mínimos, médios e máximos, respectivamente. Mapas direita-superior, médio e inferior mostram a expansão simulada do biótipo B do Rio de Janeiro após 30 gerações utilizando parâmetros demográficos mínimos, médios e máximos, respectivamente, e do Ceará após 15 gerações (Fonte: PAREDES-MONTERO et al., 2022). 

 

Atualmente o biótipo B é o mais comum no país e o mais disperso no mundo, tendo mais de 500 espécies de plantas hospedeiras, alta fecundidade e capacidade de dispersão a longas distâncias. 

 

Introdução da mosca branca Bemisia tabaci Biótipo Q no Brasil 

Espécies mediterrâneas de mosca-branca (biótipo Q) foram introduzidas no Brasil em 2013/2014 no Rio Grande do Sul.

Desde então vem se espalhando pelo país, já sendo presente nos estados do Sul, em São Paulo e também em Goiás, o que aumentou os danos causados pela mosca-branca no país, principalmente para as principais lavouras como tomate, soja, feijão e algodão (SANTANA et al., 2022).  

O biótipo Q é motivo de grande preocupação, pois possui alta capacidade de desenvolver resistência à maioria dos inseticidas que são eficientes para controle de mosca-branca, o que tem atraído a atenção dos agricultores e de toda a comunidade científica.   

 

Condições favoráveis à infestação por mosca-branca

Períodos secos e quentes favorecem o desenvolvimento e a dispersão da praga, sendo, por isso, observados maiores picos populacionais da B. tabaci na estação seca. 

 

Resistência a inseticidas 

De acordo com Mota-Sanchez e Wise (2019) (Arthropod Pesticide Resistance Database, Michigan State University), existem até agora aproximadamente 650 casos relatados de resistência a inseticidas no gênero Bemisia, e a resistência foi detectada para mais de 60 ingredientes ativos.  

De modo geral, a resistência em insetos pode surgir de diferentes maneiras (Figura 5): 

  • Resistência metabólica: Insetos resistentes podem desintoxicar ou destruir a toxina mais rapidamente do que os suscetíveis. É o mecanismo mais comum de resistência. 
  • Resistência no local de ação: o alvo onde o inseticida atua sobre o inseto pode sofrer alguma modificação que impeça sua união, reduzindo ou eliminando seu efeito 
  • Resistência à penetração de inseticidas: insetos resistentes podem absorver o inseticida mais lentamente devido a uma cutícula externa com barreiras que atrasam sua penetração 
  • Resistência devido ao comportamento: insetos resistentes podem detectar o perigo e evitar a ação da toxina. Os insetos param de se alimentar ou se movem para áreas da planta ou lote onde o inseticida não está presente. 

 

Os mecanismos de resistência em B. tabaci são semelhantes ao que ocorrem para a maioria dos insetos, sendo principalmente a via metabólica, que impulsiona os níveis de enzimas de desintoxicação ou por mutações pontuais resultando em resistência no local-alvo. 

Ilustração dos mecanismos associados com o desenvolvimento de resistência a inseticidas. Fonte: IRAC Argentina. 

 

Figura 5. Ilustração dos mecanismos associados com o desenvolvimento de resistência a inseticidas. Fonte: IRAC Argentina. 

 

Bemisia tabaci desenvolveu resistência a inseticidas da maioria das classes químicas e essa resistência também está ligada aos biótipos de mosca-branca.

Apesar de ambos os biótipos desenvolverem resistência a inseticidas, quando comparadas verifica-se que o biótipo Q desenvolveu mais resistência a mais inseticidas em comparação com o biótipo B. 

Entre as espécies crípticas comuns, o biótipo Q é considerado mais resistente que o biótipo B a inseticidas como piriproxifeno e neonicotinoides; no entanto, nos últimos anos, existem outras espécies de Bemisia do biótipo B, incluindo MEAM1, Ásia I e Ásia II-1 que desenvolveram altos níveis de resistência a vários grupos de inseticidas (HOROWITZ et al., 2022). 

 

Controle da mosca-branca 

A melhor ferramenta de prevenção e controle da B. tabaci é o Manejo Integrado de Pragas (MIP), que possui etapas planejadas e executadas no momento correto, com o intuito de quebrar o ciclo da praga, diminuindo a população das gerações futuras e reduzindo as migrações para culturas subsequentes.  

Isso porque aplicações de inseticidas em exagero aumenta a pressão de seleção de biótipos mais resistentes, favorecendo o estabelecimento dela nas lavouras. O melhor manejo é o monitoramento da lavoura, com aplicações de inseticida somente quando a infestação atingir o nível de dano econômico.

No vídeo a seguir, o professor Dr. Ancidériton Castro explica os conceitos bases do Manejo Integrado de Pragas:
https://youtu.be/bILj3EVbziU
A base do MIP (Figura 6) é o monitoramento das lavouras, sendo este o responsável para qualquer tomada de decisão de controle.

Como a mosca-branca pode ocorrer desde a emergência até o final do ciclo das culturas, o monitoramento deve ser feito durante todo o ciclo da cultura no campo. Para avaliar a média de infestação por planta, é necessário fazer a contagem dos indivíduos presentes nos folíolos, que em sua maioria estão presentes no terço médio da planta.  

 


Figura 6. Componentes do Manejo Integrado de Pragas adaptado de Gallo et al. 2002) 

 

Para amostragem e identificação, a parte inferior das folhas deve ser inspecionada cuidadosamente para detectar diferentes estágios de vida da praga (ovos, larvas, pupas) ou sinais de mela (EPPO, 2023).

Além das observações diretas sobre plantas, o uso de armadilhas pegajosas amarelas para o monitoramento de moscas brancas pode ser realizado. 

Além disso, de acordo com Horrowitz et al. (2022) existem vários componentes dos programas de Manejo Integrado de Pragas (MIP) e do Manejo de Resistência a Inseticidas (MRI) aplicáveis à gestão da resistência em B. tabaci, como: 

  • Controle químico com inseticidas seletivos,  
  • Rotação dos princípios ativos de inseticidas 
  • Uso de misturas de inseticidas,  
  • Reduzir a aplicação de inseticidas químicos com auxílio de métodos de controle não químicos usando IPM práticas (por exemplo, controle biológico, resistência de plantas cultivadas e métodos físicos/mecânicos).  

Espera-se que a integração desses métodos contribua para melhorar o manejo da mosca branca, ajudando assim a garantir os rendimentos sustentáveis no futuro. 

Referências consultadas 

EPPO (2023) Bemisia tabaci. EPPO datasheets on pests recommended for regulation. https://gd.eppo.int (accesso em 14/03/2023). 

Horowitz, A.R.; Ghanim, M.; Roditakis, E.; Nauen, R.; Ishaaya, I. Insecticide resistance and its management in Bemisia tabaci species. Journal of Pest Science, 2022. https://doi.org/10.1007/s10340-020-01210-0 

IRAC Argentina. Disponível em: https://irac-argentina.org/resistencia/. Acesso em 14/03/2023. 

Mota-Sanchez D, Wise JC (2019) The arthropod pesticide resistance database. Michigan State University. https://www.pesticideresistance.org 

Paredes-Montero, J.R.; Rizental, M.; Quintela, E.D.; Abreu, A.G.; Brown, J.K. Earlier than expected introductions of the Bemisia tabaci B mitotype in Brazil reveal an unprecedented, rapid invasion history. Ecology and Evolution. V. 22, e8557, 2022. DOI: 10.1002/ece3.8557 

Santana, A.S.; Baldin, E.L.L.; Lima, A.P.S.; Santos, T.L.B.; Santos, M.C.; Vieira, T.M.; Crotti, A.E.M.; Takeara, R. New challenges demand new solutions: Selected essential oils as an alternative to control Bemisia tabaci MED in Brazil. Crop Protection, v. 155, 105909, 2022. DOI: 10.1016/j.cropro.2022.105909 

 Sobre a autora:

Beatriz Nastaro Boschiero

Beatriz Nastaro Boschiero

Especialista em MKT de Conteúdo na Agroadvance

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