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Deficiência de cálcio nas plantas: 5 processos morfológicos e fisiológicos afetados

A deficiência de cálcio nas plantas afeta vários processos morfológicos e fisiológicos, que vão desde a formação estrutural de brotos e raízes até a baixa qualidade de frutos e vegetais produzidos.

Os sintomas visuais da deficiência de nutrientes nas plantas são o estopim de uma série de processos desencadeados na planta, assim como já mostramos em artigos anteriores para a deficiência de magnésio nas plantas.

Acompanhe este artigo para entender os processos que ocorrem na planta e que causam os sintomas de deficiência de cálcio nas plantas.

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Funções do cálcio na planta

O cálcio tem dois papeis fundamentais nas plantas:

  • como elemento estrutural: formando parede celular, a parte externa das membranas celulares e as organelas celulares – maior parte do cálcio presente na planta.
  • na sinalização celular: atua traduzindo, integrando e multiplicando os sinais recebidos – ligando assim os estímulos ambientais com as respostas fisiológicas das plantas.

O cálcio é praticamente imóvel no floema, ou seja, há uma translocação muito limitada de cálcio das partes velhas da planta (órgãos fonte) para folhas jovens, brotos e frutos (órgãos dreno).

Com isso, todo o cálcio direcionado para os tecidos em crescimento na planta dependem do xilema, ou seja, precisam ser absorvidos pelas raízes no momento da demanda.  

Sintomas de deficiência de cálcio nas plantas

Os principais sintomas de deficiência de cálcio nas plantas incluem:

  • Limitação de crescimento do sistema radicular, além de raízes escuras e apodrecidas;
  • Lesões necróticas nas margens e pontas das folhas, nervuras acastanhadas e deformidades foliares – que podem evoluir para a morte apical sob deficiência contínua;
  • Dificulta a germinação do grão de pólen;
  • Abortamento das flores;
  • Afeta a formação de frutos. Exemplos:
    • Podridão apical em tomate, pimentão e abobrinha, em que aparecem caroços necróticos afundados no final da floração dos frutos.
    • Bit amargo na maçã: a casca da fruta desenvolve caroços e que manchas marrons aparecem na pele e/ou na carne, resultando em sabor amargo
Deficiência de cálcio nas plantas
Sintomas de deficiência de cálcio: (a) Raízes marrons e em desintegração na cevada. (b) Placas necróticas de apodrecimento da extremidade da flor em tomate. Fonte: Bang et al. (2021)

E quais os processos morfológicos e fisiológicos ocorrem nas plantas sob deficiência de cálcio e que resultam nesses sintomas? Vejamos abaixo:

Respostas morfológicas e fisiológicas da deficiência de cálcio nas plantas

Todas as respostas morfológicas e fisiológicas desencadeadas a partir da deficiência de cálcio nas plantas apresentadas aqui, estão listadas e explicadas em artigo de Bang et al., 2021 publicado na revista New Phytologist.  

Modelo esquemático mostrando como a deficiência de cálcio nas plantas afeta o crescimento e a fisiologia.

Figura 1. Modelo esquemático mostrando como a deficiência de cálcio nas plantas afeta o crescimento e a fisiologia da planta. Fonte: Bang et al. (2021).

Elemento estrutural em brotos e raízes

O cálcio é responsável pela rigidez e estabilidade da parede celular das plantas. E como isso ocorre?

Durante a biossíntese da parede celular o cálcio se liga aos grupos carboxila, provenientes da conversão dos ésteres metílicos pela enzima pectina metilesterase. Essa ligação ocorre por meio de forças covalentes e iônicas, que proporcionam a estabilidade e integridade às estruturas das paredes celulares.

Cerca de 60 a 75% do cálcio da planta se encontra ligados à pectinas da parede celular.

Quando associado ao cálcio, a parede celular é protegida da degradação da enzima poligalacturonases (pectina depolimerase).

Além do sistema da parede celular, o Ca2+ estabiliza as membranas celulares por meio da formação de pontes com grupos fosfato e carboxilato em lipídeos e proteínas.

O Ca também desempenha um papel essencial na regulação do citoesqueleto de microtúbulos (MT) mediado pela família IQ67 DOMAIN (IQD) específica da planta em interação com a sinalização de Ca dependente de calmodulina (CaM).

A deficiência de cálcio nas plantas, portanto, leva ao aumento da permeabilidade da membrana plasmática, resultando em morte celular no meristema apical e interrupção do crescimento.

Transdução de sinal da parte aérea e raízes

Os estímulos vegetais são detectados por diferentes receptores de membrana, que desencadeiam perturbações transitórias na concentração de íons cálcio (Ca2+) livres no citosol.

Essas alterações nos influxos de cálcio são mediadas por:

  • canais controlados por nucleotídeos cíclicos (CNGCs),
  • homólogos do receptor ionotrópico de glutamato (GLRs),
  • Proteínas de atividade complementadora mid1 (MCAs), e
  • canais catiônicos controlados por estresse permeáveis ao cálcio (CSCs)/ hiperosmolaridade reduzida – induzidos pelo aumento da [Ca2+] nos canais (OSCAs).

As Ca2+-ATPases mediam a remoção do Ca2+ do citosol via efluxo ou sequestro em diferentes organelas (retículo endoplasmático, aparelho de Golgi e plastídios).

O Ca2+ também pode ser sequestrado no vacúolo por Ca2+-ATPases ou Ca2+Trocadores /H (CAXs), este último acionado por ATP ou pirofosfato (PPi). Ca+2+ é liberado do vacúolo via canais permeáveis de Ca2+.

Quando ocorrem mudanças na concentração de cálcio dentro da célula (citosol), desencadeia-se uma sequência de processos, que são controlados por sensores específicos. Esses sensores incluem as calmodulinas (CaM) e proteínas semelhantes à CaM.

Por sua vez, esses sensores ativam uma resposta em cadeia envolvendo proteínas quinases dependentes de cálcio (CPKs/CDPKs) e proteínas semelhantes à calcineurina B (CBL).

Essas proteínas atuam controlando a atividade das proteínas quinases que interagem com a CBL (CIPKs).

Em resumo, essa cascata de eventos é responsável por transmitir e regular os sinais relacionados às alterações de concentração de cálcio no citosol.

Vários fatores externos, como luz, temperatura e infecção por patógenos, em combinação com sinais hormonais internos, são percebidos através pelos receptores de membrana, levando a padrões espaço-temporais específicos de aumento da concentração do Ca2+ no citosol que desencadeiam essa cascata de processos.

Em condições de deficiência de cálcio nas plantas todos esses eventos sessam e a planta não consegue estabelecer suas sinalizações internas adequadamente.

Detecção de nutrientes

A alterações na disponibilidade externa de nutrientes afeta a concentração de Ca2+ no citosol, o que, por sua vez, ativa ou reprime os transportadores de outros nutrientes por meio da via CBL-CIPK dependente de Ca2+.

Especificamente, a CIPK23 ativa os transportadores ou canais para K+ (HAK5, AKT1/AtKC1), NO3 (NRT1.1/NPF6. 3) e Fe2+ (IRT) em situação de deficiência nutricional. Assim, K+, NO3 e Fe2+ tem sua absorção estimulada na deficiência de cálcio.

Por sua vez, a CIPK23 inibe o transporte de NH4+ via AMT1;2 em resposta ao alto NH4+.

A deficiência de fósforo nas plantas, por sua vez, pode afetar negativamente as oscilações na concentração citosólicas de Ca2+ causada por estresse mecânico, salino, osmótico e oxidativo.

Através do seu papel na sinalização e estabilização das paredes e membranas celulares, o Ca também desempenha um papel crucial para o crescimento e adaptação das raízes.

Estudos indicam que gradientes e oscilações na concentração de Ca2+ desempenham um papel fundamental no crescimento dos pelos radiculares, bem como no estabelecimento de associações simbióticas (BANG et al., 2021).

Translocação

A concentração de cálcio no floema é muito baixa.

A translocação de Ca da raiz para a parte aérea é, portanto, determinada pela concentração de Ca no xilema e pelo fluxo de seiva do xilema relacionado à transpiração e à pressão radicular, expansão e transpiração.

O fluxo de seiva do xilema para os frutos é afetado pelo desenvolvimento dos vasos do xilema, diâmetro dos vasos e conectividade.

O cálcio está ligado nas paredes celulares do xilema e em fossas intervasculares, onde a desesterificação da pectina permite a formação de géis reticulados de cálcio que afetam a porosidade da fossa, o fluxo do xilema e a distribuição de cálcio. – assim a deficiência de cálcio nas plantas afetará todos esses processos.

Provavelmente também pode haver algum transporte de cálcio no floema em frutas onde a disfunção do xilema ocorre no início do desenvolvimento da fruta.

Baixa qualidade de frutos e vegetais

A deficiência de cálcio nas plantas afeta negativamente a formação de frutos e vegetais na planta. Alguns exemplos são: podridão apical em tomate e pimentão, queimadura em alface e bit amargo na maçã.

Durante o crescimento vegetal o cálcio do solo é direcionado para os locais de maior demanda transpiratória (as folhas) – uma vez que se move predominantemente pelo xilema.

Por isso, o cálcio não chega em teores adequados aos frutos, o que causa um distúrbio fisiológico na planta. Como resultado há a morte de um grupo de células nos frutos em expansão.

Essa morte celular ocorre devido a baixa estabilidade da parede celular e torna o tecido vegetal mais susceptível a infecções secundárias causadas por patógenos oportunistas (como os fungos).

Conclusões 

O cálcio é um elemento fundamental para estabilidade celular e sinalização na planta. A deficiência de cálcio nas plantas afeta justamente essas duas principais funções na planta, resultando em redução do crescimento e morte dos tecidos vegetais (brotos e raízes).

Por ter baixa mobilidade no floema sua distribuição depende exclusivamente do xilema. Ou seja, os nutrientes são distribuídos das raízes para os órgãos em crescimento.

Como os frutos apresentam menor intensidade respiratória que as folhas, são normalmente os órgãos mais afetados pela deficiência de cálcio.

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Referências 

Bang, T. C., Husted, S., Laursen, K. H., Persson, D. P., & Schjoerring, J. K. The molecular‐physiological functions of mineral macronutrients and their consequences for deficiency symptoms in plants. New Phytologist, v. 229, p. 2446-2469, 2021. https://doi.org/10.1111/nph.17074

 

Sobre a autora:

Beatriz Nastaro Boschiero

Beatriz Nastaro Boschiero

Especialista em MKT de Conteúdo na Agroadvance

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