Inúmeros são os benefícios do cultivo de Crotalaria spp. na rotação de culturas, dentre os quais destacam-se:
- Alta produção de biomassa,
- Acúmulo de nitrogênio,
- Ciclagem de nutrientes,
- Ação antagônica sobre alguns nematoides.
A utilização dessas leguminosas não só melhora a estrutura e a fertilidade do solo, como também ajuda a combater pragas, e reduzir a incidência de nematoides nas lavouras, promovendo uma agricultura mais sustentável e produtiva.
No entanto, com várias espécies disponíveis, é fundamental conhecer as características específicas de cada uma para aproveitar ao máximo seus benefícios.
Neste artigo, vamos detalhar as quatro principais espécies de crotalária utilizadas no Brasil: C. spectabilis, C. juncea, C. ochroleuca e C. breviflora. O objetivo é fornecer um guia completo que ajude você a escolher a crotalária mais adequada para suas necessidades, ajudando maximizando os ganhos em produtividade e sustentabilidade em sua propriedade agrícola.
Boa leitura!
Tipos de crotalárias
Espécies de crotalária são arbustos anuais, pertencentes à família Fabaceae, muito úteis na agricultura, tanto como adubo verde como plantas de cobertura. Elas também são usadas como fonte de alimentação para o gado.
Caracterizam-se por um rápido crescimento vegetativo, altos níveis de produção de biomassa e extração de nutrientes, bem como pela capacidade de se adaptar bem a condições de baixa fertilidade do solo.
Algumas das principais espécies utilizadas são:
- Crotalaria juncea
- Crotalaria spectabilis
- Crotalaria ochroleuca
- Crotalaria breviflora
Vejamos, a seguir, na Tabela 1, algumas características de cada espécie:
Tabela 1. Características das 4 principais espécies de crotalárias
Característica | Crotalaria juncea | Crotalaria breviflora | Crotalaria ochroleuca | Crotalaria spectabilis |
Altura da planta (m) | 2,0 a 3,0 m | 0,8 a 1,0 m | 1,5 a 2,0 m | 1,0 a 1,5 m |
Florescimento | 70 a 130 dias | 90 a 100 dias | 120 a 135 dias | 110 a 140 dias |
Ciclo | 170 a 180 dias | 150 a 160 dias | 175 a 190 dias | 170 a 180 dias |
Biomassa verde (t/ha) | 35-60 t/ha | 15-20 t/ha | 20-30 t/ha | 20-30 t/ha |
Massa seca (t/ha) | 10-15 t/ha | 3-5 t/ha | 7-10 t/ha | 4-6 t/ha |
Fornecimento médio de nutrientes ao solo com a decomposição da palhada | 350 kg/ha de N 35 kg/ha de P 200 kg/ha de K 60 kg/ha de Ca 30 kg/ha de Mg | 96 kg/ha de N 7 kg/ha de P 60 kg/ha de K 40 kg/ha de Ca 5 kg/ha de Mg | 200 kg/ha de N 18 kg/ha de P 100 kg/ha de K 35 kg/ha de Ca 25 kg/ha de Mg | 220 kg/ha de N 24 kg/ha de P 220 kg/ha de K 65 kg/ha de Ca 28 kg/ha de Mg |
Crotalaria juncea
A Crotalaria juncea, originária da Índia, é frequentemente utilizada no Brasil para adubação verde, destacando-se pela rápida produção de biomassa e eficiente fornecimento de nitrogênio ao solo. Além de contribuir para o controle de erosão e plantas daninhas, essa espécie apresenta uma alta tolerância à seca, embora seja sensível ao encharcamento e umidade excessiva.
Aplicações:
- Rotação de Culturas: Alternativa vantajosa durante a primavera-verão para culturas anuais e semiperenes como a cana-de-açúcar.
- Cultura de Cobertura: Utilizada em sistemas conservacionistas para controle da erosão.
- Adubo Verde: Enriquece o solo com nitrogênio e outros nutrientes.
- Consórcio: Pode ser cultivada com cultivos perenes como citros e café, protegendo as entrelinhas do solo da chuva e reduzindo os riscos de erosão, especialmente nos primeiros anos de implantação do pomar ou lavoura.
Características Destacadas:
- Crescimento Rápido: Tanto do sistema radicular quanto da parte aérea.
- Tolerância à Seca: Adaptada a condições de baixa umidade, mas sensível ao encharcamento.
- Controle de Erosão: Favorece a agregação do solo e reduz os impactos da chuva.
No período de plantio da cultura principal, a crotalária pode ser dessecada ou picada, permitindo o plantio direto sobre a palhada. Isso mantém a entrelinha coberta, minimizando enxurradas e beneficiando a cultura subsequente com uma palhada abundante.
Crotalária Spectabilis
Originária das Américas do Sul e do Norte, a Crotalaria spectabilis, também conhecida como guizo-de-cascavel e chocalho-de-cascavel, é uma leguminosa anual típica de primavera-verão. Destaca-se por sua eficácia na redução da população de nematoides, especialmente os de galhas, cistos e lesões radiculares. Além disso, essa espécie apresenta uma excelente capacidade de fixação biológica de nitrogênio e produz uma alta quantidade de massa verde.
É adaptada a climas tropicais e subtropicais, mas não tolera geadas. Requer precipitação anual acima de 800 mm. Apresenta alta tolerância à seca e baixa tolerância ao encharcamento.
Aplicações:
- Controle de Nematoides: Utilizada para reduzir a população desses parasitas em lavouras comerciais, sendo especialmente eficaz no consórcio com milho durante a segunda safra.
- Cultivo com culturas Perenes: Pode ser plantada nas entrelinhas de culturas perenes devido ao seu porte médio, sem prejudicar o trânsito de máquinas ou pessoas.
Indicações de Uso:
- Áreas Infestadas com nematoides: Recomendada para áreas com infestação significativa de nematoides de galhas ou lesão, onde há perda de produtividade acentuada.
- Quebra de Ciclo: Utilizada para interromper o ciclo de pragas, doenças e plantas invasoras.
- Pós-Colheita: Indicada para áreas após a colheita de culturas de verão, visando manter o solo coberto e evitar a erosão.
- Consórcio com Milho: Ideal para consorciar com a cultura do milho, adaptando-se bem às condições da entrelinha da cultura. O plantio da C. spectabilis ocorre junto à adubação de cobertura, quando o milho já está estabelecido no estágio V2 a V3.
Essas características fazem da Crotalaria spectabilis uma opção versátil e eficiente para melhorar a saúde do solo e a produtividade agrícola em diversas condições de cultivo.
Crotalaria ochroleuca
Originária da África, a Crotalaria ochroleuca é uma leguminosa anual de primavera-verão com crescimento determinado, arbustivo e de hábito ereto. Com caule semi-lenhoso e altura que pode atingir até 2,0 m, essa espécie destaca-se por sua rusticidade e tolerância ao déficit hídrico. Suas raízes vigorosas têm a capacidade de romper camadas adensadas do solo, tornando-a ideal para áreas com menor potencial produtivo.
Indicações de Uso:
- Rotação de Culturas: Possui elevado potencial para entrar em rotações como cultura de verão, sendo especialmente útil em semeaduras tardias e colheitas atrasadas.
- Controle de Nematoides: Destaca-se pelo bom controle de fitonematoides como Meloydogine incognita, Rotylenchulus reniformis e Pratylenchus brachyurus.
- Recuperação dos Solos: Utilizada em áreas de recuperação de solos degradados e em sistemas de renovação de canaviais devido ao seu alto potencial de biomassa e estabilização dos agregados do solo.
- Intercalação com Culturas Perenes: Pode ser facilmente intercalada com culturas perenes, auxiliando na quebra do ciclo de pragas e aumentando a biodiversidade do solo.
Com suas características únicas, a Crotalaria ochroleuca oferece uma opção versátil para melhorar a saúde do solo, reduzir os riscos de erosão e aumentar a produtividade agrícola em diversas condições de cultivo.
Crotalaria breviflora
A Crotalaria breviflora destaca-se por não ser hospedeira dos fitonematoides Meloydogine incognita e Rotylenchulus reniformis.
Indicações de Uso:
- Com culturas Perenes: Amplamente utilizada nas entrelinhas de culturas perenes, especialmente o cafeeiro, como cobertura vegetal devido ao seu porte baixo e hábito não trepador. Sua rápida taxa de crescimento inicial controla efetivamente as ervas daninhas e fornece nitrogênio para a cultura consorciada por meio da fixação simbiótica.
- Melhoria da Fertilidade do Solo: Contribui para a melhoria da fertilidade do solo e da produtividade das culturas, tanto em cultivo isolado quanto em cultivo intercalar com culturas perenes.
- Reforma de Canaviais: Utilizada na reforma de canaviais ou em rotação com culturas graníferas para melhorar a saúde do solo e aumentar a produtividade.
- Indústria de Papel: Suas fibras de celulose de alta qualidade a tornam uma opção viável para a indústria de papel.
A versatilidade da Crotalaria breviflora a torna uma escolha popular para uma variedade de aplicações agrícolas, desde a melhoria da fertilidade do solo até o controle de ervas daninhas e a produção de fibras de celulose para a indústria de papel.
Qual a época de plantar a crotalária?
A crotalária é uma espécie de primavera e verão.
De modo geral, a época ideal para seu plantio é no período chuvoso, que vai de outubro a novembro nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste do Brasil (especialmente no Cerrado). Para a Crotalaria juncea o plantio pode ser antecipado para setembro.
A crotalária também pode ser plantada em época tardia, na segunda safra, com o plantio podendo ser realizado de dezembro a fevereiro (ou até março, para C. juncea e C. ochroleuca). A Crotalaria breviflora é a espécie mais restritiva ao plantio tardio, e quando este ocorrer o recomendado é que seja feito no período de dezembro a janeiro (ainda assim com algumas restrições de locais).
Modo de plantio, espaçamento e profundidade
A crotalária pode ser plantada em linhas ou à lanço. Em ambos os casos o preparo de solo é o mesmo realizado para receber a cana-de-açúcar. Além disso, o cultivo pode ser solteiro, ou em consórcio com gramíneas forrageiras.
Para o plantio em linha, o espaçamento de semeadura recomendado varia de 25 a 50 cm e quantidade de sementes varia de 10 a 40 kg/ha, dependendo a espécie. A profundidade ideal de semeadura deve ser de 2 cm a 3 cm.
Para o plantio a lanço, a quantidade de sementes varia de 12 a 50 kg/ha, dependendo da espécie, que devem ser cobertas com solo após o lanço.
Vejamos abaixo a especificação para cada uma delas:
- Crotalaria juncea:
- Em linha: 25 a 40 sementes/m, totalizando 25 a 40 kg/ha.
- Espaçamento entre linhas: 0,25 a 0,50 m.
- A lanço: 30 a 50 kg/ha de sementes, que devem ser cobertas com solo após o lanço.
- Crotalaria spectabilis:
- Em linha: 25 a 30 sementes/m, totalizando 12 a 15 kg/ha.
- Espaçamento entre linhas: 0,40 a 0,50 m.
- Lanço: 15 a 20 kg/ha.
- Crotalaria ochroleuca
- Em Linha: 40 a 45 sementes/m, totalizando 10 kg/ha.
- Espaçamento entre linhas: 0,5 m
- Lanço: 12 kg/ha.
- Crotalaria breviflora
- Em Linha: 15 a 20 kg/ha.
- Espaçamento entre linhas: 0,5 m
- Lanço: 25 kg/ha.
Como a crotalária controla nematoides?
As crotalárias controlam nematoides principalmente através de três mecanismos principais: interrupção do ciclo de vida dos nematoides, ação alelopática e promoção de inimigos naturais. Vejamos a seguir, o que ocorre em cada mecanismo:
1) Interrupção do ciclo de vida dos nematoides
A crotalária não é hospedeiras dos fitonematoides, e funcionam, portanto, como “plantas armadilhas”, impedindo esses parasitas de completarem o seu ciclo.
As crotalárias, como C. juncea e C. spectabilis, não são hospedeiras adequadas para muitos nematoides fitopatogênicos, como os das espécies Meloydogine e Rotylenchulus.
Os nematoides juvenis que eclodem no solo tentam infectar as raízes da crotalária, mas falham em completar seu ciclo de vida, o que leva à redução da população de nematoides no solo.
2) Ação alelopática
As crotalárias liberam compostos químicos através de suas raízes que são tóxicos para os nematoides. Essas substâncias, conhecidas como aleloquímicos, inibem o desenvolvimento e a reprodução dos nematoides no solo, diminuindo a infestação e protegendo culturas subsequentes.
3) Promoção de Inimigos Naturais
O cultivo de crotalárias pode favorecer a biodiversidade do solo, criando um ambiente propício para predadores naturais dos nematoides, como fungos e bactérias nematófagos. Esses organismos benéficos se alimentam dos nematoides ou competem com eles, ajudando a manter a população de nematoides em níveis baixos.
Crotalária e a fixação de nitrogênio
A fixação biológica de nitrogênio (FBN) é um processo fundamental para a agricultura sustentável, e a crotalária destaca-se por sua capacidade excepcional de formar nódulos radiculares e fixar nitrogênio atmosférico. Este processo é realizado em simbiose com bactérias do gênero Rhizobium, que colonizam as raízes da planta, formando nódulos onde ocorre a conversão do nitrogênio atmosférico (N₂) em amônia (NH₃), um composto que a planta pode assimilar diretamente.
Para ajudar neste processo é recomendado que as sementes da crotalária sejam inoculadas antes do plantio, assim como se faz com a soja, por exemplo. As quantidades de nitrogênio fixadas por cada espécie já foram apresentadas na Tabela 1.
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Conclusão
A utilização das diferentes espécies de crotalária, como C. spectabilis, C. juncea, C. ochroleuca e C. breviflora, oferece uma gama de benefícios significativos para a rotação de culturas e manejo sustentável do solo. Essas leguminosas não apenas fornecem uma fonte natural de nutrientes, especialmente nitrogênio, mas também desempenham um papel crucial no controle de nematoides, melhorando a saúde do solo e a produtividade das culturas subsequentes.
A capacidade de formar nódulos e fixar nitrogênio atmosférico faz da crotalária uma excelente escolha para práticas de adubação verde, enquanto suas raízes vigorosas e ação alelopática contribuem para a interrupção do ciclo de vida dos nematoides. Além disso, a biomassa gerada pelas crotalárias melhora a estrutura do solo, reduzindo a erosão e promovendo a retenção de água.
Ao escolher a espécie de crotalária mais adequada para suas necessidades específicas, os agricultores podem maximizar os ganhos em produtividade e sustentabilidade em suas propriedades agrícolas. Este guia pretende ser uma ferramenta útil para essa escolha, ajudando a implementar práticas agrícolas mais sustentáveis e eficazes.
A integração estratégica da crotalária no sistema agrícola não só beneficia a produção imediata, mas também contribui para a longevidade e saúde do ecossistema agrícola, promovendo uma agricultura mais resiliente e ecológica.
Referências
BARBOSA, I.R.; SANTANA, R.S.; MAUAD, M.; GARCIA, R.A. Dry matter production and nitrogen, phosphorus and potassium uptake in Crotalaria juncea and Crotalaria spectabilis. Pesquisa Agropecuária Tropical, v. 50, 2020. DOI: 10.1590/1983-40632020v5061011.
CHERUBIN, M.R. (organizador). Guia prático de plantas de cobertura: aspectos filotécnicos e impactos sobre a saúde do solo [recurso eletrônico] / Martha Lustosa Carvalho … [et al.]; organização de Maurício Roberto Cherubin. – – Piracicaba : ESALQ-USP, 2022 126 p. : il. Disponível em: https://www.esalq.usp.br/biblioteca/pdf/Livro_Plantas_de_Cobertura_completo.pdf. Data de acesso: 07 de Jun. 2024.
Sobre a autora:
Beatriz Nastaro Boschiero
Especialista em MKT de Conteúdo na Agroadvance
- Pós-doutora pelo CTBE/CNPEM e CENA/USP
- Mestra e Doutora em Solos e Nutrição de Plantas (ESALQ/USP)
- Engenheira Agrônoma (UNESP/Botucatu)