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Novidades no uso de Azospirillum brasilense em 2 culturas: milho e cana-de-açúcar

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Azospirillum é um gênero de uma bactéria Gram-negativa, microaerofílica, não fermentativa e fixadora de nitrogênio.  

É uma das bactérias promotoras do crescimento de plantas mais estudadas no mundo desde sua descoberta por Martinus Beijerinck na Holanda em 1925.  

No entanto, como resultado da pesquisa realizada por Johanna Döbereiner no Brasil na década de 1970, duas principais características são usadas para definir as bactérias do gênero Azospirillum 

  • a capacidade de fixar nitrogênio atmosférico (N2) 
  • a capacidade de produzir vários fitohormônios que melhoram o desenvolvimento do sistema radicular das plantas. 

Como o Azospirillum ajuda no crescimento das plantas? 

As plantas fornecem nutrientes para as bactérias, enquanto o Azospirillum pode:

  • promover a síntese de fitohormônios – como auxinas, citocininas e giberelinas que aumentam a proliferação do sistema radicular das plantas, além de
  • alterações positivas em metabólitos secundários que ajudam a planta a tolerar estresses o hídrico e promove resistência ao ataque de patógenos (Figura 1). 
Efeito positivo do Azospirillum nas raízes das plantas.

Figura 1. Efeito positivo do Azospirillum nas raízes das plantas. IAA: ácido 3-indol-acético. ABA: ácido abscísico. Fonte: Traduzido de Rodrigues et al., 2015. 

 

O produto comercial desenvolvido e lançado pela Embrapa em 2009 e amplamente utilizado no Brasil para a cultura do milho e trigo, utiliza bactérias do gênero Azospirillum brasilense, estirpes Ab-V5 e Ab-V6 (Figura 2).

Estirpes Ab-V5 e Ab-V6 de Azospirillum brasilense

Figura 2. Estirpes Ab-V5 e Ab-V6 de Azospirillum. brasilense. Foto: Dra. Mariangela Hungria, Embrapa. 

 

A estirpe Ab-V5 contribui para a fixação de N e, embora essa fixação não seja tão elevada como a da soja, é capaz de suprir de 15 a 25% da demanda de N da planta.  

A estirpe Ab-V6, por outro lado, é uma alta produtora de fito hormônios – principalmente o ácido indolacético – que promove maior crescimento do sistema radicular do milho.

O maior crescimento de raízes, por sua vez, permite que as raízes explorem camadas mais profundas do solo, ampliando assim a área de absorção de água e nutrientes pelas plantas; o que resulta em plantas mais vigorosas e mais tolerantes à estresses bióticos e abióticos. 

Dentre os efeitos relatados como benéficos da utilização das estirpes Ab-V5 e Ab-V6, temos: 

  • Fixação biológica de Nitrogênio 
  • Promoção do crescimento das raízes (Figura 3) 
  • Maior expansão foliar e biomassa de plantas 
  • Melhor condutância estomática, tolerância a seca e salinidade 
  • Aumento no teor de clorofila e taxa fotossintética 
  • Aumento da absorção de macro e micronutrientes 
  • Aumento na resistência a patógenos 
  • Maior rendimento e índice de colheita 
Arquitetura radicular de plantas de milho com ou sem indução de nitrato e com ou sem inoculação com A. brasilense

Figura 3. Arquitetura radicular de plantas de milho com ou sem indução de nitrato e com ou sem inoculação com A. brasilense após 7 d de tratamento. Fonte: Pii et al., 2019.  

Utilização de A. brasilense em milho 

A utilização de Azospirillum em milho não é novidade e ocorre no Brasil desde 2009-2010, quando a Embrapa lançou comercialmente o primeiro inoculante para as culturas de milho e trigo.  

Ao longo dos anos a adoção da prática de inoculação em gramíneas vêm sendo cada vez mais implementadas pelos agricultores brasileiros, sendo que mais de 10 milhões de doses do inoculante contendo A. brasilense foram comercializadas no país em 2019 (Figura 4).  

Doses de inoculantes contendo cepas de Azospirillum brasilense Ab-V5 e Ab-V6 comercializadas no Brasil

Figura 4. Doses de inoculantes contendo cepas de A. brasilense Ab-V5 e Ab-V6 comercializadas no Brasil desde o lançamento do primeiro inoculante comercial. Fonte: Santos et al., 2021. 

 

Não é novidade, portanto que existem benefícios na utilização desse bioproduto. Contudo somente agora, mais de 10 anos depois, é que foi possível compilar vários resultados de pesquisas realizada ao longo de todo esse tempo e compreender claramente quais os benefícios do uso desse inoculante na cultura.   

Uma meta-análise de 103 experimentos realizados em 54 locais de 10 estados brasileiros mostrou que a inoculação de sementes de milho com Azospirillum promove:

  • aumento de 5,4% na produtividade de grãos,
  • aumento de 4,3% no teor de N na folha e
  • aumento de de 3,6% de N nos grãos, além de
  • um crescimento importantíssimos de 12,1% no crescimento das raízes das plantas (Figura 5). 
resposta do milho à inoculação com Azospirillum brasilense

Figura 5 – Meta-análise à resposta do milho à inoculação com A. brasilense: locais das avaliações e efeitos positivos da inoculação em alguns atributos do milho. Fonte: Adaptado de Barbosa et. al, 2022. 

 

As informações mais recentes publicadas pela Embrapa indicam para o produtor, que na prática, a inoculação de sementes de milho com a bactéria Azospirillum brasilense (estirpes Ab-V5 e Ab-V6) permite a redução de 25% da adubação nitrogenada de cobertura – considerando a dose de 90 kg por hectare de N-fertilizante – sem perdas de produtividade (Figura 6).

Redução na dose de nitrogênio em milho devido a inoculação com azospirillum

Figura 6. Rendimento de grãos de milho não inoculado e recebendo fertilizante 100% N (90 kg ha-1 de N) aplicado em cobertura aos 35 d após emergência, inoculadas com as cepas de A. brasilense Ab-V5 e Ab-V6 e recebendo adubação 75% N. Os dados representam as médias de seis réplicas e as barras indicam o desvio padrão. Na análise combinada, os dois tratamentos não foram estatisticamente diferentes (P = 0,76). Fonte: Traduzido de Hungria et al., 2022 

 

Ou seja, se o agricultor realizar a inoculação das sementes de milho com o Azospirillum e reduzir a adubação nitrogenada de cobertura em ¼ ele terá uma produção equivalente à utilização de 100% da adubação de cobertura. 

Além do ganho econômico gerado ao produtor devido a economia de fertilizantes nitrogenados, há também o ganho ambiental com redução nas emissões dos gases do efeito estufa (redução nas emissões de CO2 equivalente), que contribuem para a sustentabilidade da agricultura brasileira.   

 

Mas em que condições de clima e solo o Azospirillum é eficiente para o milho? 

Um conjunto de 30 experimentos de campo realizado ao longo de 10 anos mostrou que a inoculação de sementes de milho com Azospirillum aumentou o rendimento de grãos tanto em condições subtropicais como tropicais. Além disso, os benefícios foram observados tanto para produtividades abaixo como acima de 5.000 kg ha-1.

Os benefícios foram mais claramente observados em solos de textura argilosa e com maiores teores de carbono orgânico no solo (COS) do que em solo arenoso e com menor teor de COS, embora ambos também tenham sido beneficiados pela inoculação (Figura 7).  

Resposta à inoculação de milho com Azospirillum em diferentes condições ambientais

Figura 7 – Efeito da inoculação das cepas de A. brasilense Ab-V5 e Ab-V6 na produtividade de grãos de milho em função do clima, faixa de produtividade, textura do solo e teor de carbono orgânico do solo (COS). Os valores são médias ± intervalo de confiança (IC). O efeito é significativo quando o IC não se sobreponha a zero. Os dados são de 30 experimentos. Fonte: Traduzido de Hungria et al., 2022. 

 

Utilização do inoculante Azospirillum brasilense em cana-de-açúcar 

Existe apenas um inoculante comercial para a cultura da cana-de-açúcar no Brasil oriundo da espécie Nitrospirillum amazonense cepa BR 11145 (Santos et al., 2021).  A utilização de Azospirillum em cana-de-açúcar é feita basicamente a nível de pesquisa. 

Ainda assim, existem poucos estudos sobre a inoculação da cana-de-açúcar com cepas de A. brasilense Ab-V5 e Ab-V6, embora os resultados sejam promissores, principalmente por estimular o crescimento radicular (Figura 8).  

Raízes de cana inoculadas com Azospirillum

Figura 8. Raízes de cana-de-açúcar da variedade RB 93 5744 cultivadas em casa de vegetação, em solo arenoso e inoculadas ou não com as cepas de A. brasilense Ab-V5 e Ab-V6, com diferentes doses de N-mineral: (a) plantas não inoculadas cultivadas com 2 mg L-1 de N; (b) plantas não inoculadas cultivadas com 2 mg L-1 de N; (c) plantas inoculadas com Ab-V5 + Ab-V6 e recebendo 2 mg L-1 de N. Foto: Dr. Leopoldo Sussumu Matsumoto. Fonte: Santos et al., 2021. 

 

Um trabalho publicado agora no mês de março de 2023 na European Journal of Agronomy, mostrou que a inoculação da cana-de-açúcar com A. brasilense cepa Ab-V5 aumentou a produtividade de colmos e de açúcar (entre 10 e 20% dependendo a dose utilizada do inoculante) em comparação ao tratamento controle.

Isso ocorreu quando o biofertilizante foi aplicado tanto no sulco de plantio quanto no tratamento da soqueira (via drench) ou via foliar no estádio de perfilhamento. Os autores não constataram, contudo, aumento nos teores de nitrogênio foliar das plantas. 

Efeito de Azospirillum em cana-de-açúcar

Figura 9. Momentos de aplicação do Azospirilum na cultura da cana-de-açúcar e resultados de produtividade de colmos e de açúcar em função do ciclo de cultivo e do manejo (dose e momento de inoculação do biofertilizante contendo A. brasilense cepa Ab-V5). Fonte: Scudeletti et al., 2023. 

 

A inoculação de cana-de-açúcar com Azospirillum é uma estratégia promissora para aumentar a produção de bioetanol e açúcar e de subprodutos, bem como o retorno econômico, beneficiando toda a cadeia produtiva.

Contudo mais estudos são necessários para definir qual seria o melhor estádio fenológico para a inoculação e para quantificar os benefícios reais da adoção de tal prática de manejo. 

 

Como usar a bactéria Azospirillim em campo? 

Essa tecnologia chega ao produtor através de inoculantes desenvolvido pela indústria por meio de rigorosos controles de qualidade.  

No caso do milho, o produto comercial é utilizado na forma turfosa ou na forma líquida. Embora haja estudos com aplicação foliar em estágios que vão do V2 ao V6, o mais comum e o que traz os melhores resultados é a aplicação via inoculação das sementes (Figura 10). Para utilização a campo é importante se atentar as recomendações da bula do bioproduto.

efeito da inoculação com azospirillum em diferentes estádios e tipo de aplicação em milho

Figura 10. Efeito da inoculação com A. brasilense na produtividade de grãos de milho segundo o método de inoculação e cepa de A. brasilense. Valores são meios ±95% do intervalo de confiança (IC). Número de comparações para cada milho atributo está entre parênteses. O efeito é significativo quando o IC não se sobrepõe o zero. Fonte: Traduzido de Barbosa et al., 2022. 

Para a cana-de-açúcar os estudos de aplicação a campo ainda são muito recentes e mais estudos são necessários para definir qual é o melhor estádio fenológico da cultura para a aplicação. 

 

Cuidados para aquisição e uso de inoculantes contendo Azospirillum 

Alguns cuidados precisam ser tomados na utilização de Azospirillum a campo, uma vez que estamos trabalhando com organismos vivos: 

  • É importante que o produto apresente o número de registro no MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento); 
  • Atente-se ao prazo de validade do produto; 
  • Conserve o inoculante em local protegido do sol e arejado até a utilização – as temperaturas NÃO devem ser superiores à 30ºC; 
  • Durante a semeadura, se o depósito de sementes na máquina ficar 30 muito aquecido (temperatura > 35°C), deve-se interromper a atividade e resfriar a caixa, pois o calor pode matar as bactérias; 
  • No caso de uso de inoculante turfoso utilizar solução açucarada a 10% para permitir aderência do produto nas sementes; 
  • Não inocular diretamente na caixa de semeadura; 
  • A semeadura deve ser imediatamente ou no máximo 24 horas após a inoculação; 
  • Lembrar que o inoculante contém bactérias vivas, sensíveis ao calor, deficiência hídrica (cuidado com solo seco) e agrotóxicos. Nessas condições, aumentar a dose do inoculante, permitindo maior número de células de Azospirillum por semente e semear o mais breve possível. 
  • Não ultrapassar 1 dose na semente e 2 doses no sulco. 

 

Conclusão
 O uso de microrganismos promotores do crescimento de plantas – capazes de substituir, parcialmente os fertilizantes químicos no caso de gramíneas – representa uma estratégia chave para o Brasil, que importa a maior parte dos fertilizantes usados na agricultura. 

Para a cultura do milho o uso da bactéria Azospirillum brasilense (estirpes Ab-V5 e Ab-V6) já está consolidado e resultados da Embrapa indicam que o produtor pode reduzir 25% da dose de fertilizantes nitrogenados em cobertura após a inoculação das sementes sem perdas na produtividade. 

Para a cana-de-açúcar os estudos ainda são recentes e a inoculação com bactérias do gênero Azospirillum indicam haver benefícios para o crescimento das raízes e produção de colmos e açúcar, porém mais estudos são necessários para definição do momento ideal de aplicação desse bioproduto na cultura.
 

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Referências: 

Barbosa, J.Z.; Roberto, L.A.; Hungria, M.; Corrêa, R.S.; Magri, E.; Correia, T.D. Meta-analysis of maize responses to Azospirillum. brasilense inoculation in Brazil: Benefits and lessons to improve inoculation efficiency. Applied Soil Ecology, v. 170, 104276, 2022. DOI: 10.1016/j.apsoil.2021.104276 

Hungria, M.; Barbosa, J.Z.; Rondina, A.B.L.; Nogueira, M.A. Improving maize sustainability with partial replacement of N fertilizers by inoculation with Azospirillum. brasilense. Agronomy Journal, p. 1-12, 2022. DOI: 10.1002/agj2.21150 

Santos, M.S.; Nogueira, M.A.; Hungria, M. Outstanding impact of Azospirillum. brasilense strains Ab-V5 and Ab-V6 on the Brazilian agriculture: Lessons that farmers are receptive to adopt new microbial inoculants. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v. 45, e0200128, 2021. DOI: 10.36783/18069657rbcs20200128 

Pii, W.; Aldrighetti, A.; Valentinuzzi, F.; Mimmo, T.; Cesco, S. Azospirillum. brasilense inoculation counteracts the induction of nitrate uptake in maize plants. Journal of Experimental Botany, v. 70, p. 1313–1324, 2019. doi:10.1093/jxb/ery433. 

Rodrigues, A.C.; Bonifácio, A.; Araújo, F.F.; Lira Junior, M.A.; Figueiredo, M.V.B. Azospirillum sp. as a Challenge for Agriculture. In: Maheshwari, D.K (ed). Bacterial Metabolites in Sustainable Agroecosystem, Springer. 2015. DOI 10.1007/978-3-319-24654-3. 

Scudeletti, D.; Crusciol, C.A.C.; Momesso, L.; Bossolani, J.W.; Moretti, L.G.; Oliveira, E.F.; Tubana, B.S.; Silva, M.A.; Castro, S.G.Q.; Hungria, M. Inoculation with Azospirillum. brasilense as a strategy to enhance sugarcane biomass production and bioenergy potential. European Journal of Agronomy, v. 144, 126749, 2023. DOI: 10.1016/j.eja.2023.126749 

 

Sobre a autora:

Beatriz Nastaro Boschiero

Beatriz Nastaro Boschiero

Especialista em MKT de Conteúdo na Agroadvance

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