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Nitrogênio no solo: por que o teor de N não aparece na análise de solo? 

Você já reparou que o teor de nitrogênio no solo não aparece na análise de solo? Entenda o por que e como é feita a recomendação da adubação nitrogenada neste artigo.

Embora a realização da análise de solo seja o primeiro passo para definirmos a necessidade de fertilizantes e corretivos para as culturas, o nitrogênio no solo não é analisado.

A recomendação de adubação nitrogenada é realizada somente em função da produtividade esperada e do teor de matéria orgânica do solo ou ainda considerando a extração do nutriente pela cultura.  

Mas em ambos os casos, não se considera na análise de solo a disponibilidade de nitrogênio no solo capazes de suprir as plantas.  

Mas você já se perguntou o porquê disso? Entenda nesse artigo!  

Entenda também o porquê seria importante desenvolvermos um teste de N pensando em maximizar a utilização do N pela planta e evitar as perdas deste nutriente no sistema solo-planta-atmosfera.

 

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Nitrogênio no sistema solo-planta-atmosfera 

A maior dificuldade em se utilizar a análise de solo como diagnóstico da disponibilidade de nitrogênio às plantas está na dinâmica e complexidade das espécies deste elemento no sistema solo-planta-atmosfera. 

O maior reservatório de N do planeta é a atmosfera que contém 78% de seu volume preenchido com o gás N2. Contudo, essa forma não pode ser utilizada diretamente pelas plantas. 

A utilização do N em sistemas biológicos requer a quebra da tripla ligação covalente entre os dois átomos de N para produzir o gás amônia (NH3), que posteriormente é transformado nas demais formas N passíveis de absorção pelas plantas e microrganismos – nitrato (NO3) e amônio (NH4+).  

A conversão do N2 em moléculas minerais é conhecida como fixação de N e pode ser realizada por processo industrial (sob elevada temperatura e pressão) ou processo natural (fixação biológica de N, descargas elétricas ou reações fotoquímicas). 

As principais formas de N absorvidas pelas plantas são as inorgânicas (nitrato e amônio), que representam uma pequena fração do N total do solo (~5%), cuja maior reserva é a matéria orgânica (~95%). 

A matéria orgânica contém N na forma orgânica de proteínas, aminoácidos livres, açúcares aminados e outros compostos nitrogenados não identificados. 

Pela ação da comunidade microbiana do solo, o N orgânico pode ser transformado em formas minerais como nitrato e amônio (mineralização).  

Porém os próprios microrganismos do solo podem competir com as plantas e absorver o N mineral do solo, num processo conhecido como imobilização.  

O balanço entre os processos de mineralização e imobilização-dois processos opostos e simultâneos, que ocorrem durante a decomposição da matéria orgânica do solo, é que irá governar a disponibilidade de N às plantas (Figura 1). 

Fontes, destinos e forma de nitrogênio no solo

Figura 1. Fontes, destinos e forma de nitrogênio no solo. Fonte: Liu et al. (2023) 

Logo, uma série de fatores complexos e dinâmicos irá influenciar a disponibilidade das mais diversas formas de nitrogênio no solo, tais como: teor de matéria orgânica do solo, precipitação e umidade, adição de material orgânico ao solo, relação C/N, entre outros. 

Uma parte importante do ciclo do N envolvem as perdas para o sistema: lixiviação de nitrato, desnitrificação e emissão de óxidos nitrosos, volatilização de amônia, além de perdas por erosão. 

Uma amostragem de solo para estimar o teor de N na análise de solo será, portanto, influenciado por uma série de fatores e representará uma fotografia momentânea do teor de N que mudará completamente ao longo do ciclo das culturas.

Qual o maior problema de não se estimar a quantidade de nitrogênio no solo disponível às plantas? 

A literatura indica que o uso anual de fertilizantes à base de nitrogênio é de aproximadamente 190 milhões de toneladas (ZHANG, 2018). Ou seja, grandes quantidades de fertilizantes nitrogenados são utilizadas visando aumentos altos rendimentos das culturas. 

No entanto, a eficiência média do consumo de N de culturas está entre 40 e 50 % do N aplicado (GIORDANO et al. 2021). Isso significa que 50 a 60% do N da adubação fica passível de perdas no sistema solo-planta-atmosfera.  

O maior problema de contaminação ambiental por N inclui a poluição das águas, do ar, extinção de espécies e acúmulo de nitrato nos solos e produtos agrícolas que podem inclusive causar problemas na saúde humana (LIU et al., 2023). 

Assim, uma análise de solo para estimar os teores de N disponível antes de realizarmos a recomendação de adubação para as mais diversas culturas é vital para aumentar a eficiência de uso de N pelas culturas e para promovermos a sustentabilidade dos sistemas produtivos. 

Por que os teores de nitrogênio não aparecem na análise de solo? 

Os teores de nitrogênio no solo não aparecem na análise de solo porque ainda não se encontrou um método adequado para predizer a disponibilidade de nitrogênio às plantas em função dos teores de nitrogênio no solo. 

Isso é explicado justamente pelo dinâmico ciclo do nitrogênio no sistema solo-planta-atmosfera. 

O teor de nitrogênio no solo na forma mineral (nitrato e amônio) não são utilizados, pois são altamente sazonais e dependem do teor de umidade do solo. Além disso, tanto as plantas como os microrganismos utilizam essas fontes de N e apenas quantificá-las não é um indício de que estariam disponíveis às plantas.   

Por outro lado, estimar os teores de N total ou alguma forma de N orgânico também não condizem com a quantidade que será fornecida às plantas, devido à grandes quantidades de fatores que influenciam nessa disponibilidade, como condições climáticas, condições físicas e biológicas do solo. 

Muitos métodos laboratoriais foram testados ao longo dos anos para tentar predizer a quantidade de N mineralizável durante o ciclo de cultivo das plantas. Contudo, nenhum deles se mostrou robusto o suficiente para uma ampla aceitação. 

Ainda hoje estudos são conduzidos nesse sentido, visto que uma análise de solo para estimar a disponibilidade de N é essencial quando pensamos em maximizar a eficiência de uso do nutriente pela planta e reduzir os impactos ambientais decorrentes do grande uso de fertilizantes químicos. 

Para Liu et al. (2022) com o avanço da química, ciência dos materiais e tecnologia da informação, há um número crescente de técnicas inovadoras que podem ser utilizadas para determinar a concentração de N do solo. 

O uso de tecnologia de detecção e tecnologias emergentes, como a Internet das Coisas e Big Data, podem permitir o monitoramento e controle em tempo real dos sistemas agrícolas, permitindo que os agricultores tomem decisões informadas e minimizem o desperdício de recursos (LIU et al., 2022). 

Métodos já testados para avaliar a disponibilidade de nitrogênio do solo às plantas 

A grande maioria dos métodos desenvolvidos para a predição da disponibilidade de nitrogênio mineralizável do solo pode ser agrupada em duas categorias: biológicos e químicos. 

Métodos biológicos

Os métodos biológicos se baseiam no fato de que as transformações de nitrogênio no solo sob condições de campo envolvem processos influenciados pelos microrganismos.  

Alguns exemplos de métodos biológicos para estimar a disponibilidade de nitrogênio no solo às plantas são: incubação aeróbia que pode ser de longa ou curta duração e a mineralização bruta. 

Os métodos biológicos variam de acordo com: 

  • O pré-tratamento do solo (molhado ou seco, peneirado ou intacto),  
  • Procedimentos de incubação (variando temperatura e umidade, aeróbio ou anaeróbio),  
  • Períodos de incubação (1-40 semanas),  
  • Extratores (KCl 1 ou 2 mol L-1 ou CaCl2 0,01 mol L-1), e  
  • Métodos de determinação (colorimétrico ou destilação a vapor).  

Durante a incubação aeróbia são medidos os teores de N-NH4+ e N-NO3, mas somente o N-NH4+ é produzido sob condições anaeróbias. 

Apesar de refletir melhor o processo natural de liberação de nitrogênio mineral para o solo, seus resultados, sozinhos, não refletem a disponibilidade de nitrogênio no campo.  

Além disso, os métodos biológicos de mineralização do N em laboratório são caros e dispendiosos em termos de tempo.  

Sua utilidade atual parece estar mais relacionada à avaliação da qualidade do solo, em que o compartimento mineralizável de N pode ser um bom indicador. 

Métodos químicos

Os métodos químicos, por sua vez, envolvem o uso de algum reagente com o objetivo de extrair frações de N do solo, quimicamente conhecidas ou não, que representem ou se correlacionem com o N inorgânico liberado em determinado intervalo e tempo. 

Eles utilizam extratores ácidos, básicos e agentes oxidantes fores para extrair uma fração do N do solo que pode se relacionar estatisticamente com o N mineralizável determinado por incubações de solo ou parâmetros de resposta das culturas ao N (Mariano et al., 2017).  

São exemplos de métodos químicos já testados para a predição da mineralização do N: Extração com KCL a quente, NaHCO3 com leitura de absorbância ultravioleta, Illinois Soil Nitrogen Test (ISNT), teor de nitrato do solo, entre outros (Mariano et al., 2017). 

Como vantagem os métodos químicos ser mais rápidos e precisos que os métodos biológicos e produzir um índice da contribuição da mineralização do N do solo para fornecimento de N ao solo. 

Entretanto, ele não considera os efeitos ambientais que afetam esse processo e nem as perdas de N mineral (lixiviação e desnitrificação) durante o período de crescimento das plantas. 

O teor de nitrato no solo, por exemplo, é um dos principais indicadores da suficiência ou deficiência de nitrogênio nas culturas de sequeiro.  

A principal dificuldade em se utilizar esse indicador é sua grande variação sazonal, principalmente em virtude da umidade do solo. 

Sensores utilizados para leitura rápida e temporal pode ser uma solução para esse problema. Diversas empresas vêm desenvolvendo vários tipos de sensores para quantificar o teor de nitrato no solo (Figura 2). 

Dispositivos de sensor para detecção do teor de nitrato no solo  análise de solo Disponibilidade de nitrogênio no solo

Figura 2. Dispositivos de sensor para detecção do teor de nitrato no solo comercializados para determinação in-situ. Fonte: Liu et al. (2022). 

Como os métodos de disponibilidade de nitrogênio são validados? 

Para saber se determinado método é útil ou não para avaliar a disponibilidade de nitrogênio às plantas, normalmente são feitas correlações entre a fração de N quantificada pelo método avaliado e a quantidade de N absorvido pela cultura, ou a produtividade da cultura (Figura 1). 

Correlação do N absorvido e de métodos de predição da necessidade de nitrogênio

Figura 3. Método que tentar predizer a disponibilidade de nitrogênio no solo. Relação linear entre o N total absorvido pelo milho e o teor de matéria orgânica do solo (A), N total do solo (B), N potencialmente disponível estimado por incubação aeróbica a 18/23ºC (C) e pelo Illinois Soil Nitrogênio Test (D). Fonte: Braos et al (2022).  

Um dos grandes problemas é que esses estudos normalmente são realizados em condições controladas (casa-de-vegetação ou laboratório) e em campo muitas vezes não se repetem. 

Apesar de todos os estudos já realizados na área, ainda não se encontrou um método plástico o suficiente para estimar à disponibilidade de N nas mais diversas condições de campo. 

Os maiores desafios para implementação de um teste de nitrogênio no solo são a variabilidade do solo, a calibração de instrumentos de medição e a necessidade de amostragens repetida ao longo do tempo (LIU et al., 2023).  

Fatores que afetam a disponibilidade de nitrogênio do solo 

Ao contrário dos demais nutrientes, o nitrogênio no solo está em constantes transformações.  

Justamente por sua dinâmica é difícil avaliar precisamente a sua disponibilidade ao longo de um determinado período, principalmente porque vários fatores podem afetar as reações que esse elemento sofre no solo.  

O fornecimento N pela MO é sensível aos fatores que controlam o potencial de mineralização do N (como as propriedades do solo e manejo agrícola) e às condições ambientais (como, umidade e temperatura), que regulam a atividade biológica controlando o processo de mineralização.  

Por isso, as propriedades biológicas, químicas e físicas do solo, bem como práticas agrícolas afetam a concentração e a disponibilização de nitrogênio no solo.  

 E justamente por isso que é difícil encontrar um método que realize a predição da disponibilidade de nitrogênio para as culturas ao longo de um ciclo agrícola. 

Conclusões  

Não existe, até hoje, um método da análise do solo adequado para predizer à disponibilidade de nitrogênio no solo para as plantas. Isso se deve ao complexo e dinâmico ciclo do N. 

Para o avanço da agricultura de precisão e a preservação do ambiente ecológico natural, é essencial uma análise de solo que permita uma determinação precisa, rápida e de baixo custo dos teores de nitrogênio do solo e suas variações. 

A oferta de nitrogênio no solo parece ser específica do sistema, diferindo de acordo com a rotação de cultura, sistema de plantio direto, alteração orgânica, propriedade do solo, e mais importante, as condições ambientais. 

Um método ideal de análise para a predição da disponibilidade de nitrogênio no solo seria capaz de prever a absorção de N pela cultura durante a estação de crescimento, ser barato e rápido e responder à dinâmica do N em função das propriedades do solo, práticas agrícolas e das condições ambientais. 

 Perspectivas futuras de tecnologias emergentes, como sensores ópticos e bioquímicos, que podem fornecer medições mais precisas e em tempo real podem ser um caminho para encontrarmos um teste confiável de predição de N nos sistemas agrícolas (LIU et al., 2023). 

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Referências  

BRAOS, L.B.; CARLOS, R.S.; KUHNEN, F.; FERREIRA, M.E.; MULVANEY, R.L.; KHAN, S.A.; CRUZ, M.C.P. Predicting Soil Nitrogen Availability for maize production in Brazil. Nitrogen. V. 3. P. 555-568, 2022. DOI: 10.3390/nitrogen3040036 

GIORDANO, M.; PETROPOULOS, S.A.; ROUPHAEL, Y. The Fate of Nitrogen from Soil to Plants: Influence of Agricultural Practices in Modern Agriculture. Agriculture 2021, 11, 944. DOI: 10.3390/agriculture11100944 

LIU, J.; CAI, H.; CHEN, S.; PI, J.; ZHAO, L. A review on soil nitrogen sensinf tecnhologies: challenges, progress and perspectives. Agriculture. V. 13, 743, 2023. DOI: 10.3390/agriculture13040743 

MARIANO, E. Predição da necessidade de fertilizante nitrogenado pela cana-de-açúcar e reações do nitrogênio orgânico e mineral dissolvidos em palha e solo de canaviais. Tese (doutorado). Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, USP. 146 p. 2015. Disponível em: https://teses.usp.br/teses/disponiveis/11/11140/tde-20012011-034436/publico/Eduardo_Mariano.pdf. Acesso: 24/05/2023. 

MARIANO, E.; OTTO, R.; MONTEZANO, Z. F.; CANTARELLA, H.; TRIVELIN, P.C.O. Soil nitrogen availability indices as predictors of sugarcane nitrogen requirements. European Journal of Agronomy, v. 89, p. 25-37, 2017. DOI: 10.1016/j.eja.2017.06.004

OTTO, R.; MARIANO, E.; MULVANEY, R.L.; KHAN, S.A.; BOSCHIERO, B.N.; TENELLI, S.; TRIVELIN, P.C.O. Effect of previous soil management on sugarcane response to nitrogen fertilization. Scientia Agrícola. v. 76, p. 72-81, 2019. DOI: 10.1590/1678-992X-2017-0147 

Zhang, W. Global Pesticide Use: Profile, Trend, Cost/Benefit and More. Proc. Int. Acad. Ecol. Environ. Sci. 2018, 8, 1. 

Sobre a autora:

Beatriz Nastaro Boschiero

Beatriz Nastaro Boschiero

Especialista em MKT de Conteúdo na Agroadvance

  

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